Assim que tivera uma oportunidade, Iana foi conversar com a princesa Cairoshel sobre a visita de seu filho. Encontrou-a em seus aposentos, sendo cuidada por Makena, em silêncio.
— Senhora Cairoshel? Posso entrar? — disse ela da porta.
Cairoshel fez um sinal, sem se virar, dando-lhe permissão. Iana entrou e olhou para Makena, que lhe respondeu com um olhar de quem não entendia o silêncio da senhora. Iana se aproximou e se sentou num banco, puxando-o para perto da cama onde Cairoshel estava sentada.
— Soube que Moisés veio vê-la hoje...
Ela não respondeu, apenas assentiu. Em seus olhos, saudosismo e tristeza. Não sabia dizer o que prevalecia mais, e talvez fosse esse o motivo do silêncio da princesa. Não disse nada, apenas observou enquanto Makena trocava-lhe a peruca pesada de enfeites por uma mais simples, que ela usava quando estava em seu quarto, e retirou todas as joias que a princesa usava, guardando-as em seus baús no toucador. Iana apenas observava o trabalho da dama em silêncio, enquanto Cairoshel conservava um ar contemplativo para o nada.
Quando Makena acabou, puxou para perto dela uma mesinha, e passou a colocar sobre ela a refeição noturna da princesa, que havia chegado da cozinha há apenas alguns minutos antes de Iana entrar. A bandeja contendo os pães preferidos da princesa foi colocada diante dela, com tudo o mais que ela gostava: carne de aves, cerveja e frutas. Makena preparou um sanduíche com a carne, e despejou um pouco de cerveja numa taça. Mas Cairoshel não se moveu em direção à comida. A dama olhou para Iana, e ela lhe fez um sinal para que as deixasse sozinhas. A dama se retirou, e a princesa nada disse.
Iana aguardou, observando Cairoshel, que se mantinha imóvel. Levantou-se do banco e se sentou ao lado dela na cama, segurando-lhe a mão envelhecida.
— Não está feliz? — perguntou Iana.
Esta pergunta fez a princesa voltar-se para a dama cuxita, e olhá-la nos olhos. Uma lágrima desprendeu-se e rolou por seu rosto enrugado.
— Mais do que uma mãe poderia estar.
— Então, por que essa sombra de tristeza em seus olhos?
Cairoshel suspirou.
— Exatamente porque sei o que é ser privada de um filho. E eu fiz isso a Yoquebed.
A compreensão chegou a Iana. Mas ela não disse nada. Esperou que a princesa desabafasse quando sentisse necessidade, o que não demorou muito.
— Ah, Iana... Amei tanto a Moisés, tanto, como se ele tivesse realmente saído de meu ventre... Que nem procurei descobrir de quem ele era filho... E Yoquebed amou tanto a seu filho que abriu mão de criá-lo para que ele pudesse viver. — Cairoshel cobriu o rosto com as mãos. — Como pude fazer isso? Privei a mulher que o pôs no mundo de vê-lo! Lembro-me de todas as vezes que ela veio ao palácio para visitá-lo, e depois de algum tempo eu a proibi! — Ela chorava agora, e Iana abraçou-a para confortá-la. — Eu tive ciúmes da ama de leite de meu filho. Eu quis que ele amasse somente a mim como mãe, e não permiti que a verdadeira mãe dele pudesse conviver com seu filho!
— A senhora não sabia!
— Não importa... Fui tão mesquinha... Tão ruim quanto o Soberano Tutankhamon, que mandou matar todos os bebês meninos no Nilo... Tão ruim quanto meu pai Ramsés I, que mandou matá-lo...
— Não, senhora...
— Eu mereci cada dia dos últimos quarenta anos sem a presença de meu Moshé, porque privei sua verdadeira mãe por quarenta anos de vê-lo, quando ele estava aqui, tão perto!
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A Princesa de Cuxe
Ficción históricaUm romance entre uma princesa sem reino acusada de assassinar a rainha do Egito e um príncipe filho de escravos, ambientada no Egito Antigo, no Reino de Cuxe e nos desertos cativantes de além Mar Vermelho. Esta história começou a ser publicada em 13...