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O cheiro daquele ambiente, uma mistura de produtos de limpeza com éter. O ar condicionado trabalhando a todo tempo por conta das bactérias.

Odeio hospitais.

Bufo me encostando na enorme parede branca descascada. Levaram meu pai para sua sala e não me deram se quer uma explicação sobre o que ele estava sentindo ou se estava acordada. Na ambulância ele permanecerá desacordado.

Só de pensar que posso perde-lo me sinto sem chão.

Meu estômago alerta que precisa de algo para acalmá-lo. Tudo o que tenho em meu bolso é dez reais que eu usaria para ir trabalhar.

Duas horas depois.

Vejo um homem caminhando em minha direção, seu jaleco branco o deixava ainda mais velho. Sem demora me ponho em sua frente, afim de acalmar a enorme dúvida dentro de mim.

— Oi. Eu trouxe meu pai para cá, ele estava desmaiado — Digo nervosa — até agora não há notícias. Poderia me ajudar?

— Pode ir até a recepção, dê o nome dele e irão liberar você para vê-lo. Uma vez que ele entrou desmaiado, deve estar sendo examinado.

— Certo. Obrigada!

Não demoro para correr em direção a recepção do enorme hospital.

Observo uma das mulheres que atende conversando com uma enfermeira. As duas distribuam gargalhadas.

— Oi. Meu pai deu entrada aqui a algumas horas. Não tenho notícias. — Digo rapidamente.

A mulher me fita seriamente, talvez por eu ter atrapalhado sua conversa.

— É um senhor que entrou desacordado? — Indaga, eu assinto — você não fez a ficha dele. Não apresentou nenhum documento.

Me xingo mentalmente. Como pude esquecer os documentos?

— Desculpe, eu sai de casa no desespero. O vizinho me trou...

Ela me interrompe.

— Me dê o nome todo dele e por favor, traga os documentos ainda hoje.

— Joaquim Ribeiro da Cunha.

— Quantos anos o senhor Joaquim tem?

— 68, 70. Eu não sei — Assumo constrangida.

— Você é o que dele?

Pergunta sem me olhar.

— Filha.

— Seu nome, se você lembrar — Diz irônica.

— Deste não esqueço, e nem você esquecerá. Mariana Ribeiro de Oliveira.

— Ok — Diz terminando de digitar — Vai até o corredor e vire a esquerda. Ele está lá. Já passou pelo ambulatório.

Lanço um sorriso forçado para a mulher e sigo em direção ao corredor. Minha paciência já se esvaia entre meus dedos, como uma mulher vem tentar me tirar do sério desta forma? Surpreedente.

Chego ao local indicado e vejo algumas pessoas deitada em suas devidas macas, algumas acordadas e outras adormecidas. Corro meus olhos pelo local em busca de meu pai.  O encontro deitado em uma maca, encostada na parede. Quando seus olhos encontram com os meus, vejo alívio.

— Mariana, pede para eles tiraram isso de mim — Meu pai diz, se referindo a agulha em seu braço.

— Não dá pai, isso vai fazer o senhor ficar melhor. Como está se sentindo?

Digo acariciando seus poucos cabelos.

— Estou sem dor, só incomodado com essa agulha.

— O que o médico disse? — Pergunto curiosa.

— Fizeram um monte de exames assim que acordei. Disseram que o resultado sairia daqui a três horas.

Suspiro em pensar que ficaria mais algumas horas sem saber o que houve com ele.

Além do mais, tenho outro problema para resolver; preciso ir buscar os documentos dele mas não tenho dinheiro para isto.

Horas se passaram e nada. A dor de meu pai havia retornado, eu já não aguentará mais o ouvir gemendo de dor. A cada trinta minutos eu corria atrás de um médico para me dá um parecer e nada. Finalmente uma doutora me chama, meu pés estavam doendo de tanto ficar de pé. Não havia se quer uma cadeira para os acompanhantes.

— Esse aqui é o resultado do exame de imagem do seu pai — A doutora mostra.

Um papel com várias coisas escritas e ao lado algumas imagens em preto e branco. Eu não entendo absolutamente nada.

— Eu não entendo muito. — Confesso.

A doutora observa meu pai por cima de meus ombros, o mesmo tentará ouvir algo.

— Seu pai está com com cirrose hepática. — Diz em um tom nada agradável.

Levo minha mão a boca, surpresa com a informação.

Ah, pai o que foi que você fez consigo?

Não acredito...que merda!

No estado em que se encontra, ele precisa de um transplante de fígado. Infelizmente não podemos lidar com isto, teremos que por na fila de espera. — Confessa ela.

— Sisreg? Nem pensar! Moça, meu pai pode morrer se esperar todo esse tempo.

— O que você pode fazer é tranferi-lo para um hospital particular. Esse é meu conselho. — Ela estava sendo honesta.

Essa honestidade me assusta.

— Não há nenhum outro tratamento? Remédios, qualquer coisa.

— Infelizmente, não.

Apenas aceno com a cabeça. Sinto a mão da mulher em meu ombro, como se quisesse me confortar. Em seguida ela sai me deixando perdida em pensamentos.

Há duas pessoas que podem me ajudar. Felipe poderia me arrumar o dinheiro para pagar tudo, mas não seria uma boa idéia, ele acharia que tem algum poder sobre mim. Eduardo por outro lado tem conhecimentos, poderia facilmente me ajudar, mas ele não quer me ver nem pintada.

Talvez William possa me ajudar...Ah, a quem estou estou querendo enganar? William é tão pobre quanto eu.

Vamos lá, Eduardo, me atenda.

Um toque, dois toques, três toques e nada.

Ligo novamente. No segundo toque ele desliga.

Ligo novamente e finalmente me atende.

— Eduardo. Por favor, não desligue. — ouço apenas sua respiração calma— Bom, eu sei que você está com muita raiva, e não posso fingir que não há um motivo plausível. Posso te pedir mil perdões mas não será como antes, na v...

Estou ocupado. Diga o que quer.

Ele me interrompe. Me xingo mentalmente.

— Estou no Getúlio Vargas. Meu pai, ele está com cirrose hepática, precisa de um transplante de fígado mas teria que entrar na fila. — Suspiro — você sabe como são essas coisas; demoradas. Preciso de ajuda, se ele ficar na fila, morre.

— Verei o que faço.

Seu tom era seco. Dito isto ele desliga. Uma dúvida cruel se instala em minha cabeça, ele iria ou não ajudar?

CDC - Concluída.Onde histórias criam vida. Descubra agora