No dia seguinte, quando Bela acordou Harta já não estava em casa. Tinha arranjado um trabalho especial ao fim de semana. Estava empenhado em ganhar dinheiro para o casamento. Bela aproveitou para ajudar Batari nas arrumações da casa e depois saiu à procura de algum lugar onde pudesse ver o e-mail mais uma vez. Mais uma vez vagueou as ruas de Padang, observou as casas baixas, os macacos dourados que por vezes percorriam os telhados divertidos. Tentou ter uma ideia para onde ia, mas desta vez tinha o seu telemóvel. Poderia ligar para Harta caso se perdesse.
Apesar de ter o telemóvel sabia que só poderia ligar para Harta quando ele saísse. Mesmo se se perdesse. Por isso, andava com calma e com cuidado nas ruas quase sem passeio. Espreitava todos os estabelecimentos há procura de algo parecido com um cibercafé. Via muitas pessoas com telemóvel, mas nem mesmo no hotel não via muitas pessoas com computadores naquele país.
Distraiu-se ao pensar se Linda já teria lido o seu e-mail e o que aconteceria depois de ela concluir o relatório. Devia voltar para Portugal? Voltar com Harta ou sozinha? Ou ficar em Padang e avisar Linda? O que iria fazer? No que iria trabalhar? Não iria ficar no hotel para sempre. Era um trabalho aceitável, mas não a apaixonava. Era apenas algo que conseguia fazer.
- Bulan? Bulan! Bulan! – ouviu uma voz perto de si, mas como não era o seu verdadeiro nome, Bela demorou a compreender que a estavam a chamar. Sentiu um toque no ombro e olhou para Rafael a sorrir e ofegante.
– Ah! Rafael o que faz por aqui?
– Vim passear um pouco e a Bulan? – sorriu contente por a ter encontrado – já que estamos aqui não quer vir beber um café comigo? Eu conheço um bom café aqui perto.
– Pode ser – se fosse outro colega de trabalho Bela pensaria duas vezes por estar a utilizar uma identidade que não era a sua. Todavia, Rafael era um bom homem tinha-lhe dado emprego a si e a Harta mesmo sabendo as suas dificuldades. Mais uma pessoa a quem ficaria a dever para o resto da sua vida.
Rafael ficou contente pela companhia. Rafael estava sempre sozinho quando o encontrava, nunca falava de mulher e muito menos de filhos, o que fez Bela pensar que ele era uma pessoa muito só.
Quando chegaram ao café, ele puxou a cadeira para Bela sentar-se e foi pedir os cafés. Rafael enquanto pedia os café, questionava-se qual a melhor forma de perguntar tudo o que gostaria de saber sobre aquela misteriosa mulher e o seu noivo. Quando se sentou resolveu ir direto ao assunto.
– Conte-me o que uma portuguesa muçulmana faz em Padang? De certeza que não veio para o festival de surf. - riu-se da sua própria piada.
Bela ficou chocada com a piada. Ela não se considerava muçulmana, ela usava aquele lenço como símbolo de pertencer à família Dewi, não pela religião.
A mesma coisa do que qualquer outra portuguesa, existe pessoas de todos os lados aqui – respondeu rapidamente – a minha família é portuguesa...
- Está a fugir à questão, Bulan. Se tivesse realmente nascido aqui, saberia falar melhor bahasa indonésio, não acha? – sorriu. Como e quando tinha descoberto que era tudo mentira?
- Como o Rafael veio parar a Padang? – contra-atacou. Dizem que o ataque é a melhor defesa.
– Abriu uma vaga aqui como gerente do hotel e eu estava doido para ver o mundo e vim para cá. Acabei por não ver tanto como gostaria, mas gosto bastante de estar aqui – Rafael não iria contar a sua verdadeira razão nunca e muito menos a Bela que fazia o seu coração vibrar tanto – Acho que é do clima.
Bela ergueu a sobrancelha. Clima? Aquele clima abafado, estava calor, mas sentia-se uma nuvem de humidade em todo o lado que até abafava o sol?
- Gostos não se discutem! – disse rapidamente como se lesse os pensamentos de Bela – Agora é a sua vez.
Nesse momento, Harta surgiu como se tivesse colocado um GPS em Bela e soubesse sempre onde a encontrar. Antes de o ver entrar no café, sentiu o seu olhar furioso sobre ela, como o gelo fino que poderia quebrar a qualquer momento.
- Boa tarde – Harta ouviu-os a falar em português e, por isso, cumprimentou-os na mesma língua, para que Rafael não pensasse que ele não tinha entendido a conversa. Aproximou-se de Bela, colocando-se ligeiramente à sua frente, mas não lhe tocou.
- Ah! Harta! Como vai? – Rafael cumprimentou-o como não sentisse a raiva fria que ele emanava – encontrei a Bulan na rua e estávamos a falar como ela veio para Indonésia.
– Bulan nasceu na Indonésia, morou em Portugal durante muito tempo e ficou comigo e com a minha família quando ficou sem família, – mentiu como um profissional –, faz parte da minha família e vamos casar em breve. Por favor, não duvide mais dela.
Rafael sentiu uma estaca de gelo a ser lançada ao seu coração. Estagnou por momentos e deixou-a derreter ao longo que assimilava a ideia de ver Bulan casada com outro homem.
- Parabéns – murmurou tarde demais quando Bela e Harta já se encontravam de pé a sair do café.
Quando a encontrou na rua, esperava que ela dissesse que o seu noivado era mentira. Mais uma vez tinha se iludido no amor. Veio à Indonésia por amor e como no seu primeiro amor, também Bulan o trocou por outro homem, antes de lhe dar uma hipótese.
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Investigação na Indonésia
Mystery / ThrillerBela, subdiretora da Global, é enviada para investigar os estranhos incêndios supostamente causados pela sua empresa na Indonésia. Durante a viagem, ela perde tudo inclusive a sua identidade o que a leva a refletir sobre a sua vida e o que é importa...