Capítulo 70

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No entanto, saber que Belle o havia citado como a pessoa em quem confiava significava que ele devia ir ajudá-la. O que ele tinha a perder? Tudo que amava tinha ido embora.
Etienne virou-se para entrar no chalé. Se ele partisse imediatamente, poderia chegar a Paris naquela noite.

Belle chorou quando o salto do seu sapato fez barulho ao cair no chão. Ela havia passado horas martelando na tábua da janela, tentando desesperadamente fazer um buraco nela. O salto do primeiro sapato quebrou e, assim, ela recomeçou após dormir um pouco, mas, com o segundo salto quebrado, não podia continuar. Não que ela tivesse feito qualquer avanço, tudo o que tinha a mostrar como resultado do seu esforço era uma pequena marca na madeira. Mas, pelo menos, enquanto martelava, havia um brilho de esperança. Ele agora tinha desaparecido.

A fome a estava deixando fraca e tonta. Não tinha certeza se fazia dois ou três dias que estava lá. Esse era o plano de Pascal? Deixá-la tão fraca que não poderia lutar contra ele quando voltasse? Ou pretendia abandoná-la ali para morrer?  De tempos em tempos, ela sentia o cheiro de comida sendo preparada, ele invadia o quarto para tentá-la. Se havia um restaurante por perto, por que ninguém a ouvia gritar e bater?

Era o que ela fazia constantemente quando já não entrava luz pelo pequeno buraco, imaginando que seria mais provável alguém escutá-la quando as ruas ficavam mais silenciosas. Porém, ela não conseguia distinguir entre o começo e o final da noite ou por quanto tempo dormia de cada vez. Por duas vezes, ouvira o som de um acordeão. Era um som comum em Paris, que ela tinha achado encantador quando estava livre.

Se aquele som chegava aos seus ouvidos, por que (mas, por quê?) ninguém a escutava? Belle arrastou-se de volta para a cama, sentindo sob os pés os grampos tortos e quebrados que ela tentara, sem sucesso, transformar em ferramentas para mexer na fechadura da porta. Ela não tinha mais nada para usar; tinha retirado os suportes de barba de baleia do corpete do vestido e tirado os suspensórios, e quebrado cada um deles. Estava derrotada.

E havia menos de cinco centímetros de água no jarro para beber. Ela bem que podia simplesmente deitar e esperar pela morte. Não havia esperança.

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Gabrielle estava sentada à sua escrivaninha no hall quando um homem entrou. Ela reparou primeiramente no terno em cinza pálido, pois tinha um excelente corte e era raro os seus hóspedes se vestirem com roupas tão caras ou terem a presença aquele estranho tinha. Depois, quando ele falou, a combinação de sua voz grave com os frios olhos azuis a deixaram pasma por um instante.

- Sou Etienne Carrera - ele disse. - Acredito que você estava esperando por mim. Ela só conseguiu ofegar tolamente.

- E desejava que viesse, mas não ousei esperar por isso - Gabrielle articulou, sentindo-se como uma garotinha boba de 16 anos. Depois de um momento de hesitação, ela levantou e estendeu a mão para cumprimentá-lo.

- Sou Gabrielle Herrison. Estou muito feliz em vê-lo. Posso oferecer um café ou algo para comer? Você fez uma viagem longa.

- Um café seria bom enquanto conversamos - ele aceitou. Ela tocou um sino e uma mulher mais velha usando um avental branco saiu da sala de jantar.

- Ah, Jeanne! Pode trazer um pouco de café para nós na minha sala de estar?

Gabrielle seguiu para um mezanino e guiou Etienne até uma pequena sala com vista para o quintal dos fundos. O lugar claro com o sol do final da tarde e tinha móveis simples: um sofá, algumas poltronas e uma mesa com cadeiras perto da janela. Ela tirou alguns livros de escola de Henri de uma das poltronas.

- São do meu filho - explicou. - Ele deveria estar aqui fazendo a lição, mas escapou. Sente-se.

- Mal posso acreditar que tenha chegado tão rápido - ela continuou, após sentar-se em frente a ele. - Deve ter saído de Marseille assim que o irmão de Marcel falou com você. Ele concordou balançando a cabeça.

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