Bela viu que uns vizinhos iam para Padang e pediu para ir com eles, foi mais por gestos do que por palavras mas conseguiu fazer-se entender. Quando chegou a Padang agradeceu e vagueou pela cidade. Não tinha dinheiro fora os poucos trocados que tinha ficado desde que chegou à Indonésia. Agora precisava de sobreviver sozinha e deixar de ser um peso para Harta e para a família dele. As palavras de Harta ainda estavam cravadas no seu coração como punhais, mas ela ia seguir em frente. Ela estava a fazer o que era certo.
Vagueou nas ruas a pensar se o dinheiro que tinha daria para ir a um cibercafé ou se era melhor ir à Universidade de Padang (ouviu Harta a falar nela, mas não sabia onde era), de certeza que teriam computadores e Internet. Até que passou num hotel que lhe chamou a atenção pelo ser um edifício único e viu um anúncio em inglês na montra a informar que procuravam empregados que soubessem bem inglês e português.
Ela entrou e dirigiu-se à receção. O seu coração batia fortemente, a sua cara ainda tinha marcas do incêndio e o seu corpo tremia, mas mesmo assim tinha de tentar. Esta era a sua grande hipótese de retribuir a Harta e à sua família.
- Bom dia, vi que estão à procura de empregados que saibam português e inglês – Bela falou em inglês para que fosse mais fácil de entender.
- Bom dia! Sim, estamos tem o seu currículo? – a recepcionista era uma bonita mulher com os olhos e cabelos negros e sorriso amplo.
- Não tenho currículo mas posso falar com o gerente, posso comprovar as minhas competências...
A recepcionista olhou para Bela com uma clara decepção. Pediu um momento e desapareceu para dentro do hotel. Bela ficou ali em pé encostada no balcão sem saber se deveria sentar ou não.
Depois de meia hora, a recepcionista voltou com um homem, alto e muito branco, tinha todo o ar de ser estrangeiro. A recepcionista voltou-se para Bela:
- Peço desculpa a demora, pode falar com o senhor Rafael, o gerente do hotel. – desviou a cara para os seus afazeres deixando Bela a olhar para o homem estrangeiro. Ele olhava intrigado para o lenço que Bela usava. O nome dele era português, não era?
- Bom dia – Bela deu-lhe a mão como cumprimento – o meu nome é Bela Andrade e estou interessada no cargo anunciado na montra.
- Bom dia – respondeu ao cumprimento e olhou-a curioso, passou a falar em português – siga-me vamos conversar no escritório.
Quando entraram, Rafael apontou uma cadeira para Bela se sentar.
- Obrigada – Bela sentou-se tentando controlar os nervos. Nunca se sentiu tão nervosa e inadequada numa entrevista de emprego, mas a verdade é que nunca precisou tanto de um emprego como naquele momento.
Rafael olhou para ela parecia à espera que ela falasse alguma coisa, mas como isso não aconteceu, quebrou ele o silêncio.
- Então explique-me como acha que vai ser capaz de atender clientes e agendar as reservas de clientes em inglês e português? Sabe bem falar e escrever? Quais são as suas qualificações? – bombardeou-a em português talvez à espera que ela não entendesse.
- Compreendo as suas dúvidas, mas posso garantir que sei falar e escrever tanto em português como inglês – em frente de Bela estava um pequeno bloco de folhas em branco e um copo de canetas. Bela tirou uma página e escreveu um pequeno texto em português e inglês e entregou-lhe pouco depois– como poderá ver por si mesmo.
- Tem uma identificação? É indonésia ou portuguesa? – Bela tremeu com a pergunta. Tinha a identificação como Bulan e que dizia que ela era indonésia.
Não podia recuar. Estendeu-lhe o seu documento identificativo. Rafael agarrou a identificação impaciente.
- Muito bem. Sabe utilizar um computador? Porque não tem currículo? – ainda estava impaciente, parecia que tinha formado a ideia que ela não sabia nada e estava disposto a comprová-la.
- Ah! Sim, sabe o que aconteceu, a casa que eu estava a morar ardeu a noite passada e por isso... – Bela ajeitou o lenço ao tentar arrumar-se e parecer mais apresentável. Não queria dar entender que na casa de Harta não havia um computador e viviam com o mínimo dos mínimos.
- Ardeu? A sua casa ardeu a noite passada?!– a pose superior de Rafael foi desfeita. Ele estava chocado e curioso sobre a história de Bela.
- Sim, foi horrível... fomos às compras e quando voltámos estava mais de metade da casa a arder – os olhos ficaram perdidos a relembrar do choque recente – fiquei sem nada... mais... – interrompeu-se para não dizer "mais uma vez" – mas tenho fé nas minhas capacidades e preciso de trabalhar. Aprenderei e dedicar-me-ei como ninguém!
Rafael sorriu com a contenção daquela mulher a falar da tragédia que lhe tinha acontecido. A cara embora parte tapada com um lenço azul, tinha marcas vermelhas aqui e ali a comprovar que esteve perto de um incêndio muito recentemente. As mãos estavam calejadas, as roupas eram simples embora todo o porte dizia que ela estava habituada a ter mais do que naquele momento aparentava. Olhou para o documento que ela lhe entregara. Filha de pais portugueses. Portugueses como ele. Havia poucas pessoas que soubessem tão bem as duas línguas, se a ajudasse, ela trabalharia com afinco para conquistar tudo o que perdeu.
- Muito bem. Vou-lhe mostrar o sistema que vai ter que utilizar e vai atender uma chamada de uma colega para ver as suas capacidades e se passar ficará admitida – ao ver o seu sorriso, sentiu o coração a agitar-se. Rafael olhou-a com atenção. Há quanto tempo não sentia o seu coração a agitar-se pelo sorriso de uma mulher?
- Vou-me esforçar! Muito obrigada! – Bela não acreditava na sua sorte.
- Vai precisar de estadia e de alimentação, não é? – Rafael observou o aspeto dela, via-se que tinha vindo diretamente do incêndio para aquela entrevista.
- Ah! Sim... – fez uma expressão embaraçada – será que posso ter direito a isso?
- Sim, pode com desconto no seu ordenado... ficará com as camareiras e empregados de serviço, tem problemas com isso?
- Nenhum! Muito – apertou-lhe a mão e olhou-o nos olhos – muito obrigada mesmo!
Rafael desviou o olhar, massajando o peito com a mão desimpedida.
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Investigação na Indonésia
Mystery / ThrillerBela, subdiretora da Global, é enviada para investigar os estranhos incêndios supostamente causados pela sua empresa na Indonésia. Durante a viagem, ela perde tudo inclusive a sua identidade o que a leva a refletir sobre a sua vida e o que é importa...