23. O Fascínio de Harta

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Harta, quando já estavam na carrinha, explicou que na Indonésia falavam-se vários dialetos, havia muitas pessoas de diversas culturas, mas que todos aprendiam o bahasa indonésio, como língua oficial, que é uma mistura de outras línguas. Ele ainda sabia algumas palavras e expressões de outros dialetos falados na Indonésia como javanês.

O inglês dele era bom, até porque além de saber desde criança, ele tinha aprendido no ensino básico indonésio. Ele vangloriou-se por ser o melhor da turma. Ela lembrou-se que com o nono ano, ela mal conseguia gaguejar em inglês. Ele tinha um dom para línguas.

Ela pediu para ele lhe ensinar mais palavras em indonésio, no entanto, ela não tinha muita facilidade com línguas e ele estava sempre a corrigi-la. O que valia é que algumas palavras eram parecidas ao inglês e outras ao português. No entanto, ao ouvi-los falar, dificilmente conseguia decifrar até essas palavras.

No entanto, Harta encorajou-a a falar mesmo falando mal. Ele dizia que ela podia dizer as coisas mal, mas isso não fazia mal e se as pessoas percebessem outra palavra era só mais uma palavra que ela aprendia. Ele era muito mais calmo do que ela. Ela tinha pressa para ser independente. Queria ainda ganhar a corrida, ser a melhor, mas não conseguia e sabia demasiado pouco para ser a melhor logo do inicio. A sua irmã Linda dizia que a consistência fazia a lealdade, a prática, a confiança e por fim, a mestria. Talvez fosse isso que Harta quisesse dizer.

Durante um tempo, viajaram calados, agora com muito mais espaço, porque os legumes foram vendidos e outra parte dados à família que lhes dera abrigo.«Claro, nada sai de graça», pensou Bela.

A paisagem tropical era incrível a natureza parecia querer explodir ali. As árvores tropicais, os animais as flores, esforçavam-se por viver e sobreviver. Bela sentiu que estava noutro mundo. Um mundo em que desconhecia as regras e que tudo era tão diferente que o seu coração apertava-se um pouco mais. No entanto, já estava-se a acostumar com o calor e a humidade da Indonésia.

As casas tão pequenas e coladas umas às outras que iam até à beira da estrada, e os passeios estreitos que muitas vezes nem existiam... Tudo tão diferente, tão remendado pelos locais, tudo feito pelas próprias mãos e meios, tudo tão diferente de Lisboa e daquilo que conhecia.

Harta pediu para Bela ensinar-lhe uma palavra de português. Harta gostava muito de aprender línguas, pensava nisso como uma diversão e não como um tormento. Completamente o oposto de Bela. Ela ensinou o que significava «obrigada» e «bom dia» e ele deu-lhe um sorriso que Bela sentiu o coração a dar um pulo. Parecia uma criança a brincar com o seu brinquedo novo a dizer vezes sem conta as novas palavras. Bela disse-lhe mais algumas palavras como «saudade» e explicou-lhe que era uma palavra única que só existia em português e ele ficou ainda mais feliz. Repetiu todas as palavras até as memorizar, sorriu. Realmente a felicidade pode vir das mais simples coisas.

Será que haveriam portugueses ali? Bela desejou cruzar-se com eles. Sentir algo seguro naquele chão constantemente a fugir debaixo dos seus pés. Podiam ter meios de falar com Linda, como um computador ou Internet. Compreendiam a sua língua e de certeza que tinham contacto com Portugal. 

Harta deixou o fascínio da língua portuguesa e perguntou-lhe:

– Já alguma vez trabalhaste no campo?

– Não. Nunca.

 – Então, no que trabalhavas em Portugal? - o olhar de Harta fixou-se nela.

Ela pensou no que responder.

– Trabalhava... num escritório, mas agora... estou sem... estou desempregada – as palavras custaram a sair e mais uma vez ditas relembravam do nada, do vazio que ela tinha e do receio do seu futuro.

Harta sorriu. O seu peito encheu-se de esperança que Bela poderia ficar por muito tempo, talvez até para sempre com eles. Ele estava tão fascinado por Bela que não conseguia tirar os olhos dela, desejava perguntar tudo sobre ela, a sua vida e a sua forma de pensar. O dia parecia ter mais cor e o seu coração batia mais forte apenas por ela estar ali com eles. Ficaram durante um momento calados.

Então trocamos de línguas, tu ensinas-me português e eu ensino-te bahasa indonésio, não é? – ele quis confirmar para voltar ao assunto do seu interesse.

– Sim, claro e assim treinamos o nosso inglês também – Bela sorriu. Harta sentiu o coração a florescer como uma flor de lótus.

- Obrigada – disse em português com sotaque, mas perfeitamente dito.

Bela voltou a sorrir ao ver a felicidade dele. 

Investigação na IndonésiaOnde histórias criam vida. Descubra agora