Capìtulo 38

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- Fique aí e observe o que Betty faz - disse Martha com firmeza.

Ela apontou para a cadeira baixa que estava atrás da tela e para o furo no tecido tela, pelo qual Belle poderia espiar enquanto estivesse sentada.

- Procure observar tudo! Veja como ela verifica se ele tem sífilis, como ela o lava e tudo. Você deve ficar parada aí, aprendendo!

Belle já havia sido avisada de que era dessa maneira que Martha preparava as
novatas, por isso não ficou muito chocada. E Betty tinha sido surpreendentemente aberta ao falar sobre como via o próprio trabalho.
Belle gostava da garota atrevida de Atlanta. Era engraçada, simpática e sempre disposta a bater papo.

- Todas fingimos estarmos nos divertindo muito - disse Betty com um sorriso travesso. - Afinal, é o que o trabalho exige. Mas penso em coisas quentes enquanto estou trabalhando e guio os pensamentos para me darem prazer e, sabe, querida? Às vezes é bom de verdade.

Apesar de a atitude de Betty, de comentar sobre tais coisas, ser incomum, Belle sentia que, na verdade, nenhuma das garotas detestava seu trabalho ou se sentia insatisfeita com sua vida. Todas riam muito e demonstravam bastante interesse
por tudo e todos ao redor. Todas elas vinham de famílias pobres, mas apesar de citarem a pobreza, esta não parecia ser a única razão pela qual elas se tornaram prostitutas. Belle achava que se tratava da combinação da ânsia por aventura, o prazer de ser desejada, e também ganância e até preguiça, porque elas sabiam que era difícil manter um trabalho respeitável.

Belle sentia-se grata por Martha ter dado a ela quase duas semanas de
preparação antes de jogá-la aos leões, pois durante esse tempo, a atmosfera
lânguida e sensual da Casa a envolvera. O tempo todo, ela sonhava acordada
lembrando-se de como se sentira quando Etienne a havia abraçado e beijado, admirava os homens dali e queria que eles a desejassem também. Queria usar um belo vestido comprido de seda como as outras meninas, pedir a ajuda de Cissie para fazer um penteado e também queria ganhar mais dinheiro.

Talvez a atmosfera da casa tivesse atenuado os traumas do passado, e de fato ela esperava com muita ansiedade pelo dia em que se tornaria o que Martha chamava de "cortesã". Mas foram os passeios por New Orleans que fizeram com que ela visse que tinha opções. Não precisava se imaginar presa para sempre em um lugar e em um emprego que detestava.

A princípio, ela só via a cor, a música e a decadência de New Orleans: uma festa
enorme que durava o dia todo, sete dias por semana. Quando observou com mais atenção, percebeu que tudo girava ao redor de fazer dinheiro. Desde os homens ricos que eram donos dos salões chiques de jogos, onde milhares de dólares iam de mão em mão todas as noites, com madames gerenciando prostíbulos, até os taxistas, que cobravam apenas poucos centavos por corrida, e os músicos em todos os bares ou de rua. O dinheiro era o centro ao redor do qual o Distrito todo girava.
Mas diferentemente de Londres e Nova york, onde eram os homens, principalmente, que cuidavam dos shows, em New Orleans as mulheres podiam ter papéis de protagonistas. Elas vinham de todas as partes dos Estados Unidos e de outros lugares. Muitas eram madames, claro, mas tantas outras tinham lojas ou outros negócios: eram donas de hotéis, bares e restaurantes. Belle ouviu alguém dizer que uma grande parte delas havia chegado na cidade sem nenhum
tostão e usavam a prostituição como uma maneira de começar; mas isso a
impressionava ainda mais porque provava que, com vontade e determinação, qualquer pessoa poderia se dar bem.

Belle sentia que também poderia fazer isso. Tinha a vantagem de ser inglesa,
para começo de conversa, o que era curioso ali. Sem ser presunçosa, ela também conseguia ver que era mais bela do que a maioria das garotas, e ainda tinha a juventude a seu favor. Mas acima de tudo, era inteligente. Não tinha noção dessa realidade em sua cidade porque não havia com quem se comparar. Ali, todos os dias ela constatava que era muito mais avançada intelectualmente do que as
outras garotas. Como dissera Etienne, a maioria era burra, preguiçosa e
gananciosa.

BelleOnde histórias criam vida. Descubra agora