2. O Trabalho de Bela

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Alguns dias antes...

Bela foi chamada ao gabinete do seu superior. Sentiu o peito apertado. A secção que dirigia estava quase sem trabalho e ela não tinha ideias como vender mais produtos. Nem o que fazer com o stock que ficava armazenado nos armazéns. A concorrência tinha mais produtos e mais baratos do que os que comercializavam. A equipa de marketing esforçava-se, mas os resultados eram poucos ou nulos. Podia ser outra reunião para escolher quais colaboradores precisavam dispensar e como ter mais rentabilidade. Bela suspirou. As pessoas precisavam do trabalho para viver e escolher quem fica e quem vai fazia-a sentir um peso no estômago.

- Bom dia, Bela, como está? – Dr. Gonçalo acariciou a careca rodeada pelo pouco cabelo que tinha.

- Bem, obrigada e o Dr. Gonçalo?

- Bem – suspirou – receio que a nossa conversa não irá ser nada agradável hoje.

- É sobre a rentabilidade da secção, não é?

- Sim. Assim não pode continuar. Vamos ter que fechar a secção.

Bela sentiu como se um balde de água fria lhe caísse em cima.

– Como assim fechar a secção?!

Gonçalo suspirou.

– Parece um processo complexo, mas é muito simples. Basta transferir os colaboradores para outras secções. Agora, fica a questão o que eu faço com a Bela? Até agora tem sido uma excelente funcionária e subdiretora. Ao fechar a secção, vou ter que despromovê-la e colocá-la num cargo de subalterna... ou se estivesse disposta poderia fazer outra coisa fora do âmbito do seu cargo...

Bela sentia a cabeça a rodar com mil pensamentos: as consequências e mudanças no futuro que a assustavam. No entanto, não era tempo para pensar nisso. Precisava de saber qual era a alternativa de Dr. Gonçalo.

– Que outra coisa?

– Ouviu falar deste escândalo sobre o óleo de palma?

– Sim, vi nas notícias ontem. Qualquer coisa que andam a incendiar florestas virgens...

– Pois, quem anda somos, supostamente, nós.

– Somos?

– Não sei. Eu preciso que alguém investigue e que faça um relatório com o que anda realmente a acontecer...

– Quer que eu faça isso? Não parece muito complicado... Mas não haveria pessoas mais indicadas para o cargo? Porque eu, daqui de Portugal, e não alguém da sede?

– Por isso mesmo, de si ninguém desconfia. Não é complicado, apenas precisa de ir para a Sumatra, na Indonésia, para investigar. Quero que me diga o que vê porque não confio no que os relatórios da produção dizem. Se alguém da empresa for responsável nunca irá aparecer nos relatórios. Claro que esta informação é confidencial e não poderá dizer a ninguém.

– Tenho de ir para a Indonésia? A empresa paga-me tudo?

– Claro que sim. Terá de ir para a Indonésia e investigar como os produtores de óleo de palma estão a gerir a produção, como adquirem novos terrenos e se realmente alguém da empresa está a cometer crimes. Tenho o diretor da filial de lá em férias no Bali, mas ele aceita recebê-la e arranjar tudo o que necessita para a sua estadia. Se o seu relatório for de qualidade, como sei que irá ser, dou-lhe a promoção que merece e coloco-a como diretora da produção dos fritos, o que acha?

A produção de fritos era um dos sectores com mais sucesso em toda a empresa. A empresa vendia vários produtos alimentares, mas o principal era o comércio de pacotes de batatas fritas. Quase todos fritos com óleo de palma.

– É uma proposta tentadora, mas se não aceitar e ser despromovida continuo a ter as regalias que tenho agora? O prémio e o seguro de saúde?

– Quando a Bela era apenas uma assistente tinha esses privilégios?

– Não.

–Então, aí tem a sua resposta.

– Então, só para recapitular, para ser promovida tenho de ir à Indonésia ver o que os produtores fazem e escrever um relatório sobre isso?

– Vê como é fácil a sua promoção? Apenas, tem de dizer que vai aprender sobre a produção de palma e não que os está a vigiar, como é óbvio. Tenho aqui uma passagem já para daqui a quinze dias. Se não for capaz de fazer algo tão simples, nem vale a pena estar nesta empresa. Agora, vou ter outra reunião, Bela pode sair.

O chefe pegou no telefone e chamou um dos seus assistentes, sem esperar resposta. Bela sentia o sangue a ferver quando se levantou para sair enquanto o assistente entrava pela sala. Ela queria mais explicações e, sem dúvida, que aquela resposta teria sido desnecessária.

Quando Bela saiu, o assistente esperou um momento para certificar que Bela não poderia ouvir a sua pergunta:

– Conseguiu convencê-la?

– Sim, creio que sim.

– Falou sobre os anteriores fracassos?

– Disparate! Só se fosse burro faria tal coisa! Ela não quereria ir de certeza! – ouviu-se um barulho lá fora de alguém a correr rapidamente.

– Mas eles morr... – foi interrompido pelo chefe.

– Não falemos de coisas tristes! Consegui, é o que é importante. Ela tem de ser capaz para este trabalho e se não for é facilmente dispensável. Temos demasiados chefes nesta empresa!

Nesse momento, abriram-se as portas e entraram os responsáveis de outro departamento para reunião.


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