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Carl

  Eu não sabia ao certo se o que eu fiz era o certo, mas estava à frente do espelho pela milésima vez, com uma lâmina as mãos, encarava meu reflexo apenas iluminado pela luz da lua, de um lado a lâmina do outro o telemóvel, na frente da tela minha mãe, queria me despedir, mas sei que se eu ouvir sua voz animada por receber uma ligação minha, irei desistir como fiz nas outras vezes. Tomo uma respiração forte e a solto logo em seguida com calma.
Posiciono a lâmina em meu pulso e coloco pressão, uma lágrima caiu, quero acabar com tudo isso falta um mês, um mês para voltar a minha rotina diária e, confesso que não estou preparado para olhar os cantos da escola e ter cada foto em um mural de cada um, principalmente de Loren, as lembranças daquele maldito dia voltaria e é com essas sombras do passado que quero ir embora. Não quero ter que ouvir falsos "sinto muito" ninguém sente nada. Mal a conheciam e mal me conhecem.
  — Carl? — retiro a lâmina do meu pulso e olho a pequena sombra que tem de baixo da porta. Oh! Angel, Angel, Angel! — está acordado? — limpo minhas lágrimas e guardo novamente a lâmina dentro do livro que leio, pego meu celular deixando encima da cama e levanto do chão. Recomponho-me e visualizo o ecrã do telemóvel vendo que são duas da manhã então, abro a porta — te acordei? — não respondo a menina que suspira — eu não consigo dormir — disse sem me olhar — estou com... Medo — sua voz sai fraca e falhada, sem pensar dou espaço para que entre, a mesma olha para o espaço pouco iluminado e logo em seguida para mim.
  — Entra.

Angel

  De noite eu observo Carl a dormir, parece um anjo definitivamente, não parecia aquele Carl perturbado que te passa uma visão de perigo, aquele que você olha e não quer chegar perto. Eu o observo, o olho e dessa vez sem preocupações ou medos. Dorme um pouco distante de mim, mas me sinto segura, pequenos roncos saem da sua boca e sua expressão é de paz, reparo pequenas coisas que o formam. Sinto sede e levanto arrumando meu pijama sobre meu corpo saio do quarto do moreno e desço as escadas em busca da cozinha. À noite está linda, as estrelas são bem vistas daqui, é melhor que a vista de Londres. Enquanto olho bem o céu, coloco o copo sobre a pia e resolvo voltar antes que perca o sono, mas quando me viro tenho um susto com os olhos verdes tão próximos de mim. Carl está ali na minha frente com seus braços a me encurralar entre o balcão e seu corpo com olhar misterioso.
  — E-está bem? — minha voz falha algumas vezes e o mesmo ainda tem seu semblante sério sem emoções.
  — Saiu da cama — foi apenas isso o que foi pronunciado, frio, rude, seco e duro. Deu-me a perceber o quão leve era seu sono e que conseguiu saber da minha ausência.
  — Tinha sede — me surpreendeu minha voz sair segura. Carl se aproximou deixando sua postura reta fazendo eu agora, levantar a cabeça para encarar seus olhos, porém, assim que o olho um arrepio passa minha espinha. Está apenas iluminado pela luz da lua, o que o deixa sombrio até demais, seus olhos estão negros e me encara profundamente. Minhas bochechas queimam, minhas palmas das mãos soam, engulo em seco enquanto sinto um arrepio na nuca e borboletas no estômago. Um simples olhar faz isso com alguém? Ou eu, estou tendo algum sentimento por Carl? Está mais perto, perto demais para eu sentir sua respiração calma e quente fazer cócegas no canto da minha boca, nossos olhos não desviaram para nenhum canto daquele lugar. Meu corpo é prensado sobre o balcão com o seu peso, minha cintura apertada por grandes mãos e lábios nos meus. Carl me beija, um beijo calmo e lento, o primeiro da minha vida, havia dado algumas "bitocas" em alguém, mas nunca tinha feito contato como um beijo de verdade. Não queria parar e pelo visto, ele também não, me prendeu ainda mais em seu corpo como que estivesse com medo de eu ir embora, me beija com mestria e cautela, da sua boca vem o gosto de cigarro, mas tento esquecer para me entregar a um beijo, um beijo que parecia doce, mas é amargo de natureza, um beijo errado, mas certo, bom e ruim. Esse beijo poderia ser uma perdição, porque esse beijo pode iniciar um pecado. Um pecado fatal. Mas qual seria nosso pecado? Não somos irmãos, mas nossos pais pensam assim, acho eu. Somos livres, podemos fazer isso, mas, ao mesmo tempo, não podemos, isso é errado, e nossos pais iriam vê-nos com outros olhos, olhos julgadores e de desgosto.

Destinados - Um Começo Para O Fim - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora