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A música country ecoava pelos arredores da fazenda enquanto eu observava a dança ao redor da fogueira de São João. A cada acorde do violão, os sorrisos pareciam mais largos, as risadas mais intensas. A noite estava viva. Mesmo assim, eu me sentia estranha naquele ambiente. Algo no ar me puxava para dentro, como se uma parte de mim resistisse a aproveitar aquele momento.

Eu vestia uma camisa xadrez, uma calça jeans e botas que ainda não haviam se moldado ao meu pé. Na cabeça, um chapéu de cowboy que Olívia, minha irmã mais nova, tinha insistido em colocar ali. Ela era assim: teimosa, engraçada e, às vezes, irritante de tão persistente. Ainda assim, havia algo nela que me fazia querer proteger cada pedaço de sua essência.

A noite era calma, e o céu parecia ter espalhado as estrelas de propósito, como se quisesse iluminar cada canto daquela fazenda. Era estranho. Depois de tanto tempo me sentindo deslocada no mundo, finalmente percebi que tinha uma família de novo. Uma parte de mim que eu nem sabia que existia.

Olivia tinha só treze anos, mas era esperta de uma forma que me impressionava. Ela não era só uma garotinha curiosa; ela enxergava as pessoas de uma forma que muitos adultos nem sonhavam em fazer. Cada conversa com ela era uma mistura de inocência e sabedoria. Às vezes, eu me pegava sorrindo sozinha ao lembrar das coisas que ela dizia. Ela tinha um jeito de tocar em pontos que eu nem sabia que existiam dentro de mim.

Era engraçado como eu via tanto de mim nela. Os cabelos pretos e ondulados que pareciam desobedecer qualquer tentativa de domá-los, os olhos castanhos escuros e intensos, que carregavam uma profundidade que não combinava com a idade dela. E a esperteza... Ah, aquela esperteza era quase uma herança. Eu via minha própria luta pela sobrevivência no brilho dos olhos dela, mas também via algo mais: esperança.

Olivia tinha algo que eu perdi há muito tempo, e talvez fosse isso que me fazia querer protegê-la com tudo o que eu tinha. O universo, de um jeito estranho e inesperado, tinha me dado outra chance. Uma nova oportunidade de fazer parte de algo, de cuidar de alguém, de ser uma irmã de verdade.

Eu sei que a vida nem sempre é justa. Eu sei que o mundo pode ser cruel, e eu sei que Olivia vai descobrir isso cedo ou tarde. Mas enquanto eu estiver aqui, ela não vai precisar enfrentar isso sozinha. Eu protegeria aquela garota com tudo o que tenho, com cada fibra do meu ser. Ela merece viver a infância que eu não tive. Ela merece sonhar, se sentir segura, e acreditar que o mundo pode ser um lugar bom.

Por mais que eu tenha demorado a entender o que significava ter uma família, agora eu sabia. Não importava o que o futuro reservasse para nós. Eu estava ali para ela, e ela estava ali para mim. E essa certeza... essa certeza era tudo o que eu precisava para seguir em frente.

— Eu sei que você está achando tudo isso divertido! — Olívia diz me tirando do transe.

— Até que não é tão ruim assim. — sorri de volta para a garota. — Eu estou achando tudo uma graça.

— Você agora é uma fazendeira, precisa adotar alguns costumes. — A garotinha diz colocando um chapéu em minha cabeça com dificuldade. — Vem, vamos dançar. — Ela diz me puxando pela mão.

— Vem Day, é divertido. — A minha irmã me puxou e foi comigo para a roda de dança. — Você não é velha, para de sedentarismo. — Ela sorriu divertida.

— Eu sou sua irmã mais velha, não teste minha paciência. — Disse em um tom de brincadeira. — Uma gargalhada alta e animada tomou todo o ambiente decorado com a luz da lua, e o céu bem acima de nós se exibia salpicado de estrelas, nos presenteando com toda a magia do universo. Se pudéssemos contar as estrelas, possivelmente, ficaríamos a noite toda ali, infinitas noites encontrando novos pontos, tentando achar formas e somatórias para a busca eterna de um número inatingível.

Ironia do Destino Onde histórias criam vida. Descubra agora