Tudo por dinheiro

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O peso da maleta que carregava em minhas mãos trêmulas parecia se quadruplicar a cada novo passo apressado que dou em direção à saída do clube de apostas. A sensação de que eu poderia estar sendo seguida e de que havia ao menos uma dezena de armas apontadas para minhas costas me faz caminhar ainda mais depressa me obrigando a manter os meus olhos focados na porta em minha frente. Conforme vou me aproximando da saída, o ritmo de meus passos parece ir se tornando ainda mais frenético, e o som abafado de meus sapatos parecem ecoar em ressonância com as batidas aceleradas de meu coração.

Vamos lá Dayane, você já está com o dinheiro! E com a merda da encomenda! Vamos lá. Lauren disse que estaria esperando no carro! E é esse último pensamento que consegue me dar motivação o suficiente para cruzar o corredor infinito que me separa de meu meio de fuga.

Assim que coloco os pés para fora do clube, e sou atingida pela atmosfera extremamente fria da noite de Nova York, eu me permito respirar fundo e expirar todo o ar de uma única vez, sentindo uma pontinha de alívio brotar em meio à todo meu desespero. Mas é só isso, uma pontinha de alívio que logo é destruída pelo peso da realidade concreta. A rua está deserta. D-e-s-e-r-t-a.

Não há. O menor. Sinal de carro.

É isso, Lauren Jauregui me deixou pra morrer. Alguém vai dar falta da maleta, vai perceber que o sumiu, vai juntar dois mais dois e vai perceber que eu sou uma suicida, e estou morta. É claro, estou morta por que quem em sã consciência iria roubar o dono do maior clube de apostas do país, não é mesmo? Só eu, aparentemente. Eu giro em meu próprio eixo, fazendo uma inspeção completa, de trezentos e sessenta graus, por toda rua, e eu me sinto derrotada quando o pensamento de que tudo que eu queria na vida era que a morena dos olhos verdes estivesse aqui, esperando por mim, se alastra por minhas terminações nervosas.

Não posso acreditar que ela me largou assim, no meio de um verdadeiro campo minado. Porra, como é que ela pôde fazer isso? Eu estou aqui arriscando minha vida para recuperar a merda do dinheiro, e ainda conseguir uma anel de brinde, e ela simplesmente resolve me deixar para os leões e dar o fora? Assim? Sem dizer nada? Sem ao menos dizer "foi bom fazer negócios com você, parceira... hasta la vista, baby...", ou simplesmente qualquer cantada barata e decorada, que seja! A maleta em minha mão já se transformou em um verdadeiro bloco de concreto, e sinto meu corpo se curvando em razão do peso que carrego, e quero gritar. Quero muito gritar alto o bastante para que a filha da puta da mulher me escute de onde quer que ele esteja, e tenha certeza de que isso vai ter troco.

Eu continuo olhando para todos os lados, esperando que uma solução mágica apareça e resolva todos meus problemas, mas minha mente continua trabalhando rápido demais e impedindo que alguma ideia aproveitável se forme. Estou a um minuto de começar a considerar a possibilidade de ir para a minha casa e ficar com toda essa grana. Eu tenho certeza que isso acontece com as melhores pessoas, então também pode acontecer com as piores, como eu, certo? Mas não adianta. Eu vou morrer. Eu consigo sentir isso em cada partezinha de meu corpo, e talvez essa seja uma boa hora para começar a pedir perdão por todos meus pecados.

Eu sinto muito por ter roubado o dinheiro sujo ganho pelo dono do clube. Eu sinto muito por ter arranhado o carro de minha vizinha com a minha chave quando eu era menor. Eu juro que foi sem querer. Eu sinto muito por ter fingido que estava namorando para não precisar sair com o algumas garotas. Eu sinto muito por ter deixado minha dignidade para trás para cometer um crime, quando jurei que não cometeria mais crime nenhum. Também sinto muito por ter perdido a virgindade enquanto meus pais estavam no quarto ao lado. Aquilo foi realmente terrível, em todos os sentidos, e eu ainda me sinto meio culpada. Por favor, seja quem for que escute esse tipo de prece, saiba que eu sinto muito mesmo.

A lista de pecados continua se desenrolando com uma velocidade impressionante quando o som de um motor soando ao longe interrompe meu fluxo de pensamento. Ah, não acredito! quem chamou a porra da polícia, eles vão me prender! Por cometer um crime e por ser suspeita de outro! Puta merda, Respira. Respira! É óbvio que ninguém chamou a polícia, sua idiota. Como é que vão chamar a polícia para vir logo aqui, em um clube de apostas clandestino? Polícia, por favor. É óbvio que ele chamou seus comparsas! E isso é centenas de vezes pior! Eles vão me picar em mil pedaços, literalmente falando, e vão espalhar meus pedaços pela cidade! Eu não acredito que meu corpo vai ser espalhado por NY, e que todos os locais escolhidos para abandonarem meus pedaços de carne vão virar pontos de referência pra todos os criminosos da cidade, ah não. É isso que vou me tornar? Um lembrete de que roubar de caras poderosos e perigosos só pode acabar em morte? O motor está se aproximando, e foda-se, eu não vou rezar porque nesse momentos até mesmo meu anjo da guarda deve estar rindo da minha desgraça. Talvez sair correndo seja uma opção melhor.
Tenho certeza de que, cronologicamente falando, só se passaram alguns segundos desde que coloquei os pés para fora do clube, mas parece que estou parada aqui, no escuro e sozinha, há pelo menos um século. Será que a morte é assim? Tão demorada?

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