16. Outra Viagem

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Eles moravam longe de Jacarta. A carrinha estava sobrelotada, apesar de terem vendido muitos produtos. Os pais de Harta, o homem que a ajudara, só falavam bahasa indonésio. Por isso, Bela só conseguia falar com eles através de Harta.

As paisagens eram o que Bela imaginado de um país tropical, no entanto, as casas eram como barracas e via-se lixo por todo o lado. O calor colava-se ao corpo e os mosquitos aproveitavam para fazer o mesmo. O pai nunca falava, a mãe murmurava constantemente com o filho. Por vezes, olhava para ela e sorria. Havia algo de suspeito naquele sorriso. Ela usava roupa que tapava todo o corpo, Bela perguntou-se como ela conseguia aguentar sem pelo menos arregaçar as mangas naquele calor todo. Bem, devia ter as suas vantagens como não sentir as picadas dos mosquitos, ou pelo menos, não se viam as borbulhas enormes que eles causavam.

Passaram a noite na estrada. A carrinha da família era velha, tremia em convulsões conforme andava. Bela adormeceu com a barriga cheia de fruta (apenas daquela que conhecia e estava habituada) e de uma sopa aguada da qual não conseguiu definir os ingredientes. Sentia o seu corpo moído, o cansaço era devastador.

Aquela família tinha caído do céu para ela. Quase conseguia pensar que havia uma força sobrenatural a olhar por ela. Ela só esperava que o local para onde a levavam fosse bom para viver e que a respeitassem. Se não fosse pelas picadas dos mosquitos, ficava com dúvidas se não estaria a sonhar. Não podia pedir mais, mas gostava que fosse para perto do local das plantações para poder investigar os incêndios. Ela sentia que havia algo mais sério do que Dr. Gonçalo lhe dissera.

A verdade é que Bela nem tinha muita informação onde estavam acontecer os incêndios concretamente, não tinham informado nas notícias e o Dr. Gonçalo disse para pedir todas as informações a Richard. Tinha sido repentina a sua partida, teve de tratar de fechar a secção e de distribuir os funcionários pelas outras secções. O que não tinha sido nada fácil.

Bela recordou-se de uma empregada, Dona Felismina, que estava na empresa há vinte anos. Dona Felismina ao saber da notícia do encerramento da secção receou ser despedida, já tinha uma idade avançada e achava que os superiores iam pensar que era velha demais para começar de novo. Vinte anos sempre como subalterna sem vontade de subir de posição. Bela não conseguia entender. No entanto, não ficou indiferente ao medo e à felicidade de Dona Felismina ao saber que ia apenas mudar de secção.

Bela conseguia compreender o medo de Dona Felismina porque também ficou sem o cargo que lutou tanto para conseguir. O que ganhou em lutar pelo seu cargo? Não foi mais do que uma viagem da empresa que a deixou sem nada num país estranho. Podia processar a empresa se tivesse em Portugal e se tivesse dinheiro para isso. Agora, nem para comer ou ficar num bom hotel. Banhava-se em raiva tanto quanto gostaria de banhar-se num bom banho de imersão. A sua pele estava pegajosa e cheia de feridas de mosquitos. Já estavam há um dia na estrada, sem tomar um simples banho. As pessoas que viam na estrada e as casas e quintas pareciam cada vez mais pobres.

Bela achava tão estranho como aquela família tinha-a ajudado mesmo sem saber nada sobre ela.... Ela não dava nada a ninguém, principalmente comida e dinheiro. Achava os pedintes pessoas vergonhosas que não sabiam lutar por uma vida melhor. Ela também não tinha mãe, nem pai e também teve de começar a trabalhar cedo para conseguir estar bem na vida.

No entanto, esta família era mais pobre do que ela, vivia pior do que ela e, se calhar, até trabalhava mais do que ela alguma vez trabalhou, porém, deram-lhe fruta e trabalho sem a conhecerem... Os olhos arderam-lhe. A empresa iria pagar-lhe caro e quando lhe pagasse ela iria reaver tudo com juros àquela família.

A carrinha continuava o seu caminho, Bela continuava com os olhos fechados entre o sonho e a realidade. O seu pensamento continuava lúcido saltando de uma preocupação para outra.

Ao amanhecer já estavam completamente no campo e a paisagem era magnífica. Bela pensava que seria só palmeiras e árvores semelhantes, mas a vegetação era muito diferente e variada e o verde era tão vivo que se apoderava dela.

Bela ao observar de perto via que o óleo de palma, ou as palmeiras que o produziam, eram para a Indonésia como o eucalipto para Portugal, um mal que traz muito dinheiro. No fim de contas, o dinheiro ganha sempre. Afinal, ninguém consegue viver sem ele.

Investigação na IndonésiaOnde histórias criam vida. Descubra agora