Quando finalmente o sol voltou a brilhar, já era tarde do terceiro dia das Trevas Densas. Iana não perdeu tempo. Sua decisão estava tomada. Correu para seus aposentos e começou a arrumar suas coisas para iniciar a viagem ao amanhecer do dia seguinte. Não podia esperar que mais uma maldição caísse sobre o Egito; o quanto antes viajasse e voltasse para Avaris, melhor. Lembrou-se como quase fora pega pela Chuva de Pedras, não podia novamente correr este risco. Queria chegar a Avaris antes da próxima praga, e para tanto, precisava ser rápida. De qualquer maneira, Iana não sabia quando a próxima praga viria, e nem se viria mais alguma. Nove pragas já haviam sido derramadas, e ela tinha medo de ficar presa a Kerma e ser deixada para trás.
Moisés havia lhe prometido que ficaria com ela, pedira-lhe em casamento. Mas ele não lhe prometeu esperar por ela. Disse-lhe que, caso todos já tenham partido, ela deveria encontrá-lo no Sinai. Mas Iana não queria isso. Queria partir juntamente com ele, com a princesa Bithyah e todos os hebreus.
Estava no meio de seus aposentos, juntando suas roupas em cima de sua cama, quando sua mãe entrou. O sol já estava se pondo, e Zarina estranhou a atitude da filha.
— Vai nos deixar? Agora que o sol voltou, vai deixar Kerma, a mim e a seu pai?
Iana parou o que estava fazendo e abraçou a mãe.
— Vim apenas me despedir, minha mãe. Minha vida agora está ao lado de Moisés e do Deus de Israel. Preciso voltar, agora que a Praga acabou. Antes que desça mais uma praga dos céus.
— E se você for pega por outra maldição dessas no meio do caminho?
Iana suspirou, voltando para suas coisas.
— Planejei fazer a viagem por fora do Egito, seguindo o Deserto da Núbia e o Deserto Oriental. Assim, se a Praga cair, estarei fora dos limites dela e não serei atingida. Por isso preciso sair assim que amanhecer, para caso haja outra praga, eu já esteja fora dos limites egípcios.
Zarina suspirou. Sabia que não haveria volta, e aquela seria, talvez, a última vez que veria sua filha.
— Venha, então. Vamos fazer um banquete esta noite.
— Banquete?
Zarina sorriu sem humor.
— Bem, banquete com o que nos sobrou depois de tudo o que aconteceu. Estamos há três dias sem comer. Venha. Vamos nos despedir apropriadamente. Vou pedir ao cozinheiro do palácio que nos prepare a melhor refeição que puder.
Iana suspirou.
— Está bem. Mas vá na frente. Irei em seguida, assim que deixar tudo com o máximo de organização, tomarei um banho e irei encontrá-los.
Zarina assentiu e se retirou do quarto com pesar em seu coração. Iana, ao contrário, tinha esperanças e mantinha-se apreensiva com a viagem. Orou ao Deus de Israel que a fizesse chegar a Avaris em segurança.
***
Meryaton lamentou profundamente. Algumas horas antes, havia concluído o processo inicial de mumificação do corpo de sua avó Tye, e acabara de enviá-lo mergulhado em natrão para aguardar o tempo necessário para realizar os últimos ritos fúnebres. Se tivesse aguardado mais algum tempo, teria como analisar o corpo dela e saber, com certeza, se havia sido ou não envenenada. Agora, estava tudo perdido.
Suspirou. Não poderia ter esperado mais. Poderia pôr a perder a qualidade da mumificação dela. Maldita praga das Trevas Densas. Ao menos, agora tinham novamente a luz de Rá para abençoá-los. Esperava que, da mesma maneira que Rá iluminava novamente os céus do Egito, também iluminasse aquele caso, e que tudo fosse esclarecido, apesar de não poder mais contar com a análise do corpo de Tye. E, se ela tivesse mesmo sido envenenada, que o culpado aparecesse.
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A Princesa de Cuxe
Historical FictionUm romance entre uma princesa sem reino acusada de assassinar a rainha do Egito e um príncipe filho de escravos, ambientada no Egito Antigo, no Reino de Cuxe e nos desertos cativantes de além Mar Vermelho. Esta história começou a ser publicada em 13...