Capítulo 10

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A polícia entrava e saía da Casa até depois das quatro horas da tarde, e Mog, muito brava, reclamou da neve que continuavam trazendo com eles.

- Sobe e desce as escadas, para dentro e para fora do salão, sem nenhuma noção do que estão fazendo com nossos tapetes. Por que eles não podem entrar e ficar do lado de dentro? Homens! Artigos inúteis! Não daria a eles sequer um espaço na Casa.

Belle notou que Mog não estava tão preocupada com a bagunça quanto com todos por quem ela se sentia responsável. Belle percebia que ela mesma se sobressaltava com ruídos repentinos, sentindo-se chorosa e assustada. Ela avaliava sem parar o que havia testemunhado, e ainda não fazia o menor sentido que o homem tivesse assassinado Millie apenas porque ela não queria morar com ele. Ela realmente precisava falar sobre isso, se livrar das horríveis imagens em sua cabeça, e a única pessoa que deveria estar ali para ouvi-la confortar e explicar as coisas era sua mãe.

A raiva crescia em Belle a cada minuto. Ela se sentia decepcionada e amarga com o fato de que Annie parecia se importar mais com "suas garotas" do que com sua própria filha, e que era esperado que Belle agisse como se nada tivesse acontecido e voltasse às suas tarefas habituais.

- Mamãe não teria muitos negócios sem homens - ela falou, na esperança de que isso provocasse Mog a continuar o que tinha começado na noite passada.

Mog não entrou na provocação e continuou mexendo o ensopado de frango que estava fazendo para a ceia, mas seu rosto pálido e cansado demonstrava que ela estava tão preocupada quanto Belle.

- Boa garota - Mog disse a elogiando quando olhou em volta e viu que Belle estava dobrando a manta de passar roupa após ter terminado a alta pilha de roupas. - Vamos nos sentar e tomar uma xícara de chá. Acho que merecemos.

Durante sua curta vida, Belle observara que o jeito de Mog lidar com qualquer problema era fazer um bule de chá. Se as garotas do andar de cima brigassem, se chovesse no dia de lavar roupa, a chaleira trabalhava. Ela nunca falava do problema até que tivesse seguido calmamente seu ritual de colocar para fora as xícaras e os pires, a jarra de leite e o açucareiro, e enchido o bule de chá. E era apenas quando as pessoas envolvidas estivessem sentadas à mesa e ela estivesse servindo o chá que se sentia pronta para expor suas opiniões.

Mas Mog não estava calma desta vez. Enquanto pegava as xícaras de chá do
armário, elas balançavam porque suas mãos estavam tremendo, ainda que seu andar pela cozinha fosse contraditoriamente tranquilo. Quando abriu a gaveta sob a mesa para tirar as colheres de chá, ela derrubou uma no chão. Belle achava
que Mog lutava para controlar as emoções, e que estava tão confusa, com medo e perplexa quanto a própria Belle.

Mog estava justamente pondo a bonita capa vermelha de tricô no bule de chá cheio quando ouviram Annie entrar pela porta no alto das escadas do porão. As duas pularam como se tivessem sido pegas em flagrante fazendo alguma coisa errada.

- Está tudo bem, não vou morder - Annie disse. Ela parecia extremamente cansada. - Uma xícara de chá é exatamente do que eu preciso, estou exausta.

Belle rapidamente pegou outra xícara e pires do guarda-louça.

- Vamos abrir esta noite? - Mog perguntou com cuidado.

Annie se sentou, parecendo pensativa, por um ou dois segundos.

- Não, acho que vamos ficar fechados. Por respeito. Millie era uma boa garota e todos nós sentiremos a falta dela.

- E os parentes dela? - Mog perguntou. - Eu sabia que ela tinha família. Quem
contará para eles?

Belle percebeu o tom incisivo na voz de Mog e sentia que ela tinha coisas que gostaria de dizer para Annie, então pegou o chá servido para ela e foi se sentar na poltrona perto do fogão para deixar as duas mulheres conversarem.Eu não disse uma palavra para Mog - Belle falou, com medo de que sua mãe a culpasse por inventar histórias. - Mog adivinhou.

- Está certo, eu deduzi. Logo que vi Belle eu soube; ela não consegue mentir de forma tão convincente como você.

- Cuidado com o que está dizendo - Annie avisou.

- O que você vai fazer? Me mandar embora? Eu poderia ir à polícia e contar o que eu sei, e você seria processada. Apenas me diga por que está protegendo esse homem. É aquele que as garotas chamam de Bruiser?

- Não quero falar sobre isso na frente de Belle - Annie silvou.

- Ela já descobriu da pior maneira possível o que acontece nesta Casa - Mog disse corajosamente, com um punho fechado na direção de Annie. - Eu implorei a você para mandá-la para uma escola, longe, disse a você vezes e mais vezes que era só uma questão de tempo antes de ela descobrir tudo. Mas você sabia o que era melhor! Você pensava que se a mantivesse aqui embaixo ela nunca perceberia nada. Deus sabe que nunca passou por minha cabeça que ela descobriria isso de uma maneira tão terrível, mas qualquer um com um pouco de cérebro poderia ver que uma garota esperta como Belle descobriria tudo por si mesma a qualquer momento.

- Você está passando dos limites, Mog - Annie avisou, mas a dureza habitual em sua voz tinha desaparecido.

- Eu me atrevo a passar dos limites porque amo você e Belle - Mog aumentou seu tom de voz. - Caso tenha se esquecido, fui eu que falei com a Condessa para não te expulsar quando estava grávida. Eu apoiei Belle neste mundo, dava banho e
alimentava, a amava como se fosse minha filha para deixar você livre para bajular a Condessa. Estive com vocês duas em cada passo do caminho, trabalhei para você, menti por você, chorei por você e te dei suporte quando as coisas ficaram difíceis. Pode ser a dona desta Casa, Annie Cooper, mas eu sou a cola que
mantém sua vida estruturada.

Belle nunca tinha ouvido a quieta e gentil Mog lutar por alguém antes. Isso a fez se sentir mais corajosa também. Belle foi até onde ela estava de pé bem em frente a sua mãe.

BelleOnde histórias criam vida. Descubra agora