Capítulo 56

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Jason estava sentado ao meu lado. Entrelaçando os dedos nos meus para me auxiliar a desenhar, mesmo eu sendo melhor que ele. Me ajudando a entender as contas infernais, que ele era claramente melhor que eu. O esforço dele fazia meu coração bater mais forte. Eu tentava veemente me concentrar nos livros, mas tudo que eu conseguia fazer era observar seu rosto duro pela concentração, a forma que ele esfregava o pescoço pelo esforço de ficar tempo de mais de cabeça baixa...

-Entendeu?- ele perguntou, a voz tão concentrada quanto nunca.

Eu olhei a infinidade de números que preenchiam o papel. A pergunta em sí tinha apenas alguns números, mas a resolução é o que eu considero meu inferno pessoal.

-Como é tão bom nisso?- eu perguntei, ciente de que não era o que ele queria ouvir.

-É o básico para quem estuda Administração- respondeu, colocando as mãos atrás da cabeça em um movimento cansado.

-Não me contou que estudava Administração.

-Você nunca perguntou- ele respondeu simplesmente.

 Ele sorriu de leve, um gesto para amenizar o soco no estômago que foi escutar aquilo.

Eu não tinha perguntado. Não tinha perguntado nada sobre ele. Eu nunca tinha percebido isso.. que eu não sabia nada sobre ele. Ele gostava de mim,eu acho, e ele falou sobre a mãe. Eram as únicas coisas que eu sabia. Eu estava tão imerso nos meus problemas, que nem notei que as pessoas a minha volta não são apenas personagens secundários na minha vida.

-Desculpe- eu disse, minha voz cheia de vergonha.

-Não se desculpe por isso- respondeu, voltando a montar outra conta.

Eu coloquei minha mão sobre a sua, o parando. Ele me olhou, espantando pela minha atitude repentina.

-Não só por isso... por tudo. Eu nunca perguntei nada sobre você.. 

-Não se sinta culpado.

-Não tem desculpa. Eu sou um péssimo.. - namorado, colega de quarto, amigo colorido.. -Calvin?

-Um péssimo Calvin?- ele perguntou, arqueando as sobrancelhas.

-É melhor do que as coisas que eu pensei.

-E no que pensou?- sorriu.

Eu o empurrei de leve.

-Não me distraia.

-Não estou te distraindo- revirou os olhos.

-Sim, você está. Me conte algo sobre você ou eu juro nunca mais te chupar..

-Golpe baixo- ele franziu os olhos.

Sorri para ele, o mais convincente que podia. Ele me encarou, sem sorrir. Como se avaliasse o inimigo, mas eu não o deixei ganhar.

-Tudo bem..- bufou -o que quer saber?

-Diga a primeira coisa que vem a sua mente- respondi, incapaz de formular um pergunta.

Tinham tantas coisas que eu queria saber. De onde ele conseguia o dinheiro, se ele tinha algum(e) ex. Sobre sua mãe..

-Meu filme favorito é Piratas do Caribe- ele soltou, como se aquilo fosse uma bobagem. 

Eu o encarei, indicando que ele devia continuar. Ele suspirou, estalando os pescoço, eu o adverti de que isso o poderia machucar. Ele disse um palavrão irritado em resposta.

-Minha cor favorita é..

-Preto- eu cortei, crente de que estava certo.

-..vermelho- ele corrigiu, arqueando as sobrancelhas.

Eu corei, envergonhado por ser tão enxerido.

-Bem como você cora. Essa é minha cor favorita- ele disse, sua voz enveludada como um ronronar.

-Não. Me. Distraia- eu sibilei quando ele tentou avançar em meu pescoço.

Foi preciso muita força de vontade.

-Minha comida favorita é chili..- continuou, despejando seu peso na cadeira de forma desanimada.

-Me conte.. algo real sobre você. Não que essas coisas não sejam importantes, é só que.. eu quero saber- minha voz se perdeu com o emaranhado de palavras.

Minha ansiedade só aumentava ao notar a intensidade de seu olhar. Fique com medo de ter dito algo errado, ou dele dizer que não somos namorados para cobrar tal coisa um do outro. Ele engoliu em seco, e por um segundo pensei que o tinha perdido.

-Minha mãe se suicidou quando eu tinha 14 anos.

Ele disse as palavras como se doessem. Como se cada frase fosse enrolada a arame farpado. Meu corpo congelou. Eu não podia olhar para ele. Para seus olhos.

Eu não esperava que ele me contasse isso. Pelo menos tão cedo. 

-Eu cheguei em casa depois de um dia de aula. Ela estava deitada na cama, e eu tentei acordá-la..- ele parou. Fechando com força os olhos -.. foi quando eu vi o vidro de veneno de rato no criado mudo.

Ele disse aquilo com tanta dor.. tanto pesar, que eu não pude evitar de ficar triste também. Como se aquilo estivesse acontecendo comigo. Eu não pude evitar em derramar algumas lágrimas teimosas. Ele estava olhava para um ponto qualquer. Seu olhar era tão vazio..

-Eu.. eu sinto muito- babulciei. 

-Não tem porque se desculpar- ele disse, tentando sorrir. A voz no entanto, ainda estava carregada de pesar.

-Não sei como isso deve ter sido para um adolescente. Eu.. eu sinto muito. Mesmo- as lágrimas quase me cegavam. Minha voz saia molhada.

-Podia ter sido evitado se tivéssemos prestado atenção. Eu achei que sua mudança de humor era algum tipo de menopausa precoce.. mas no fundo, eu sabia. Era algo tão simples. Mas eu não fiz nada- uma lágrima solitária caiu no tapete, deixando um ponta úmida no lugar.

Eu não conseguia ver seu rosto. De alguma forma, ele pareceu ter formado um muro em sua volta. Mas eu peguei sua mão mesmo assim. Mesmo estando tão machucado quanto ele.

-Não é sua culpa. Você não tinha como impedir isso, era apenas uma criança.

Ele tirou os olhos do ponto que olhava, direcionando-os para mim. Tão pesados e vazios. Eu conhecia aquele olhar, bem de mais para falar a verdade. Mesmo assim, eu nunca conseguiria descrever a sensação que ele passava. Nem se eu tentasse pelo resto da minha vida.

Eu o abracei. Tão forte quanto meu corpo magro podia. Abracei para ter certeza que ele estava seguro. Abrecei como se minha vida dependesse disso.

-Eu a amava tanto..- sussurrou.

-Ela te amava também- eu respondi, minha voz como uma súplica.

-Eu..- ele bulbuciou. A voz engasgada pela água salgada. Ele tentava com todo o coração dizer algo, mas tudo que podia fazer era repetir as mesmas palavras.

Eu sabia o que ele queria dizer. Eu conhecia a sensação também. Como se os pulmões não respondessem. Que não fizessem além de se afogarem em lágrimas. 

-Ela amava você- eu sussurrei. Uma e outra vez. -É só que as vezes... a vida cobra mais do que podemos aguentar.

E ficamos ali. Nos abraçando. Como se o tempo tivesse parado.

-Por favor.. nunca. Por motivo algum, faça isso. Mesmo que não estejamos mais juntos. Não faça isso comigo- ele implorou.

-Eu prometo.




Colega de quarto (para revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora