Me tira daqui

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O final de semana acabou, e eu já tinha conseguido adotar uma postura mais neutra sobre tudo que estava acontecendo comigo.

- Você vai tentar de novo na próxima estação?- Reggie perguntou, se referindo a Harvard.

Estávamos a caminho do teatro da escola, porque íamos assistir uma palestra sobre alguma coisa que eu não havia prestado atenção quando nos chamaram.

- Pra quê? A cada segundo que passa, as escolas particulares estão cuspindo mais e mais prodígios com currículos incríveis, e eles não precisam do auxílio financeiro.- Me justifiquei.

- E qual é o seu plano agora?- Ela disse procurando lugares pra gente mais no fundo.

- Vou trabalhar no restaurante quando as aulas acabarem e daí vou me inscrever pra NYU ou a Emory, e se der tudo certo, eu posso dar o meu sangue, suor e lágrimas até conseguir transferência.- Disse me sentando do lado dela, não estava cheio então tínhamos espaço pra falar sem que nos ouvissem.

- June, você nem recebeu a resposta da Columbia, nem da Pensilvânia, não seja pessimista.

- Ser otimista demais tem sido o meu problema ultimamente.- Murmurei jogando o meu cabelo pra trás.

Apagaram as luzes e o diretor Dumbrowski entrou ao mesmo tempo que o telão desceu. Era uma apresentação de slides, muito chata sobre exclusão social.

O que esses caras não sabem, é que desde a início do século, os nerds escolheram o isolamento por conta própria, nós fundamos a nossa própria sociedade e hierarquia. Não somos tímidos, somos antissociais, não temos medo de falar com os populares, nós só não queremos.

Senti alguém cutucar meu ombro e me virei, era o Hart, uma fileira atrás:

- Eaí?- Ele sussurrou.

- O que foi?- Perguntei, já que ele não falava comigo na escola, se não fosse pra pedir ou mostrar alguma coisa.

Ele passou por cima da cadeira e se sentou do meu lado, estava escuro, todo mundo estava distraído em seu próprio círculo, fugindo da palestra, então muito provavelmente ninguém viu e muito provavelmente ninguém achou estranho.

- Aqui.- Ele tirou uma folha de papel de dentro do casaco.

Torci pra não ser mais um panfleto de "sei lá o quê". Mas era uma prova, era de matemática, era um "A". Um "A"?!

- É um "A".- Eu afirmei cobrindo minha boca com a prova pra que ele não me visse empolgada, ele só afirmou com a cabeça.- Me responde uma coisa...o Lysel tá puto?

- Ele tá muito puto, June.- Ele disse sem esconder que estava feliz.

- E parece que alguém vai passar de ano sem nem sentir o cheiro da recuperação. - Eu me gabei.

Ultimamente, o progresso dele, era a única coisa com qual eu podia me gabar. O meu mundo tava de cabeça pra baixo, era mais fácil imaginar o Hart na faculdade do que eu mesma.

- Oi...- Ele sorriu e cumprimentou atrás de mim.

Virei de lado e tive uma visão assustadora da Reggie com os olhos espantados e cumprimentando ele com um aceno de cabeça, em seguida se virou.

- Ela não gosta muito de mim, não é?- Hart cochichou.

- Eu disse que ela não precisava.- Cochichei de volta.

São nesses momentos de descontração que o Universo, gosta de nos dar uma rasteira e nos fazer cair de cara na lama.

- E se considerarmos o número de alunos que...- O diretor ia continuar a apresentação, mas de repente, os slides apagaram- ...ah, droga.

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