Capítulo 68

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Jalou e Susan entreolharam-se quando foram ignoradas por Salamandra. E viram quando ela desapareceu de suas vistas acompanhada de perto por Murilo.
Ambas usavam o mesmo perfume e agora também odiavam a mesma mulher; ela possuía seus homens. Não importava os pormenores do amor que sentiam, se realista ou romântico. O amor era capaz de transformar a alma, ao mesmo tempo que reunia os amantes no delírio do corpo.
Para Jalou este sentimento inesperado a lançara na mais contraditória das realidades, desde as noções de aconchego, doçura e intimidade dos corpos e das almas, até as da violência, da agonia e do grito. E apesar de tentar, era incapaz de definir como se sentia em relação a Murilo. Sua razão, tão obstinadamente construída, se tornara confusa, agora ela era uma estranha obsessão que ultrapassava o alcance da lógica. Não havia explicação para aquela obsessão. Não tinha muitas escolhas: seguiria enganada ou enganando seu ser, ficava com essa dor ou essa dor teria que morrer.
Susan lembrava de Miloch, e que acabara por sucumbir ao que ele despertara nela, uma irresistível atração. E se entregou ao delírio do corpo e suas limitações de caráter moral e pessimista foram esquecidas. Então teve toda a experiencia sensual que sempre imaginara! Ele acendera o braseiro, e agora já não podia viver sem sentir a pele queimar e o espirito arder. E esse jogo de emoções, que vai do amor de um corpo ao amor de uma pessoa, pareceu-lhe belo o bastante para consagrar-lhe toda sua vida. Miloch a iniciara nos ritos do amor, e já não sentia vergonha ou terror de desejar o delírio que a arrastara para um universo tão diferente da beleza das composições de Beethoven. Estava cravado no seu corpo como um crucificado à sua cruz os segredos despertados naquela madrugada. Ele a iniciara no rito onde o secreto e o sagrado se tocavam, e por isso se apaixonara perdidamente!
- Não sei você, mais eu vou atrás deles. - disse Jalou, consumida pelo ciúmes.
- Eu vou com você!
As duas mulheres partiram resolutas, como guerreiras medievais, para defenderem os homens que julgavam amar.
Theo viu Salamandra e Murilo sumirem e em seguida Jalou e Susan deixarem o salão atrás deles. Pressentindo o desastre, virou-se para Margot, dizendo:
- Veni, Margot, mi amice non opus est salvificem!
Margot não entendeu o que ele disse, mas captou a urgência no tom de sua voz e seguiu seu bom velhinho.
Esgueirando-se pelos corredores, Adriano seguia expectante, com os sentidos alertas, com medo de ouvir um gemido ou baques surdos. E como um gatuno, ia chamando, na esperança de por um fim naquela tortura:
- Alguém aí?
Nessas horas de nada adiantava lembrar-se das advertência e conselhos de Salamandra a cerca das preocupações. Como entregar à Deus o sumiço dela? Como manter a mente tranquila quando seu futuro estava em jogo? Sua cabeça jamais estivera vazia, e não seria neste estágio de sua existência que haveria de estar!
Pareceu-lhe ouvir ela dizendo que as preocupações afastavam as boas inspirações e as intuições que Deus enviava através dos guardiões, porquê Ele jamais se comunicava diretamente com os homens. Mas agora sentia-O conduzindo seus passos...
Ruy e Miloch também percorriam a mansão, mas com uma diferença, Miloch conhecia a casa como a palma de sua mão e ia de quarto em quarto, abrindo suas portas.
Theo e Margot foram os primeiros a desembocarem na biblioteca, depois surgiram Jalou e Susan, seguidas de Miloch.
Então Adriano entrou no recinto, e para fugir do constragimento, disse:
- Estava procurando um banheiro...
E aquela estranha conjunção de motivos completou-se quando Ruy chegou e passou a fazer parte daquela reunião privada de pessoas estranhas.

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