Capìtulo 50

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Noah tinha ido visitar Annie duas vezes e ficou muito surpreso ao ver a recepção fria dela. A casa onde ela estava recebendo pessoas era bonita, e tinha o tipo de hóspedes que ficariam horrorizados se descobrissem que a locatária já tinha administrado um
bordel, mas ela não podia achar que Mog ou ele diriam qualquer coisa que a colocasse em uma situação difícil.

- Ela sempre foi fria - disse Garth. - Dizem que ela chantageou a Condessa para que esta deixasse sua casa a ela.

- Isso é fofoca maldosa e mentirosa - disse Mog. - A Condessa gostava dela e Annie cuidou dela até o fim como se fosse sua mãe.

- Então por que ela não demonstra mais carinho com a própria filha? - perguntou
Garth. - Parece que você é a mãe de Belle, Mog. O que aconteceu?

Noah interrompeu os dois erguendo a mão.

- Eu sei que Annie foi forçada a fazer aquele trabalho. Não deve ser fácil amar
um filho que nasce desse jeito.

Mog estava mordendo o lábio, como se tivesse algo a dizer, mas não se atrevesse.

- Diga, Mog - disse Noah. - Estou vendo que você sabe de alguma coisa.

- Foi culpa minha - sussurrou ela. - Assim que Belle nasceu, eu a segurei nos braços e fiz tudo por ela. Nunca deixei Annie ajudar. Ela era a melhor garota da Condessa, e eu disse que ela deveria voltar o mais rápido possível para evitar que outra tomasse seu lugar.
- Mog começou a chorar, e enormes lágrimas rolaram por seu rosto. - Se eu não tivesse feito isso, acho que as coisas poderiam ter sido diferentes. Esse é meu castigo. Peguei a bebê de Annie há muitos anos, por isso agora, eu tenho que sofrer a dor por perdê-la - disse ela chorando.

Para a surpresa de Noah, Garth se levantou da cadeira e deu a volta na mesa para confortar Mog, e quando ele se curvou sobre ela, seu rosto normalmente sério estava repleto de ternura, e de repente Noah notou que Garth havia se Apaixonado por ela.

- Não é culpa de ninguém, Mog - disse Noah olhando para trás enquanto
caminhava em direção à porta dos fundos. - Você tem sido uma boa amiga e uma boa mãe substituta para Belle. Mas está na hora de fazer a sua vida e parece que você encontrou o homem certo para isso.

Noah sorriu ao chegar ao quintal dos fundos. Ele torcia para que Mog e Garth
percebessem que aquele era um novo começo para os dois.

- Não chore, Mog - disse Garth sem jeito. Ele não se sentia à vontade perto de mulheres chorosas. - Noah está certo, nada é sua culpa, você é uma boa mulher.

- O que ele quis dizer com a última coisa que falou antes de sair? - perguntou ela,
secando os olhos no avental e olhando para ele. Garth sentiu a mesma ansiedade que costumava tomar conta dele quando estava com Mog. Ele achava seu rosto muito meigo, adorava vê-la mordendo o lábio quando ficava nervosa, e a delicadeza de seus olhos acinzentados. Ele sabia que precisava falar naquele momento ou talvez nunca conseguisse.

- A respeito do homem certo? Bem, acho que ele sabe que eu gosto de você, Mog - disse ele.

Ela arregalou os olhos e levou a mão diante dos lábios.

- De mim?

- Sim, por você, quem mais? - perguntou ele, com a voz rouca porque fazia muito tempo que ele não tentava conquistar uma mulher, e ela não parecia muito conquistada. - Mas talvez você não sinta a mesma coisa. Se for o caso, é só dizer e não falarei mais nada.

- Oh, Garth - disse ela delicadamente, com o lábio inferior tremendo como se
fosse chorar de novo. - Sinto a mesma coisa, sim, mas pensei que não fosse
correspondida.

Percebendo que aquela conversa poderia ir e voltar sem qualquer resolução, Garth se abaixou, segurou as mãos dela e a abraçou, beijando-a.

