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Pedaço;

Me encostei no passo prato olhando meu tio logo ali na frente, sentado na poltrona preta de couro. Ele tá nervoso, pô, e pelo pouco que vi ele também tá puto pra caralho.. há quem diz que meu tio quando tá bravo mermo, nem cinco homens seguram ele. Acho que vou descobrir se isso é verdade, pô.

Pedaço: Coé? Tu vai ficar aí me encarando com esse olhar quase mortal e pronto? Vim aqui pra trocar uma ideia contigo, um papo maneiro de homem pra homem. - Ouvi a risada bolada dele e respirei fundo. - Pode ficar puto aí, pô, tem problema nenhum mas se eu sair, não volto. Tô aqui pra te falar tudo o que rolou e como essa parada aconteceu, te explicar tudo e depois se tu quiser, conversa com ela e tira a história a limpo.

Tião: Explicar, era isso que tu já devia ter feito a hora que pisou aqui. - Entrelaçou as mãos uma na outra, apoiando o queixo em cima e me encarando de lá. - Vamo caralho, tu tá esperando o que? A porra de um apito pra início de jogo?!

Pedaço: Tenho um respeito do caralho contigo, mas se tu vier gritando comigo.. a parada vai ficar diferente. - Apontei com o dedo e ele levantou do sofá, ficando parado ali no meio da sala. - Eu tô aqui pra contar e tu pra ouvir, simples e fácil, não tá difícil pra ninguém entender.

Acompanhei com o olhar ele levantando a camisa e pegando a arma na cintura, sem tirar o olho de mim e eu só observando. Ele balançou a arma e colocou na poltrona, ajeitando com a outra mão a camisa e sorriu de lado, colocando as duas mãos no bolso. Soltei o ar mais aliviado e ele deu alguns passos até a estante de parede.

Tião: Pra mim tá difícil de entender, Pedaço, tá mermo! Eu achei estranho pra caralho essa aproximação repentina de vocês dois, mas achei que finalmente aquela porra ruim entre vocês fosse acabar. E pelo jeito acabou facinho, né não? - Riu de costas pra mim e se virou me olhando. - Só que o problema aqui, é que eu conheço a filha que eu criei.. a Carmem é muito bobinha, às vezes ela não enxerga as paradas como são, tá ligado? Não é atoa que o Brown manipulou ela todo esse tempo.

Pedaço: Eu não sou o Brown, porra. Nem termina o que tu quer falar que eu já entendi, tu tá errado pra caralho! - Falei começando a ficar puto, porra, vai querer me comparar com esse filho da puta? Não fode.

Tião: Cala a porra da boca, que quem tá falando sou eu. - Balançou a mão na minha direção. - Tu não é o Brown mas eu te conheço, caralho. Ou tu esqueceu que eu te criei junto com teu pai? Que eu acompanhei tua vida inteira de pertinho, vi tu entrar e crescer dentro do crime.. eu te conheço bem pra caralho. - Começou a andar e apontou com o dedo pra um quadro, uma foto com nós quatro. - Te coloquei dentro da minha casa, te dei o que eu pude pra ver tu crescendo com uma vida boa, sempre estive alí, Pedaço. Porque tu é sangue do meu sangue, tu é família..

Engoli em seco, encarando o quadro e respirei fundo desviando o olhar. Meu tio se afastou do quadro e veio andando devagar na minha direção.

Pedaço: Se tu me conhece, sabe que essa parada não vai ser um problema. Tô muito longe de ser o Brown, nunca pô, nunca, eu vou encostar ou olhar pra ela na maldade. Quero ela bem tanto quanto tu quer. - Ele se aproximou e parou a uns três passos de distância de mim, sustentando meu olhar.

Tião: Tu não vai olhar pra ela na maldade? - Ouvi o tom de ironia nas palavras dele, o olhar dele mudando para pura raiva quando ele balançou a cabeça. - Fala pra mim, pô, isso aí foi do nada? Tu olhou pra ela naquele churrasco e decidiu que tu queria coisa a mais? Não, eu sei que não. E é aí que tu vira a porra de um filho da puta de merda. - Deu dois passos e nós ficamos cara a cara, olho no olho mermo. - Tu é dez anos, porra, dez ano mais velho que a Carmem!

Ele gritou a última parte na minha cara, me segurei pra caralho pra não meter a porra de um soco na boca dele. O rosto do meu tio, começou a ficar vermelho e agora sim, eu tô vendo que ele não tá puto, nem bolado e nem com raiva. Ele tá mermo é com ódio.

