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  Hoje o dia para mim está sendo um dia ansioso, me sinto com muitas borboletas no meu estômago, vomitei muitas vezes pelo nervoso de ter que compartilhar algo meu para pessoas. Sinto que estou indo bem, não tenho vomitado minha comida diariamente, mas tem ocorrido recaídas, sei que tenho evitado me olhar no espelho, mas acho que isso é o melhor, a balança está afastada de mim por minha própria segurança, meu ponto de desabafo está ao meu lado toda noite, o livrinho rosa no criado mudo, assim como o de Loren. Ainda deitada na cama nesse sábado chuvoso e frio, estou a ler o diário da mesma. Percebi enquanto lia que para mim já havia virado rotina ouvir as vozes alteradas de Elina e Carl, e que não me importa mais direcionar minha atenção a ambos, estou apenas concentrada na minha leitura. Depois de tomar um banho e organizar meu quarto guardando o livro dentro do criado mudo, abro as cortinas para ver a rua morta, a neve não chegou a cobrir totalmente as ruas, porém, crianças brincam com a substancia branca. Respiro fundo o ar que entra no quarto, quero apenas deixar as coisas ruins ir, e tentar ter um dia normal. Agora estou descendo as escadas em meio aos gritos, não quero ouvir a conversa, só vou sair para comprar meus chás, até ouvir a seguinte frase da boca de Carl:

  — PORQUE NÃO FOI VOCÊ QUEM MATOU SUA IRMÃ! — paro na porta a olhar os dois, a mesma com um semblante confuso e Carl com os olhos vermelhos e marejados, suas veias aparecem e seu rosto, está em fúria. — Não f-foi você quem viu ela morta por sua c-culpa — ouço sua voz falhar pelo choro. — Por ser um puto desgraçado! — Elina se senta a  bancada o olhando querendo não acreditar.
   — Isso... você está brincando? Não está? — o encarou.
   — Olha para mim, acha que estou a gozar com tua cara? — o olhar dela foi ao chão.
   — Sabia que mexia com coisas ruins, mas... — está sem palavras.
   — Você sabia? — Carl olha sua mãe sentada a balançar a cabeça que sim.
   — Vi maconha na sua bolsa Carl, você não fuma maconha e de onde vem tanto dinheiro? Não são das suas brigas. — Ainda não haviam sentido minha presença, achei melhor assim, apenas me escondi. — Carl, não está indo mais aos psicólogos, e nem tomando seus remédios, está se deixando ao desprezo de si próprio, sabe o que po...
   — Sei que não estou tomando, sou um caralho de bomba relógio, a qualquer momento posso explodir, mas não precisa se preocupar, vou embora daqui. — Meu coração acelerou. Era isso, tudo que eu sentia, o jeito que me toca, o modo que fala. Ele se vai.
   — Não! Não! — vejo pelo espelho Elina se levantar e tocar seu filho que não a olha apenas da passos para trás — não precisa ir.
   — Você não entende? Se eu ficar vocês correm risco, mãe — foi a primeira vez que o ouvi chamar Elina por mãe em uma discussão — eu te amo, nunca quis entrar para o tráfico, foi tudo tramado para mim. Mas quando se entra, não sai mais. — Ele segurou sua mão. — Não quero ver você morta por minha culpa, não aguentaria. Estou tentando eu juro, mas tenho que ir. Se ficar não quero nem imaginar o que pode acontecer.
   — E o que vai fazer?
   — Fugir — sua voz sai baixa — para tão longe que não me encontram.
   — Filho. — Os dois se abraçam e vejo que Carl se segura para não chorar, e pelo espelho me encara, olho no seus olhos para ver a sua angústia e decepção antes de abrir a porta de casa e sair. O vento frio que bate no meu rosto, denuncia para mim que lágrimas descem, passo o dorso da minha mão direita nas minhas bochechas para enxugar as teimosas lágrimas, sabia de tudo por quê chorava? Talvez por não querer saber que era verdade.

     No mercado pego algumas caixas de chá e na fila para o pagamento eu recebo uma ligação.
   — Ei — ouço a voz do outro lado da chamada e tiro o celular do ouvido para ver a foto.
   — Temothe! — Quase grito e todos que ali estão me olham, fazendo abaixar a cabeça e sentir o rubor nas minhas bochechas — Temothe — sorri comigo mesmo.
   — E ai menina, como está? — pago a moça e pego a sacolinha.
   — Obrigada. Estou bem e você? Como vai a faculdade? — Temothe é um primo distante meu, sobrinho de meu pai e mora na Irlanda, morava, está em Washington a fazer faculdade e trabalhar.
   — Estou bem e os estudos estão acabando finalmente. Daqui para sua formatura, também já tenho me formado.
   — Queria muito ir a sua formatura, mas a escola não permite — um ar triste sai da minha boca e ouço um suspiro de meu primo mais velho.
   — Não se preocupa pequena, eu entendo completamente seu lado. Mas assim — ri brincalhão — até a sua, eu não estudo mais — fala debochado se gabando — e irei para Londres.
   — Hahaha! Se você estivesse aqui...
   — Ganharia um bom e lindo dedo do meio a cara — rimos juntos e entro na casa quente e aconchegante.
   — Exatamente — deixo as caixas sobre o balcão enquanto vou colocar água no fogo, quando me viro me deparo com um Carl a porta.
   — Eu tenho que ir. — Ouço algumas vozes atrás da ligação — mas tento te ligar novamente.
   — Até logo Temothe. — Ouço sua despedida e antes que pergunte como conseguiu meu número novo ouço a chamada ser encerrada.

Destinados - Um Começo Para O Fim - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora