Explicacão

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Não sou a melhor pessoa do mundo, mas pelo menos não finjo ser quem não sou.

Eu sabia que dormir na casa da ruiva fazia bem a mim. O calor do ambiente, o jeito dela, a energia diferente que ela trazia — era tudo tão intenso e ao mesmo tempo reconfortante. Por mais que as coisas entre nós ainda estivessem meio confusas, com aquele toque de incerteza, eu gostava de ver como ela reagia às minhas investidas, de como ela se desconcertava e, ao mesmo tempo, tentava manter o controle. Havia algo nela que me deixava instigada, quase como se eu estivesse sempre a ponto de descobrir mais, de entender o que realmente passava dentro dela. E isso me atraía.

Mas, como toda história, o dia seguinte chegou. Caroline foi trabalhar, como sempre fazia, e eu voltei para casa. Tinha a intenção de descansar a cabeça, desligar por um tempo. Dormir sem hora pra acordar e, claro, assistir aos filmes antigos que só eu gostava. Era o meu refúgio, meu modo de dar uma pausa à mente. Mas, ao chegar em casa, percebi que algo estava prestes a sair do controle, e que essa sensação de leveza que eu tanto precisava iria desaparecer em um piscar de olhos.

Eu deixei meu celular na mesa da sala, coisa que, agora, me parecia um erro fatal. As notificações começaram a chegar uma após a outra, antes mesmo que eu tivesse a chance de respirar ou me preparar para o que fosse, as mensagens começaram a invadir a tela.

 Victor, do jeito que só ele sabia fazer, entrou no quarto com um semblante de quem já sabia o que queria dizer — e estava determinado a me fazer ouvir.

— Quando você pretendia me contar? — ele perguntou, a voz alta, carregada de raiva. — Me diz, Dayane.

Aquelas palavras me cortaram como uma lâmina. Ele não tinha ideia do que estava por trás de tudo aquilo. Mas, ao mesmo tempo, não sabia nem por onde começar a explicar. Eu sentia uma angústia no peito, mas tentava manter a calma.

— O que eu posso fazer, Victor? — Me aproximei dele, ficando cara a cara. Meu tom de voz se elevou, sem que eu realmente quisesse. — Eu não posso fazer uma faculdade como você, não posso ter uma casa própria como você, e não posso levar a vida que você tem, entende?

Victor me olhou sem entender. Aquilo tudo estava sendo uma tempestade que não passava. Eu sabia que ele estava preocupado, mas ele não estava vendo o quadro completo, não estava entendendo minhas razões.

— Sabe por quê? — A pergunta saiu sem culpa. Eu estava cansada de fingir. — Porque eu não quero me tornar uma hipócrita. Eu não quero fingir que sou alguém que eu não sou.

A reação de Victor foi instantânea, uma explosão de palavras que soou como uma acusação direta a mim.

— Essa não é a sua vida, garota! — Ele passou a mão nos cabelos, tentando encontrar algum tipo de sentido no caos que estávamos vivendo. — Quantas vezes eu tenho que continuar repetindo isso? Enquanto aquela mulher te arrasta para um clube de apostas e lutas clandestinas, eu fico aqui esperando você voltar viva!

Aquelas palavras me atingiram como um soco no estômago, e, por um instante, eu senti como se estivesse sendo engolida pela raiva dele. Não conseguia pensar direito. O que ele dizia me incomodava, mas também me fazia sentir uma dor no peito, como se ele estivesse tocando em algo que eu já sabia, mas não queria admitir.

— Essa não é a sua vida, Dayane! E fazer isso só pra parar com essa dependência não muda nada! — Ele falou com uma ferocidade que me fez querer sumir, mas eu não podia. Eu não ia ceder.

— Claro que muda, Victor! — Eu levantei o dedo na direção dele, sem paciência. — Eu não suporto depender de ninguém. Não vou deixar de ganhar dinheiro, só porque você tem medo disso que eu ando fazendo.

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