Ela estava com o cheiro das maçãs que havia fatiado um pouco antes para fazer uma torta, e também cheirava a sabonete e água de lavanda. Ele a envolveu com força, levantando-a do chão enquanto a beijava, e ele sentiu o coração acelerar porque percebeu, pelo modo com que seus lábios se entreabriam, que ela sesentia da mesma maneira que ele.

- Acho que já está mais do que na hora de eu abrir o bar - murmurou Garth enquanto ainda abraçava Mog, um pouco mais tarde. Ele havia se sentado em uma cadeira da cozinha e a havia colocado no colo para beijá-la diversas vezes. Ele não sabia muito bem como se comportar a partir de então. Namorar era coisa de gente jovem, mas ele sentia que Mog poderia se assustar se ele tentasse algo depressa demais com ela. Além disso, eles tinham que pensar em Jimmy. Ele não podia simplesmente levar Mog para a sua cama sem deixar as coisas claras com o rapaz primeiro.

Mas ele tinha a impressão de que Jimmy pensaria que o casamento seria a única maneira certa de fazer as coisas, e talvez estivesse certo.

- Nunca pensei que isso fosse acontecer comigo - disse Mog, corando. - Mas
precisamos pensar nos sentimentos de Jimmy; não podemos permitir que ele
entre e nos flagre assim. Garth achou incrível o fato de ela estar pensando na mesma coisa que ele.

- Nunca pensei que seria meu sobrinho que me faria casar de novo - disse ele.

Mog ficou tensa em seu colo e começou a morder o lábio de novo, e Garth
percebeu que a frase não havia saído como ele pretendera.

- Quero dizer que não posso dar um mau exemplo a ele - disse, e percebendo que mais uma vez não tinha sido bem sucedido, corou. - O que quero dizer de verdade é que eu quero me casar com você, Mog. Quer ser minha esposa?

Ela riu naquele momento, uma emoção forte que fez seu riso parecer água caindo sobre pedras.

- É o que mais quero, Sr. Franklin - disse ela. - E precisamos andar depressa se não quisermos dar um mau exemplo a Jimmy.

Noah ainda sorria pensando em Mog e Garth ao subir a Tottenham Road em direção a sua casa. Em sua opinião, eles formavam um casal perfeito, e ele tinha certeza de que Jimmy poderia parar de pensar tanto em Belle se eles decidissem se casar.

Mas como costumava acontecer quando ele pensava em Belle, passou a pensar em todas as outras meninas desaparecidas e se lembrou do que um dos policiais na Bow Street havia dito a ele. "Sabemos que isso não para, que meninas são atraídas para a França ou para a Bélgica para se tornarem prostitutas. E meninas que são trazidas para cá para o mesmo propósito.

Encontramos duas meninas francesas em uma casa velha em Stepney, uma casa que invadimos há alguns meses. Elas se encontravam em um estado deplorável, magras como gravetos, sujas e viciadas em ópio. Quando elas tomaram banho e encontramos alguém para conversar com elas em francês,
descobrimos que elas acreditavam que estavam vindo para a Inglaterra para
serem governantas de senhoras ricas. Aparentemente, as duas tinham sido
entrevistadas na mesma casa em Paris, pela mesma mulher, que disse que elas
iriam à Inglaterra com ela por um ano.

As duas foram violentadas por 'cavalheiros' em uma casa grande, onde eram observadas de perto para que não
escapassem. Então, poucos meses depois, elas foram levadas a diversos outros lugares, um sempre pior do que o outro, até chegarem a Stepney e nós as
encontrarmos."

O policial dissera que todos os anos, cerca de 300 a 400 moças desapareciam, e desse número, apenas 150 voltavam a ser vistas. Ele disse que muitas provavelmente estavam com homens com quem tinham fugido, algumas podiam ter sido assassinadas e ele acreditava que o resto estava em bordéis de algum lugar. Ele também disse que a maioria já não poderia ser recuperada, mesmo que soubessem de seu paradeiro, porque as meninas já estariam viciadas em drogas ou doentes. Em pouco tempo, elas seriam novos corpos dentro de um necrotério.

- Talvez eu devesse ir para Paris de novo, para tentar subornar Cosette -murmurou Noah a si mesmo, sem conseguir imaginar meninas jovens em um necrotério.

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