Pedaço: Nunca tentei nada com ela antes daquele dia, não fode. Eu tenho noção do que é certo ou errado, do que tá ao meu alcance e o que não tá, e ela não tava. - Desencosto da parede e  balanço a cabeça negando. - Não vem com esse papo, já falei que tu tá errado.

Tião: Errado? Fala pra mim então, quando foi que tu olhou pra ela na maldade pela primeira vez?! E não fala que não olhou, porque tu olhou! Seu pau no cu.. - Me xingou e eu ri estressado. - E se tu vir com papo de que gosta dela de verdade, eu vou te quebrar! Porque você é a porra de um mentiroso, tu só fala e fala, eu te conheço e sei do que eu tô falando.. tu manipula pra conseguir o que quer e nem tenta negar, já vi tu fazendo isso várias vezes mas a Carmem, pô, ela não.. tu tá cometendo o maior erro da tua vida e no final eu mermo vou te matar por causa disso. - Avisou ofegante e passou a mão na cabeça tatuada, nervoso. - Ela é minha filha, meu maior tesouro e o que eu prometi pro Brown, eu vou prometer pra tu.. O dia que tu pisar na bola, eu vou te receber na paulada e te matar lentamente, tu vai desejar ter morrido nas mãos de qualquer um ou até ter feito um pacto com o Capeta.. Então agora, tu vai falar olhando no meu olho a verdade, qual foi a primeira vez que tu olhou na maldade pra ela?!

Deu um passo para trás se afastando. Encarei ele, pensando na primeira vez que eu olhei na Carmem e senti a atração, mas foi mais que isso, foi tesão. E é uma parada complicada pra caralho, porque tem alguns anos e ela era uma adolescente.. nova pra caralho mas eu não conseguia me segurar. Lembro como se fosse hoje, porque foi aí que eu soube que um dia alguma parada ia rolar..

Pedaço: A Carmem, sempre foi bonita. Tu sabe muito disso, geral sempre comentou e cobiçou ela. - Engoli minha saliva e molhei a boca com a língua, puta que pariu.. meu tio me olhou esperando. - Foi em um churrasco, era a comemoração de alguma parada relacionada ao Flamengo.. ela tava lá e passou na minha frente de vestido, eu olhei e gostei do que vi. Ela tinha acabado de fazer quatorze anos..

Ele passou a mão na barba e abaixou a cabeça rindo. Porra, a Carmem só tinha quatorze anos quando eu senti a porra do tesão por ela.. caralho!

Tião: Tu é um pau no cu! Te coloquei dentro da minha casa, caralho, e tu ficou com tesão na minha filha que era uma criança.. porra! Tu acha isso normal mermo? - Perguntou falando alto e com raiva. - Isso é doentio, pô, doentio.. uma criança, ela era uma criança! Tua prima ainda, sangue do teu sangue..

Pedaço: O que um quer, dois não fazem. - Falei mais alto e ele ficou quieto, me olhando no olho. - Ela quis e eu quis mais ainda, aconteceu e nós tá junto. Eu larguei a Giane por ela, tô fazendo tudo por ela e cuidando dela, a nossa parada tá mais além do que tu pode entender.. tu pode ter feito tudo por mim e mais ainda por ela, mas tu não é ninguém pra interferir no que a gente tem.

Tião: Ela tá frágil, tá desestabilizada e longe de estar pronta pra viver uma parada desse nível! - Gritou e eu neguei. - Não vai me surpreender se tu tiver manipulado ela. Porra..

Pedaço: Não. - Cortei a fala dele começando a me estressar mais com esse papo.. - Ela tem escolha e escolheu ficar comigo, pô. Nunca precisei manipular ela ou sequer tentar, essa imagem de bobinha que tu tem dela, tá errada pra caralho. - Sorri de lado e suspirei. - A Estrelinha é muito mais do que tu pensa. E tem outra parada que tu devia saber desde já, ela tá com medo de te contar mas ela tá grávida. Nós dois vamos ter um filho muito em breve.. quando tu quiser ir falar com ela, pode ir, ela tá comigo lá em casa, por enquanto.

Tião: O que tu falou? - Arregalou os olhos e me olhou com mais atenção. - Tu tá me dizendo que engravidou a minha filha? É isso mermo? - Passou as mãos no rosto e na cabeça. - Pedaço, caralho, eu vou matar!

Acho que nem ele acredita no que fala. Papo dez.

Fiéis Amantes - [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora