Capítulo 18

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Na manhã do terceiro dia da Praga do Sangue, como os hebreus a estavam chamando, Ramsés acordou com uma sensação esquisita. Apesar de se sentir relaxado e bastante disposto, ao mesmo tempo sentia dor de cabeça por causa do vinho em demasia que bebera no dia anterior. A claridade o incomodava, mas o que o havia despertado foi o mau cheiro que adentrava o palácio. Era impossível não senti-lo, uma vez que as piscinas dos jardins apodreciam com sangue. Os peixes mortos que viviam nelas foram recolhidos por escravos, mas eles não podiam se aproximar muito, visto que era impureza para egípcios e hebreus.

Abriu os olhos e observou o quarto girar. Espreguiçou-se e olhou a seu lado. Não havia sido um sonho, então. Isisnefer estava adormecida com um ar leve e feliz. Abanou a cabeça. Havia mais de um ano que não a procurava. Amava a Nefertari, sua eleita a Grande Esposa Real, mas Isisnefer tinha seus encantos, dos quais acabara se esquecendo depois de tanto tempo. Na noite anterior, o vinho em excesso por causa da falta de água o ajudou a achá-la ainda mais atraente do que era, mas naquele momento ele só queria que ela fosse para seus próprios aposentos.

Levantou-se. O que não daria por um bom banho!

— Malditos hebreus... — sussurrou ele.

Ouviu um farfalhar de tecidos na cama e viu que Isisnefer despertara.

— Meu senhor já despertou? — disse ela, espreguiçando-se como Bastet ao renascimento de Rá.

— Sim, Isisnefer, e gostaria que você se retirasse para seus aposentos. Preciso me preparar para o dia de hoje.

Ela sorriu.

— Claro, meu senhor.

Ele a assistiu enquanto ela vestia novamente o kalasiri, prendendo-o na parte frontal e cobrindo o corpo inteiramente nu, e se aproximava, dando-lhe um leve beijo nos lábios.

— Obrigada pela noite, meu senhor. Foi como nos velhos tempos.

Ele sorriu. Realmente havia sido como nos velhos tempos. Mas agora ele precisava focar no tempo presente. Isisnefer o deixou sozinho, para que pudesse se preparar. Precisava saber como estavam seus oficiais. Muitos caíram no dia anterior, sentindo fraqueza. A tendência era esta fraqueza piorar e atingir mais gente pela sede. Será que os deuses os haviam abandonado? O que dizer de Hápi e Anuket?

Suspirou. Mas estava decidido.

Não cederia a Moisés.


***


Iana levantara-se cedo, prendendo no rosto o tecido com perfumes, e foi em direção aos aposentos de Nefertari. Foi quando avistou Isisnefer saindo do quarto do Faraó. Franziu o cenho. Há mais de um ano o Soberano não a procurava. Passava todas as noites com a Grande Esposa Real. Mesmo quando procurava as outras esposas, era um caso esporádico. Estranhou, mas deu de ombros. Não era de sua conta.

Bateu à porta antes de entrar, mas não obteve resposta. Entrou, e encontrou o quarto da mesma maneira que o deixara na noite anterior. Aproximou-se devagar da cama da rainha, e esta jazia na mesma posição que a havia deixado. Temeu. Será que alguma coisa havia acontecido?

— Senhora? Senhora!

Iana tocou nela. Ainda respirava. Balançou seu corpo de leve, e Nefertari abriu os olhos lentamente.

— O que houve? — ela disse com voz pesada. — Deixe-me, estou com muito sono.

— Senhora? Está se sentindo bem?

Ela resmungou algo que Iana não compreendeu. Talvez fosse uma reação combinada entre o vinho excessivo bebido nos dois dias anteriores e a falta de água. Infelizmente não podia ajudá-la. Para que ela bebesse água, teria de ir por conta própria à vila dos hebreus e solicitar que eles lhe dessem de beber de sua própria água armazenada. A rainha não faria isso.

A Princesa de CuxeOnde histórias criam vida. Descubra agora