Sete dias durou a Praga do Sangue. Sete dias. Alguns soldados chegaram a morrer. Menik ficou bem perto disso, entre a vida e a morte, até que finalmente todo o sangue se foi e os sacerdotes o serviram de água. Não somente a ele, mas a todos os outros que se encontravam ainda vivos, com um fio de esperança, aguardando as gotas preciosas para se levantarem.
Aquele período o fizera refletir, entre períodos de consciência e outros de delírios. Em alguns momentos pensara que estava seguindo o caminho para o outro mundo, conduzido por Anúbis, e preocupara-se com seu corpo e sua preservação, já que não tivera tempo de juntar absolutamente nada para esse fim. Em outros, chegara a abrir os olhos e ver alguns auxiliares tentando ajudá-lo, sem ter meios para tal. Chegou a ouvir conversas aqui e ali, sem saber se estava vivo ou morto, se eram reais ou sonhos, e foi quando soube da morte de Amarnas, o oficial que o acompanhava em alguns serviços e na guarda do palácio. O homem era bem mais velho que ele, e não resistiu a tanto tempo sem água.
O próprio Menik não sabia como havia aguentado tanto tempo. Assim que a água voltou ao normal, e os sacerdotes os serviram, os oficiais e os sobreviventes do palácio se restabeleceram rapidamente, voltando ao trabalho no mesmo dia, embora não estivessem completamente fortes. Não havia escolha.
Ele soube das baixas por estar a serviço no salão do trono quando o Faraó recebeu o relatório do sacerdote Meryaton.
— Algumas das esposas e servas que estavam aos seus serviços não resistiram à sede, Soberano. E alguns de seus filhos também não suportaram.
Ramsés suspirou.
— As crianças? — perguntou ele.
— Todas morreram.
Ramsés fechou os olhos, estarrecido.
— E os outros filhos?
— Ramsés e Amenhotep estão bem. Estão em seus aposentos se recuperando. Khamuaset também está se recuperando após um período de inconsciência por causa da sede. As suas filhas estão bem. Meritamon e Henutari se recuperam juntamente com nossa mãe, a rainha. Nefertari passou bastante tempo se sentindo mal e, desde o terceiro dia da Praga do Sangue, como os hebreus a chamaram, ela não se levantava. A senhora Isisnefer também sucumbiu, um pouco mais tarde, eu diria, mas parecia ser a mais bem disposta de todas as esposas.
— Sim, meu filho, eu sei — disse Ramsés impaciente. — E quanto aos oficiais?
— Muitos faleceram, mas a maioria está de volta ao trabalho.
— Ótimo. Se a tal Praga acabou, quero saber como está o rio.
— Tão claro como sempre foi — disse Meryaton. — Não sei como pode ser isso, mas já foi confirmado esta manhã que há peixes. Por causa do sangue, toda a vida havia morrido. Mas com o fim da Praga, a vida voltou ao Nilo, soberano.
Ramsés riu.
— Nós conseguimos vencer esta praga, Meryaton. Não importa se Moisés matou o Nilo, Hápi venceu no fim. Anuket venceu no fim. Eu venci no fim. Eu restaurei a ordem cósmica.
Meryaton nada disse. Não queria contrariar o pai e Faraó do Egito, mas sabia que, se seu pai tivesse mesmo vencido, a praga não teria durado sete dias, e algumas de suas esposas e as crianças não teriam morrido de sede. Ramsés percebeu o silêncio dele, mas não disse nada. Encerrou as audiências mais cedo e se recolheu. Precisava ver Nefertari.
***
Iana visitou os aposentos de Bithyah, e ela estava tranquila, como sempre. A Praga do Sangue não a havia atingido, e era a única egípcia que permanecia forte, sem sofrer a fraqueza da falta de água. Bem, não somente ela. Iana também conseguira passar pela Praga sem desfalecer, visitando a casa de Moisés todos os dias para beber água e aprender mais sobre os hebreus e seu Deus. Aprendera mais naquela semana com Moisés do que aprendera em um ano com o Sehpset Husani.
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A Princesa de Cuxe
Historical FictionUm romance entre uma princesa sem reino acusada de assassinar a rainha do Egito e um príncipe filho de escravos, ambientada no Egito Antigo, no Reino de Cuxe e nos desertos cativantes de além Mar Vermelho. Esta história começou a ser publicada em 13...