Capítulo 69

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~Jason

No começo, a sensação era de ser esfaqueado diversas vezes. Algo como uma queimação.. uma dor dilacerante que pensei durar para sempre.

De repente, aquela pareceu ser a única sensação que eu senti por toda a minha vida. Como se todas as vezes que eu olhasse em seus olhos eu tivesse sentido aquele buraco no peito.  Deus, aquilo me assustava... a forma que eu o enxergava agora. Parecia que todos os nossos momentos, todos os nossos beijos, todas as vezes que dissemos: "eu te amo" um para o outro tivesse sido anulados.

Vergonha, vazio... traição.

Eu mal podia olhar em seus olhos. Eles estavam tão nebulosos e confusos, que uma parte minha ansiava por abraçá-lo, e isso era tudo que eu não queria agora.

-Jason...

-Eu não posso fazer isso agora- eu cortei.

E era verdade. Eu não podia enfrentar isso agora. Era demais, sentimentos demais, pensamentos demais. Se eu ficasse aqui provavelmente alguém acabaria com um olho roxo ou pior.

Eu tinha que dar o fora.

-Onde você vai?- Ele gritou, tentando me acompanhar com suas pernas pequenas.

Eu nem mesmo tinha me dado conta de que estava me afastando até escutar o som de sua voz. Eu parei, apenas para dar o tempo necessário para me alcançar.

O ar frio da noite se condensava a minha frente, e tudo pareceu mais escuro quando estávamos cara a cara. Nossas respirações se misturando e nossos olhos colados com um misto de emoções que eu nunca conseguiria descrever corretamente.

-Por favor...

-Por que fez aquilo?- foi a primeira coisa que eu disse, a voz mais alterada do que eu gostaria de transparecer. Eu percebi isso ao vê-lo estremecer.

Mas ele não disse nada. Apenas continuou encarando o chão enquanto cutucava freneticamente as próprias unhas.

-POR QUÊ?!

-Eu não pensei. Essa é a resposta. Não é a melhor, mas é a única que eu tenho, tá legal?- ele gritou, ofegante como se aquilo requeresse muito esforço.

Eu tive que fechar os olhos; ardia olhar para qualquer coisa agora. Mas eles rapidamente abriram quando senti a palma fria de sua mão sobre minha pele.

Apenas um toque; mesmo assim conseguiu fazer com que meu corpo recebesse ondas de eletricidade.

-Eu juro para você que não queria te magoar. Eu.. eu nunca poderia fazer isso com você.. você é..

-Mas você já fez.

Ele congelou. Os olhos cálidos em busca dos meus, seus dedos afundando em meu braço como se aquilo fosse a única coisa que o mantivesse em pé. A única coisa que ele pode fazer foi soltar um suspiro por seus lábios entreabertos enquanto lágrimas expeças rolavam de seus olhos, tão pesadas que inundavam sua bochecha e sua blusa. Meus próprios olhos ardiam pelas lágrimas teimosas, impedidas de cair apenas por minha força de vontade e meu orgulho.

-Tucker, por favor, me deixe explicar.

Eu retirei sua mão de meu braço de maneira brusca, não me preocupando mais em parecer rude demais. Eu não conseguia mais ouvir aquilo.. o nome que ele me chamou.

-Não me chame assim- eu sibilei, uma parte minha se arrependendo ao ver a expressão de dor em seus olhos.

Bom. Eu queria que ele sofresse. Queria que doesse tanto quanto dói pra mim.

-Onde você vai?- ele perguntou outra vez quando retomei a caminhada às cegas pela rua desconhecida.

-Vou embora- eu respondi, sem me virar.

-Você não conhece a cidade!

-Eu não preciso conhecer muito para achar o que eu quero no momento.

Silêncio.

Eu esperava que ele continuasse a me seguir, a gritar.. qualquer coisa. Mas ele não fez nada.

Então eu continuei andando, ou melhor, cambaleando pelas ruas. Procurando qualquer coisa que tivesse um letreiro ou uma placa.

A cidade estava deserta, iluminada apenas pelas luzes de natal incessantes e alguns postes espalhados, e eu realmente temi por um momento o que eu faria se não achasse algo aberto. Eu não tinha para onde ir, e mesmo se encontrasse um hotel, não estava com dinheiro o suficiente comigo para pagar por um quarto.

Então eu continuei andando, tentando ignorar o frio cortante que agora tinha adormecido meu nariz e dedos e os avisos internos de que eu deveria voltar para casa de Calvin apenas para socar o fodido do Sean, ou beijar o idiota do meu...

Acho que namorado não é mais a palavra certa.

Algo vermelho e brilhante chamou minha atenção pelo canto de olho, então diminui a caminhada para checar o que era.

Aparentemente, um bar. O letreiro tinha a luz vermelha que me chamou a atenção, e eu pude ver pelo vidro embaçado que tinha algumas pessoas reunidas em um balcão. Serviria.

O calor do lado de dentro me recebeu como um agasalho quando entrei. As pessoas nem se incomodaram de virar para ver quem havia entrado, eu não esperava menos. Afinal, quem vinha a um bar para se embebedar no Natal sem um bom motivo?

Meus olhos deslizaram pelas bebidas atrás do balcão. Com certeza não eram as melhores, mas eu não estava dando a mínima para o gosto de qualquer forma. Tudo que importava era a sensação que aquilo traria.

-O que vai ser?- o barman de aparência parruda e uma carranca perguntou.

-Três shots de Tequila.

As bebidas foram derramadas nos pequenos copos com rapidez, o homem não dando a mínima ao ver bebida derramada no balcão no processo. Os shots foram entregues a mim junto a sal e limão, e ele arqueou as sobrancelhas grossas quando neguei o acompanhamento.

Eu virei os três shots sem pensas, ignorando o gosto forte e a queimação na garganta me lembrando o tempo que fiquei sem beber.

Uma risada ressoou ao meu lado, tomando minha atenção enquanto eu pedia outra rodada com o barman. Descobri que ele se chamava "Cookie".

Era uma garota. Cabelo longo e castanho, com olhos expressivos e felinos de mesma cor. Um sorriso de dentes perfeitos ocupava seus lábios rosados, mas apesar da aparência delicada, ela usava um cropped simples e calça de moletom. Fora que o copo que ela segurava estava ocupado por cerveja.

-Você vai engasgar se beber outra rodada- ela cantarolou, bebendo um gole de sua cerveja em seguida.

Arqueei as sobrancelhas e coloquei o que deveria parecer indiferença no rosto.

-E por que você se importa?

-Não me importo, eu só gostaria de saber seu nome antes de ter que.. você sabe, ligar para a ambulância- irônica. Ótimo.

Cookie colocou outra rodada no balcão, e dessa vez eu fiz questão de beber olhando em seus olhos, sabendo que minha cara de indiferença ao virar o líquido estava convincente o bastante ao ver o desdém em seu olhar.

-Meu nome é Jason.

Colega de quarto (para revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora