Confiança

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Acordei com o despertador, e a vovó não estava na cama.

Procurei por ela na ponta dos pés e a vi meditando no quintal dos fundos. Eu acho que estava meditando, porque também parecia uma espécie de dança, mas o importante é que estava grunhindo de olhos fechados.

Me arrumei o mais rápido e silenciosamente possível e sempre olhando por trás do meu ombro.

Peguei os meus sapatos nas mãos e ia esperar o Hart lá fora, mas justo quando eu estava na frente da porta, escutei a buzina.

- Juniper?

Droga.

Abri a porta e comecei a acelerar o passo, fingindo que não tinha ouvido ela. Cruzei o jardim o mais rápido que pude:

- Abre a porta.- Falei pro Hart na metade do caminho.

- O quê?- Ele não estava entendendo a gravidade da situação.

- Juniper?

- Abre a porta do carro!- Falei mais alto.

Ele abriu, mas ainda estava confuso.

Joguei a mochila pra dentro do carro e me enfiei logo em seguida.

- Juniper!

- Vai, vai, vai! Acelera!- Eu pedi desesperada.

O pneu do carro cantou. E eu vi a vovó saindo pela porta arrumando um quimono.

- Não queria te atrapalhar! Tô atrasada! Te vejo mais tarde!- Eu gritei pela janela do carro enquanto ela se distanciava.

Eu soltei um grito de alívio enquanto afundava no banco e calçava os meus sapatos.

- O que foi que aconteceu aqui?!- Ele perguntou nervoso, claro, ainda estava confuso.

- A minha avó veio visitar a gente.- Eu murmurei.- E sabe se lá quando ela vai embora.- Eu esfreguei os olhos por debaixo dos óculos.

- Sei...- Ele entendeu, mas ainda não sabia de nada-...e qual é a dela? Não pode ser tão ruim assim.

Agarrei os cabelos só de pensar nas coisas que ela já tinha feito e dito ao longo desses anos, mas preferi argumentar com fatos:

- Nos anos 2000, o meu avó, marido dela, fez a primeira viagem de avião, e a minha avó não viaja de avião, então foi a primeira vez em que ele viajou sozinho depois que se casaram...

- E daí.?

- Ele fugiu com uma comissária de bordo e nunca mais voltou.- Completei.

- Ca-ramba.

- Pois é, e ninguém nunca julgou ele por isso.

Foi aí que eu me toquei, que se a vovó ia ficar em cima da gente, talvez não conseguíssemos fazer a visitar o papai essa semana.

- Tomara que ela vá antes de terça-feira.- Eu pensei alto.

O carro ficou silencioso de repente.

- Posso te fazer uma pergunta?- Ele atrapalhou meus pensamentos.

Preferiria que não.

- Pergunte.

- Onde você vai nas terças-feiras?- Ele perguntou.- Terça sim, terça não, você cancela comigo, o que por mim, tanto faz, mas você nunca diz o que vai fazer.

Ele sempre foi tão perceptivo?

Minha mãe e eu visitávamos o meu pai sempre que a minha mãe conseguia se organizar pra isso, e normalmente dava certo nas terças, então...

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