Meu novo lar

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"Pessoas que te fazem sorrir. Estas sim merecem ser amadas. Lembre-se disso."

Carol é a melhor xícara de café que eu já provei. Cada gole me deixa inebriada, e a sensação que me provoca desperta cada centímetro do meu ser. Sei que em algum momento tudo pode chegar ao caos ou até mesmo ao fim, mas sou tola o suficiente para acreditar que, em vez de acabar, nós possamos transbordar.

Passei minha adolescência inteira lendo e assistindo comédias românticas. Sou apegada ao clichê a ponto de acreditar que, no fim, tudo pode acabar bem. Porque, apesar de tudo, eu tenho essa chama que acredita ser capaz de acender outra em alguém. Afinal, eu sou uma dose de vida em meio ao caos, e, nesse mundo de dor e ódio, eu consigo encontrar paz nos olhos dela. E gosto de pensar que, com Carol, o tédio vai embora, como Ryuk fala para o Light em Death Note. É bom enquanto está durando.

Às vezes, eu penso na relatividade, tentando imaginar um jeito de voltar no tempo para encontrar Carol antes. Tento com todas as minhas forças fazer o tempo ser um círculo e não uma linha reta. Quero ter a chance de voltar ao início, se um dia eu precisar, igual na música do Coldplay. Tomara que algum deus me diga que o tempo é uma ilusão, que o fim talvez nem exista.

Hoje, coloco minha fé no Akai Ito, o fio vermelho invisível que liga duas almas. Tento acreditar que, não importa o que aconteça, ele nunca vai se romper e nós vamos estar ligadas para sempre. Mas, na verdade, com ou sem fio, tudo que Carol fez por mim já está marcado na minha alma. O fio vermelho é só um detalhe.

— Você sabe que eu acho isso uma loucura. — Sorrio ao ver Carol abrir a porta para mim. — Se o pessoal do seu trabalho descobre isso aqui, você está ferrada. — Brinco, levantando as mãos em rendição.

— Para de drama, Dayane. Eu tenho uma boa influência lá, ninguém interfere na minha vida pessoal. — Ela responde com firmeza, me dando passagem.

— Pronta para morar comigo? — Pergunto, sorrindo. — Já vou avisando: eu tenho medo de dormir sozinha. Provável que eu apareça na sua cama no meio da madrugada. — Dou meu melhor sorriso cafajeste.

— Palhaça! — Carol joga uma almofada em mim. — Coloca suas coisas no quarto novo e depois vem tomar um café comigo.

E eu sabia que estava ferrada!

— Ah, aceitei o convite do Victor. — Falo enquanto entro na sala em direção à cozinha. — Sobre a banda, a carreira musical, essa coisa toda. — Vejo o olhar surpreso dela.

— Quer dizer que vou morar com uma estrela do pop rock? — Ela brinca, divertida. — Sempre quis namorar uma rockstar. E olha que você combina bem com o papel.

— É só mais um dos meus charmes. — Dou risada. — Fica tranquila, se você tiver uma queda por mim, eu te seguro. — Pisco e vejo ela revirar os olhos.

Olhar para ela assim, pensar no que a gente poderia ser, me faz sorrir de um jeito que eu nem lembrava mais.

O cheiro do apartamento dela me lembra lar, abraço, livros novos, café fresco. E, sim, pode ser uma loucura largar tudo e ir morar com Carol, mas talvez eu seja louca e, sinceramente, não quero mudar de ideia. Carol percebe que estou observando cada detalhe e sorrindo.

— Tudo bem? — Ela pergunta, preocupada. — Sabe que pode falar comigo, né?

— Só estava pensando em como tudo isso é uma loucura. — Dou um sorriso.

— Loucura por quê? — Ela pergunta, curiosa.

— Tipo, eu estar morando com a detetive que cuidou de um caso em que eu era suspeita de assassinato. — Suspiro. — Soa meio estranho, não acha?

— Na verdade? — Ela responde. — A vida é cheia de escolhas estranhas. É o efeito borboleta.

— Efeito borboleta? — Pergunto, sem entender.

— Quando uma borboleta bate as asas, pode causar um furacão ou só uma brisa leve. Às vezes, isso se aplica à nossa vida também, às nossas escolhas.

— Eu já li algo parecido. A teoria do caos, sabe? — Começo a explicar. — Dizem que a vida é uma sequência de pequenas escolhas que nos transformam, nos levam aonde estamos agora e definem o futuro. — Fico frente a frente com ela. — E é curioso, porque, se um detalhe tivesse sido diferente na vida de um estranho, talvez eu tivesse nascido filha do Eike Batista ou de um morador de rua... ou até mesmo nem tivesse nascido.

— E você sente que tem controle sobre isso? — Ela me pergunta, tentando entender.

— Aí que tá! Saber que minhas atitudes afetam todo mundo me dá essa sensação de poder e angústia, como quem não quer ter tanto controle assim. — Sorrio. — Dá pra entender?

— Como se suas escolhas afetassem o caminho de outras pessoas?

— Exatamente. — Sorrio, pegando a xícara de café que ela serviu. — O mundo anda mais hostil e volátil; as pessoas amam e odeiam com uma intensidade assustadora. Vemos famílias desmoronando, pessoas bem-sucedidas se entregando às drogas... e, ao mesmo tempo, gente em situação de extrema pobreza sorrindo. — Suspiro, apreciando o café. — Acho que falta amor no mundo. Precisamos de paz para tomar nossas decisões sem que elas afetem negativamente os outros.

— Então é o efeito borboleta, mesmo. — Carol reflete. — A borboleta bate asas, e nunca sabemos como isso vai repercutir ao redor.

E eu me dou conta: estou vivendo a teoria do efeito borboleta. Eu sou a própria borboleta, e, uma hora ou outra, Carol vai ser afetada pelo bater das minhas asas.


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