Capítulo 20 - Ela?

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Alfonso desce batendo a porta do carro e toca o interfone. Não tinha levado as chaves. Nem imaginava que iria para o sítio da família. 

Não demora muito, um homem simples, bem educado, aperta forte a mão de Alfonso com um enorme sorriso. Alfonso volta ao carro e parte para dentro do local. A mulher  calada, olha para trás, vendo o homem fechar o portão. E Alfonso segue caminho até a entrada casa principal, metade do terreno.  

Um campo enorme, lagos, animais ao longe: cavalos, bois e vacas, patos e gansos... Ele para na porta da casa e rapidamente sai, abrindo a porta do carro para ela. Ela se encolhe, temendo que ele fosse machucá-la, mas ao contrário, pega delicadamente em sua mão:

- Vem. – ele pede. Ela teme, mas ele a tira do carro e a leva para dentro da casa pela mão.

- Preciso ir ao banheiro... – ela fala pela primeira vez sem choro nem grito, mas ainda temerosa.

- Por aqui. - e a leva até um quarto. Ao ver a cama de casal, ela estremece. O que ele faria com ela? O que queria dela? Alfonso abre a porta da suíte:  - Pode usar aí. E não saia do quarto.

Ela entra no banheiro e Alfonso sai do quarto. 

O caseiro chama a mulher que estendia roupa:

- O patrão chegou! Quando você arrumou a casa lá?

- Dei uma limpeza onti. – ela responde secando as mãos no avental - Vamos lá.

- Ele veio sozinho?

- Não. Está com uma mulher, eu vi no carro. Só que ele desceu rápido pra casa.

Alfonso já estava em pé no meio da sala,  quando o caseiro abre a porta da casa grande com a mulher: 

- Seja bem-vindo, patrão.

- Oi patrão, como o senhor está? - a mulher do caseiro também a cumprimenta.

- Bem, Maria. E você? As crianças?

- Todos bem, graças a Deus. Os dois maiores estão na escola. Javier foi prender os cachorros. – Maria responde.

- E veio passar uma temporada, patrão? – o caseiro pergunta.

- Acho que sim, Pedro. Passarei uns tempos aqui. Minha filha precisa respirar ares mais puros.

- Ah então aqui é o lugar certo!

- Faz um tempão que não aparecem aqui. Também depois de tudo que aconteceu, eu lamento, patrão. – Maria diz e se arrepende de ter tocado no assunto - Mas é bom esquecer aqui na tranquilidade...

Alfonso estava tenso, sabia que aquela mulher não lhe obedeceria, como uma guerreira sairia do quarto aos gritos que fora sequestrada e ele não podia deixar que seus caseiros se assustassem assim, por isso interrompe Maria:

- Eu preciso dizer algo importante. Antes, preciso das chaves dos quartos. Vim correndo, deixei as chaves em casa.

- Sem problemas, patrão. – Pedro, carismático, abre um sorriso, como sempre fazia em tudo que dizia. 

- Outra coisa. Eu trouxe uma pessoa. Peço que vocês não se assustem, mas essa pessoa...

E a mulher no quarto já saíra do banheiro e sem pensar duas vezes, abre a porta do quarto e sai gritando:

- Por favor, me ajudem! Ele me sequestrou!

 O casal de caseiros fica imóvel, assustados. Alfonso, calmo, revira os olhos:

- Por favor, me espere no quarto.

A mulher grita: Nunca!! Por favor, me ajudem! - e pensa um pouco - Peraí, quem são vocês? Estão com ele?!

 O casal só tinha cara de espanto. Alfonso lhes pede:

 - Por favor, nos dê licença. E traga a chave.

E o casal, mudo, espantado, se retira da casa. Assim que saem, Alfonso questiona com Nina:

- Por que você fez isso? Não disse pra ficar no quarto? - ele tenta se aproximar dela, que foge dele. 

Amedrontada pede: Não, não chega perto de mim! - e corre dele pela sala, dando a volta no sofá, na mesinha de centro...

Alfonso a impede de passar pela cozinha, se entrasse, ela pegaria uma faca e não hesitaria em acertá-lo. Ele se afasta para lá e ela então vai em direção à porta da casa, mas ele a envolve e a joga por cima do ombro, carregando para o andar de cima. Ela lhe soca as costas, lhe chuta a barriga com o joelho, se esperneando em seus braços, dificultando de subir as escadas com ela, mas ele ainda era mais forte:

- Dá pra parar?- ele pede. Ela não obedecia e isso o irritava. Ele abre a porta de um dos quartos e ela grita mais, como se fosse para o abate. A coloca sobre a cama e ela corre para a cabeceira, acuada. Suando, seus cabelos alvoroçados e seus olhos azuis brilhando espantados:

- Por favor, não. - ela suplica. Sua feição apreensiva faz o coração de Alfonso bater mais acelerado.

 Ele encosta a porta e de pé lhe diz mansamente: - Eu não vou lhe fazer mal.

Mas ela não acreditava. Sem gritar, seus olhos derramam lágrimas que ela tenta secar mas caem sem seu controle: - Então por que me trouxe pra cá? Eu não tenho dinheiro, não tenho nada!

Alfonso senta na beirada da cama, lhe estica a mão para um afago, mas ela se encolhe.

- Quem é você? – ele pergunta novamente.

Ela nada responde, seca as lágrimas sem encará-lo

.- Você vive com quem? – ele insiste. A mulher apenas seca o rosto sem encará-lo - Nina... - um nome que ele não não acreditava - Você mora nas ruas?

As lágrimas voltam a rolar no rosto dela . Alfonso se levanta: Ok, quando quiser me falar, estarei aqui. Mas se alguém sentir sua falta e chamar a polícia eu digo que você fugiu e se refugiou aqui, hein.

Ela, de cabeça baixa, abraça os joelhos, numa posição infantil de criança manhosa. 

- Você pediu isso. - ele esperava uma resposta, nada. - Se bem que uma mendiga igual você não deve ter família. 

Não era difícil deduzir isso,  ao observá-la agora mais detalhadamente: uma camisa de malha encardida, ao menos dois números maior que o dela, uma calça jeans muito comprida e também larga, além de desbotada. Um chinelo tão gasto, as unhas descuidadas. Tão diferente da sempre exuberante e vaidosa Anahí, mas ao mesmo tempo o mesmo rosto, a mesma feição, tamanho... e a mesma cicatriz na mão esquerda!!


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