Capítulo 9

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Não conseguia parar de pensar no assunto. E, por assunto, Iana queria dizer Moisés e tudo o que circundava o misterioso e fascinante hebreu. Tinha curiosidade sobre sua origem, sobre sua vida após o Egito e sobre o deus invisível ao qual servia. Queria saber como ele poderia seguir apenas um deus sobre todos os outros deuses, se fora criado em meio ao Egito e, posteriormente, viveu quarenta anos em Midiã, em meio aos deuses midianitas.

Mas estava desolada. Já estava, há algum tempo, desconfiada de seus sentimentos, mas não imaginava que eram tão fortes. Na verdade, não tivera sequer coragem de assumi-los para si mesma, até aquele momento quando ouvira o capataz falar com ele.

Esposa e filhos. Moisés tinha esposa e filhos. Claro, por que não os teria? Por seus cálculos, ele teria oitenta anos, embora não aparentasse. Era jovem para a idade, e muito belo também. Um homem que atrairia qualquer mulher, hebreia, egípcia ou midianita. Por que não cuxita também?

Suspirou. Caminhara de um lado a outro no quarto do Harém, e algumas esposas já estavam agoniadas. Sentou-se em sua cama e deitou-se, retirando as sandálias de papiro e junco e esticando suas pernas sobre a cama. Fechou os olhos. A imagem de Moisés voltava sempre à sua mente, os cabelos longos, a barba lisa e escura, os olhos ternos e a voz tranquila e firme. E imediatamente, sobrepondo-se a esta imagem, vinha a voz do capataz hebreu.

"Volte para sua esposa e filhos..."

E Iana chorou, silenciosa, entre suas almofadas luxuosas.


***


Moisés estava desolado. Não era esta sua intenção, fazer com que o povo sofresse. Ao contrário, viera para trazer alívio. Sabia que o Faraó se endureceria, e não libertaria o povo. Mas agora, por sua culpa, eles estavam sofrendo mais do que já sofriam.

Chegou à casa de Yoquebed em Gósen, acompanhado de seu irmão Arão, e contou à sua mãe o que acontecera. Imediatamente, Yoquebed e Miriam foram cuidar de Arão e de suas feridas, enquanto Moisés andava de um lado a outro.

— Você precisa se acalmar, meu filho — disse Yoquebed, preocupada com Moisés enquanto aplicava unguentos nas costas de Arão. — Você mesmo disse que Deus tinha mandado você aqui. Se Ele mandou, então Ele irá resolver tudo.

Moisés não respondeu. A sua mãe tinha razão. Não havia nenhum motivo para perder as esperanças e a fé. Ele mesmo não quisera vir. Várias vezes ele dissera a YHW que não conseguiria cumprir aquela missão, que não saberia se expressar ou falar diante deles. Obviamente, estes não eram motivos reais. Moisés fora criado no palácio, e aprendera com os sacerdotes as artes e as ciências, bem como a se expressar. Também era um grande estrategista, e auxiliara seu avô em várias campanhas militares contra inimigos do reino.

O problema é que não queria ter de enfrentar tudo aquilo de novo. Ele nunca se sentira em casa. Ainda se lembrava de quando sua mãe Yoquebed a entregou à sua outra mãe, Cairoshel, para ser criado como filho dela quando tinha sete anos. Não se sentia egípcio, mas aprendera a se misturar. Quando fugira para Midiã, era outro estrangeiro por ali. Vestia-se como egípcio, falava como egípcio, portava-se como egípcio embora não o fosse. Conviveu com o Sacerdote Midianita, e aos poucos tomou a cultura de Midiã para si. Passou a pastorear os rebanhos dele e, pouco tempo depois, ele lhe deu sua filha Zípora em casamento. Passou a vestir-se como midianita, falar como midianita, se portar como midianita. Mas nunca se sentiu midianita.

Quando lhe nasceu o primeiro filho, pôs-lhe o nome de Gerson, que transmitia exatamente o que sentia: "peregrino em terra estranha". E agora, depois que se acostumara com a terra de Midiã, YHW lhe mandou de volta ao Egito, para liderá-los e guiá-los de volta a Canaã, onde, talvez, finalmente tivesse uma terra e uma tradição para chamar de suas.

A Princesa de CuxeOnde histórias criam vida. Descubra agora