Shape off you

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Mesmo depois de tudo o que aconteceu, não deixei de ser quem eu queria ser. E a verdade é que ninguém aguenta mais aquelas pessoas que só ficam lamentando o passado o tempo todo.

Os pais do Victor... bem, eles não me suportam. Não gostavam de mim nem antes do desastre, imagina depois. A mãe dele me odiava com todas as forças. Não era só que ela não gostava de mim, era o tipo de coisa que eu sentia no olhar dela. Como se eu fosse a representação de tudo o que ela mais temia. O fato de eu ser essa adolescente desgovernada, que dança em cima das mesas e grita no meio da rua só porque está feliz... isso a irritava de uma maneira que era palpável. Eu sei que parece babaca, mas... é uma parte de mim. E, honestamente, nunca me arrependi.

E o Victor... ah, o Victor nunca me julgou. Pelo contrário, ele sempre dizia que isso quebrava qualquer ideia de tristeza sobre mim, e eu gostava disso. Gostava de saber que, de alguma forma, ele via algo bom até na minha 'bagunça'. Era mais um dos milhares de motivos pelos quais eu nunca deixaria de ser amiga dele. A memória de como tudo aconteceu me fez balançar a cabeça, como se quisesse afastar o peso da situação.


Depois de um tempo, felizmente, ele saiu da casa dos pais. Ele foi morar em um apartamento só dele, e claro, me convidou para ficar com ele até o amigo dele de Londres voltar e o dividir o espaço. Eu aproveitei, porque, convenhamos, era a oportunidade de finalmente poder respirar sem precisar me preocupar com as contas. Além disso, era bom estar perto dele. Chega de sofá velho, pelo menos por um tempo. 


- Você está perfeita com essa roupa! --  Ele disse, o cabelo grande caindo sobre seus ombros, olhando-me com uma expressão divertida. Eu dei um sorriso torto e fiz uma pose, como se estivesse desfilando. 


- Basta eu estar com roupas bonitas, ter tomado um bom banho, e pronto, ninguém mais resiste a mim. -- A brincadeira saía naturalmente, e um brilho de confiança em meus olhos se tornava mais visível.

Ele riu e deu de ombros, como quem já esperava aquela resposta.


- Quer que eu te acompanhe até o bar? -- Ele perguntou, com uma ingenuidade que só ele tinha. - Está ficando tarde, e é perigoso.


Parei um segundo, sentindo o cuidado e a preocupação na voz dele. Tentei não parecer frágil.

-- Não precisa, obrigado. Eu sei me virar! -- falei com firmeza, querendo passar aquela sensação de que eu já tinha tudo sob controle, mesmo sabendo que no fundo eu podia estar mentindo para mim mesma.

Victor me olhou com uma expressão de quem não acreditava totalmente, mas aceitou. - Boa sorte então, e não volte para casa hoje, viu? -- Ele fez uma cara de quem sabia que, se eu fosse, voltaria tarde, mas ao mesmo tempo estava me dando liberdade.


Eu ri, meio desconcertada, e deixei escapar uma gargalhada gostosa. - Isso não é um encontro, Vitão! -- gritei para ele enquanto já me dirigia para a porta. E antes de fechar a porta atrás de mim, ainda ouvi ele soltar um "se cuida!" do outro lado.


Naquele momento, a sensação de liberdade foi intensa, mas algo me dizia que eu estava prestes a tomar decisões que iriam mudar tudo, que iriam deixar marcas que eu não poderia apagar. Mesmo assim, decidi seguir em frente, porque era isso que eu sabia fazer melhor: continuar.

Eu caminhava em direção ao bar, sentindo o frescor da noite invadir meus pulmões e me deixar um pouco mais leve. A cidade parecia viva, iluminada pelas luzes que se misturavam com o brilho da lua cheia e as estrelas no céu. O frio persistia, como se tentasse marcar presença, mas eu estava bem. Usava as roupas quentes que Victor me emprestara, e a grana extra também vinha dele, o que tornava tudo mais simples. Afinal, eu merecia, mesmo que por uma noite, me perder em algo que me fizesse sentir viva, ao lado de alguém.

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