"Pena termos nos encontrado só agora, já com o coração viciado em outros amores, com uma imagem meio falsa do que é felicidade."
POV CAROL
Ela tinha dito que me contaria a versão dela, mas logo ficou em silêncio. Eu a observava, e o tempo parecia esticar a cada segundo. Foram quarenta minutos longos, quase torturantes. A expressão dela era dura, introspectiva, como se estivesse enfrentando algo que nem sabia se queria compartilhar. Era evidente: ela não estava pronta. Não ainda.
Levantei-me em silêncio e fui até a cozinha. Fiz café, tentando acalmar a mente enquanto deixava o cheiro preencher o ambiente, talvez esperando que isso também a tirasse daquele transe. Coloquei o bule na mesinha de centro e me sentei ao lado dela, esperando alguma reação, algum sinal de que ela me enxergava ali. Mas ela parecia congelada, como uma estátua, com as pernas esticadas, a cabeça encostada no sofá, os olhos fixos em algum ponto distante. Dayane sabia que eu acabaria encontrando um jeito de me aproximar, de quebrar aquele silêncio, como tantas outras vezes.
Desta vez, fui além. Inclinei-me e toquei levemente seus cabelos, deixando meus dedos se entrelaçarem nas mechas escuras e macias. Ela tentou resistir, movendo-se de leve, mas eu conhecia aquela dança, sabia como dissolver a tensão do corpo dela. Aos poucos, senti que ela relaxava, ainda que tentasse manter o semblante fechado.
Finalmente, ela levantou o rosto e olhou para mim. Seus olhos escuros se fixaram nos meus, intensos. — Quero entender o seu lado, Day. — Minha voz saiu firme, mas havia um apelo ali. Eu queria que ela me deixasse entrar nesse mundo conturbado dela.
Ela suspirou, e uma expressão cansada tomou conta de seu rosto. — Eu não tenho envolvimento com aquele crime — começou a dizer, quase em um sussurro. — Mas, por alguma ironia, eu estava lá naquele dia. Parece que o destino quis brincar comigo.
Eu franzi o cenho, tentando entender. — Mas então... por que você estava lá?
Ela abaixou os olhos, mexendo nos próprios dedos, hesitante. — Eu estava me livrando das drogas que tinha. Joguei tudo no mar. — Fez uma pausa, como se tentando medir minha reação. — Naquele dia, prometi a mim mesma que nunca mais traficaria. Só queria me livrar daquela porcaria! — Ela olhou para mim, esperando, talvez, por algum julgamento. — Mas acabei ficando por lá... estava frio demais, e eu não tinha um lugar para ir.
A dor na voz dela me tocou de um jeito que eu não esperava. Eu queria confortá-la, mas também precisava ser honesta. — Day, eu entendo que você fez escolhas difíceis, que achou que precisava disso para sobreviver. — Segurei sua mão com firmeza. — Mas me diz... você espera que eu aceite isso se for continuar com esse tipo de vida? Porque você é tão mais do que isso. Você é Dayane Lima, uma artista incrível. Não precisa mais desse caminho tortuoso.
Ela mordeu o lábio, desviando o olhar. — Eu não trafico mais, eu juro — murmurou. — Mas naquela noite, fiz um acordo... uma promessa. Seria a última vez que cometeria um erro. E, em troca, me prometeram limpar meu nome.
Meu estômago revirou. — Que tipo de "erro" foi esse?
Ela balançou a cabeça com um sorriso amargo. — Roubei algo. Mas não matei ninguém, não machuquei ninguém, se é isso que você está pensando.
Respirei fundo, tentando manter a calma. — Dayane, o que você fez?
Ela me olhou com um sorriso atrevido. — Roubei um ladrão. Dizem que quem rouba ladrão tem cem anos de perdão, né? — Levantou a mão, exibindo um anel imponente. Eu não queria acreditar.
— Você... você roubou o maior mafioso de Nova York? — A indignação tomou conta de mim. — Dayane, como você conseguiu entrar lá? Aquilo é um clube de apostas, exclusivo para quem tem dinheiro ou... ou para quem é o próprio entretenimento.
Ela apertou minha mão. — Eu já te falei que lutava, né?
Assenti, lembrando das histórias que ela contava. — Você lutava, sim, mas eu não imaginei que...
— Eu era a aposta mais cara daquele lugar. E me arrependo disso a cada dia. — Seus olhos se encheram de tristeza, e ela se encolheu, como se se lembrasse das noites frias e das lutas dolorosas.
Suspirei e passei a mão pelo rosto, tentando conter as emoções que ameaçavam me dominar. — Day, você não precisa mais viver assim. Você precisa perdoar a si mesma, deixar essa vida para trás.
Ela se levantou, os ombros caídos, como se carregasse um peso insuportável. — Não é tão simples, Caroline. Eu estava envolvida até o pescoço. -- Roubei mais de um milhão e meio em espécie, se for pra piorar a situação! -- Ela afirmou usando o sarcasmo como defesa.
Meu coração apertou. Ela não queria ouvir sermão; queria alguém que a entendesse, que estivesse ao lado dela. E, no fundo, eu também preferia que ela me contasse tudo do que ter que saber por outra pessoa.
-- Eu vou ignorar essas ultimas falas, pro nosso bem, ok?
Ela olhou para mim, com um brilho de esperança no olhar, talvez pela primeira vez em toda a conversa. — Obrigada por ficar, Carol. Você podia ter saído correndo, mas ainda está aqui.
Eu sorri, tentando ignorar a confusão que sentia. — Quando eu te vi pela primeira vez, foi impossível não querer estar ao seu lado, Day. — Hesitei, sentindo o coração acelerar. — Mas se isso tiver futuro, se houver algo entre nós, preciso que você seja honesta. Preciso saber de tudo, inclusive de como Lauren Jauregui se encaixa nessa história.
Dayane suspirou pesadamente, fechando os olhos por um momento. — Vou te contar tudo, Carol. Tudo o que você quiser saber.
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Ironia do Destino
RomanceDepois de uma grande tragédia, talvez Day nunca mais seria a mesma...Ela havia mudado, todos sabiam desse fato, a garota simplesmente não podia fechar os olhos para os erros do passado, que estremeciam seu cotidiano. Depois de perder sua família, o...