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Ao guardar a pasta com meus currículos no guarda roupas, vejo o cartão de Eduardo e penso bem antes de entrar em contato. Mando um simples oi no WhatsApp e ele me retorna com uma mensagem automática. Claro, é usa esta número para seu trabalho.

Abro a foto do seu perfil e fico admirada. É um homem muito bonito e pelo que vi, extremamente educado. Não sei ao certo o que viu em mim para me passar seu número, mas fazer o que. Há gosto para tudo. Tem quem se apaixone por pés. Então é válido alguém se apaixonar por mim. Eu não poderia compará-lo a Felipe, não, não mesmo! Ambos são completamente diferentes.

- Bom que você chegou. - Meu pai diz, me assustando.

Desvio meu olhar para a porta do meu quarto e o vejo de pé. Ótimo, está sóbrio.

- O que foi? - Pergunto indiferente.

- Um homem de gravata veio aqui, me deu esse papel - Ele me entrega. Era um aviso de despejo. Teríamos que desocupar a casa em cinco dias. Ao terminar de ler, meu coração acelera.

- Merda! Já sabia que isso iria acontecer. - Murmuro - O que mais ele disse?

- Nada, bati o portão na fuça dele.

Disse me fazendo rir. Foi engraçado mas a situação era séria. Andei em cada canto do centro da cidade, em cada clínica que busquei na Internet e nada, nenhuma vaguinha.

- Eu vou da um jeito.

Ouço meu pai soltar um longo suspiro, acho que era um pedido de desculpas. Ele sai, sem dizer nada.

Encaro meu celular cujo estava com a tela rachada. Ele acende em minhas mãos, revelando a mensagem de Eduardo.

Olá, Mariana. Esperei por sua mensagem.

Impossível não abrir um sorriso.

Se meu destino estava traçado e eu não sei, mas deixei acontecer. Tentei se feliz sozinha, não consegui, amei alguém que não me dava o mínimo valor, óbvio, não deu certo. Optei por arriscar, era uma oportunidade de pensar um pouco mais no que significa amor próprio. Quando desacelerei para a vida, notei o quão interessante eu era, percebi saídas que antes parecia não haver.

Eduardo foi uma dessas portas.

2 mêses depois.

Recolho os saquinhos com minhas belas de maçã, uva, banana e yogurt. Fecho minha pochete e me levanto do ponto. Era a minha vez de vender. O ônibus para bem em frente ao fiscal que sobe ao mesmo, assim como eu, mas na porta de trás.

Observo os passageiros sonolentos, outros nem tanto. Abro um sorriso simpático. Ainda era sete e pouca da manhã.

- Bom dia. Primeiramente peço perdão por atrapalhar o silêncio da viajem de vocês - Digo sorrindo - a amiga está aqui vendendo as balas mais gostosas da região hein. Apenas um reais o saquinho. Quem puder ajudar.

Não demorou muito para as pessoas me chamarem.

- Me dá uma de banana - Pede a cliente. Recolho o dinheiro e a entrego.

O motorista alerta que vai sair.

- Aí, amigo! - Ofereço um saquinho de bala para o mesmo - Para as crianças.

- Obrigado, princesa. Boas vendas aí.

Agradeço e saio do ônibus. Me sento no ponto novamente ouvindo murmúrios dos outros vendedores.

A crise me afetou demais, papai e eu conseguimos uma kitnet, a senhora muito simpática nos deixou entrar sem necessidade de deposito. Rodei tudo e não consegui um emprego, então tive a ideia de vender balas, com a ajuda de alguns amigos fiscais do meu pai, eu consegui. Consigo fazer novecentos reais por mês, isso quando tenho sorte. O dinheiro não é muito, pago o aluguel, a comida e o que sobra compro material para trabalhar. Meu pai está debilitado, todos os dias reclama de dor na barriga.

Meu celular vibra dentro da pochete, busco por ele e vejo uma mensagem de bom dia, vinda de Eduardo. Estamos conversando faz tempo, já saímos algumas vezes, inclusive uma dessas vezes, Felipe me ligou e Eduardo fez questão de atender. Optei por não expor minha situação para o mesmo, não era de sua conta. Todo mundo tem problemas e cada um resolve o seu.

Respondo sua mensagem e guardo meu celular.

- Marizinha, vou nesse. Depois tu vai no próximo. Flávio vai passar pra tu - Wellington diz.

Somos em três, fazemos rodízio para vender.

- Beleza. Me dá uma batata aí, nem tomei café - Reclamo.

Wellington destaca um saquinho de batata e me dá. Ofereço o dinheiro mas ele nega.

- Precisa não, relaxa aí - Ele sorri.

Wellington aparentava ter uns trinta e cinco anos. Cabelo baixinho, barba para fazer, aparelho nos dentes e uma aliança no dedo.

A tarda chega, mudo de ponto e vou para a pista, bem próxima ao sinal. A hora do pique é a melhor. Quando o sinal fecha eu entro em meio aos carros, deixo um saquinho de balinha no retrovisor. As vezes dá certo, outras não.

- Quanto tá? - Ouço um homem perguntar.

Me aproximo do carro, avisto uma jovem no banco ao seu lado. Ela me encara e desvia o olhar, acho que não gostou de mim, ou está com ciúmes.

- Um real. - Respondo rápido. No sinal o jogo é rápido.

- Me dá uma aí. Essa verde - Ele me dá o dinheiro.

- Vai comprar uma pra princesa aí, não? Ela precisa de um doce pra adoçar o dia. Ele precisa ser compatível com a doçura dela. - Digo.

A mulher abre um sorriso e me encara. O homem sorri e compra mais dois saquinhos. Recolho minhas balas rapidamente, mas quando vou recolher o último saquinho o sinal abre e o carro sai disparado. Quase leva minha mão.

- FILHO DA MÃE!

Trabalhar na rua não é fácil, além de tolerar coisas desse tipo, tenho que aguentar cantadas idiotas e o perigo de ser atropelada.

A tarde havia chego mas o sol não dava trégua. Eu estava com uma calça justa, camiseta branca e tênis.

Paro na calçada para contar minhas moedas e separar o da passagem de volta para casa. Quando o sinal fecha avisto um carro vermelho, era um Corolla. Reconheci o homem que estava dentro, era o marido de Ana, e ele estava acompanhado por uma mulher que não era ela. Ele conduzia o carro, mas de onde ele tirou dinheiro para ter um carro assim? Que eu saiba que tinha dinheiro era o irmão dela.

CDC - Concluída.Onde histórias criam vida. Descubra agora