Capítulo 1

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Jardins do Palácio de Kerma, Núbia

Ano 26 do Rei Zaki I – Reino de Cuxe

Ano 23 do Senhor das Duas Terras, Ramsés II

Estação Chemu, Primeiro Dia da Colheita




Mergulhou novamente na piscina. A água estava fria, apesar do calor, e Iana sentiu todo o seu corpo ser envolvido pelo frescor que ela lhe proporcionava. Nadou até a outra extremidade, onde havia uma escada. Seus cabelos crespos, completamente molhados, esticavam-se até o meio das costas enquanto ela galgava os degraus, e a água escorria por sua pele nua, brilhando ao sol da manhã.

De não tão longe, escondido atrás das palmeiras que circundavam e protegiam a área da piscina, Menik observava a princesa caminhar pelo jardim até a área de descanso, à sombra de sicômoros, onde uma serva a aguardava para enxugá-la e vesti-la. Sem dúvidas, era a mulher mais bela que tinha visto. Espiá-la, assim, em seu momento de descanso na área privativa dos reis, era extremamente perigoso. Caso fosse pego, seria morto, ele sabia. Mas simplesmente não conseguia desgrudar os olhos do corpo da bela moça, que até bem pouco tempo atrás era apenas uma criança. Iana Urbi desabrochara como uma flor de lótus, e em seus quinze anos de idade, era a mais bela mulher de toda a Núbia, não tinha dúvidas.

Continuar seria arriscar por demasia seu pescoço. Retirou-se rapidamente para seus afazeres no palácio, e não chegou a ver quando a serva da princesa ajudou-a a colocar uma fina túnica de linho, tecida pelas mais habilidosas escravas tecelãs de Tebas.

— Seu banho no quarto já está sendo preparado, Senhora —, disse a serva.

— Obrigada, Kenia — disse Iana, sentando-se num comprido banco de madeira trabalhada, coberto com almofadas macias e peles de leopardo. Em seu encosto, o formato de uma cabeça de leão, e as pernas do banco esculpidas como as patas do felino. — Sirva-me um pouco de vinho. Quero aproveitar um pouco mais o desjejum e esta manhã.

— Claro, minha senhora! — Kenia tomou uma jarra de ouro e derramou vinho de tâmaras na taça da princesa, uma taça de prata cravejada de rubis, e com entalhes de leopardos, leões e da deusa Bastet.

Iana, esticando as pernas no banco e recostando-se, tomou um gole do vinho, suspirou e observou o jardim que seu pai, o Rei Zaki, havia construído para ela por ocasião de seu décimo aniversário, inaugurado há exatos cinco anos. Uma piscina retangular, cujas águas estavam repletas de flores de lótus e alguns peixes; ao seu redor várias plantas com diversas espécies de lírios. No segundo nível, muitas palmeiras para proteger seu banho dos olhares de outrem; no terceiro nível, árvores frutíferas e, por fim, no quarto nível, um pequeno pátio com uma área de descanso, onde ela se encontrava com sua serva, e mais um retângulo cercando toda a área, com sicômoros e figueiras, árvores sombreiras. Protegendo toda esta área havia um outro retângulo, feito de tijolos de barro. A parede atrás de si era uma das paredes do palácio, e estava coberta com uma parreira e suas folhas; à sua esquerda, mais uma parede, com uma saída que dava diretamente nos aposentos da princesa. À sua frente, após a piscina e os arbustos e árvores que a protegiam, também havia uma parede com uma saída, que dava para os aposentos da rainha – embora ela raramente a usasse. E ao seu lado direito, arbustos e árvores frondosas protegiam o jardim dos olhares de curiosos; e, sem que Iana Urbi soubesse, havia sido exatamente por ali que Menik a havia visto, escondido entre as plantas, e depois se retirado.

Lembrou-se dos momentos em que aproveitara bastante aquele local, onde se divertira com irmãos, familiares e amigos, filhos de nobres cuxitas, sabendo que sentiria falta do que fora seu refúgio por aqueles últimos anos. Saboreou algumas frutas produzidas na própria Núbia, e outras trazidas por mercadores egípcios e além Mar Vermelho, e distraiu-se com um íbis branco, dando um voo rasante e pousando à beira da piscina. Aquilo só podia ser um sinal de bom presságio, visto que a ave era sagrada.

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