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Angel

   Eu e Carl andamos de mãos dadas pela rua calados. Ele não quis se pronunciar e nem eu, até porque estava sem assunto para discutir com ele, triste demais para pensar em alguma coisa.
   — Acabei o tom da música e quero muito te mostrar, quero sua opinião — olhando para ele como se fosse uma criança o analisando, percebo que está mais gordinho, sua pele ficou mais limpa do que antes, seus cabelos estão bem maiores do que quando o conheci e parece que não cortou mais. Me surpreende o seu jeito de lidar com as coisas, por mais que quebre a cabeça muitas vezes, tenha suas recaídas e tudo. Acho que nunca serei como ele e Elina, até porque somos pessoas diferentes, mas queria ter esse jeito de lidar com as coisas como eles têm. Eu simplesmente tento e faço piorar todas as coisas, e quando tento, algo impede. Às vezes penso o que estou fazendo aqui, pareço tão inútil, sou tão inútil! — Angel — olho o rapaz — não disse nada até agora. — Parece desesperado para receber alguma resposta e então eu tomo um par de inspirações e a única coisa que sai da minha boca foi um horrível:
   — Estou ansiosa para ouvir — não olho nos seus olhos apenas continuo com minha atenção no caminho.
   — O que te atormenta? — quer realmente se sobre carregar com minhas tolices?
   — Não há nada — o olho semicerrando meus olhos pela luz do dia. Carl fica quieto e entramos em uma praça, se sentou em uma mesa de pedra e fiz o mesmo, a pequena bolsa foi depositada sobre a superfície e seu violão foi para o chão ao seu lado.
   — Há tudo, Angel — me olha — percebi que anda meio longe.
   — É esse papo de consulta — o encaro — quero fazer, mas tenho medo. Sei que já falamos disso, mas é que, também quero fazer minha faculdade e tenho medo de quantos anos posso passar fazendo esse tratamento.
   — Depende do seu nível de anorexia — o mesmo suspira.
   — É isso que eu tenho medo. — Não o olho.
   — Vamos esquecer um pouco essa consulta, faculdade e etc. Será que podemos comer e ouvir uma música e pensar em coisas boas por um momento? Estamos preso nesse mundo de coisas ruins, pensar na faculdade é ótimo Angel, mas esses pensamentos estão se tornando pessimistas.
   — Você está certo — passo a mão no meu rosto — me mostre a música, sim? — Carl sorri de lado e libera seu violão de dentro da capa de couro preta. Os acordes surgem e logo um pequeno agudo sai da sua garganta, a voz grave se mistura com os toques do violão e me fazem prestar atenção na letra que se refere a mim. Quando disse que o inspirei nunca pensei ter feito uma música sobre mim. Pois nunca pensei ter tantas qualidades para inspirar alguém a esse ponto, talvez porque eu só enxergo partes ruins de mim, ou talvez é falta de estima para ver os pontos positivos que tenho, como ajudar alguém com conselhos ou apenas ser ouvinte. Apesar de servir como conselhos para Carl, Miguel ou Fernanda. Os conselhos nunca servem para mim, e cá estou eu, ouvindo uma música tão boa e pensando coisas ruins de mim mesma. Por que será que não consigo pensar bem? Por que não me vejo como uma universitária a conseguir cumprir todos seus sonhos? Por que a única coisa que vejo é uma cova? Eu tenho tanta vontade de lutar, mas parece que o inimigo nunca morre. Quando os acordes param Carl me olha, sua música me fez refletir, prestei atenção?
   — O toque caiu bem com a melodia — isso era verdade, caiu bem com a melodia que a letra soava. Algo mais calmo menos agressivo.
   — Vamos comer — disse sorrindo. Queria sorrir nos meus momentos mais tristes, sinto um pouco de inveja do sorriso dele, como conseguia o manter tão largo apesar do peso que carrega? Me surpreende. Entrega o sanduíche e o olho, meu estômago reclama da fome apenas sentindo o cheiro do alimento, me orgulho de não vomitar quando como, sinto ânsia sim, mas evito, tenho medo de cair em recaídas novamente como anteriormente,  mas tenho certeza que depois da minha consulta, eu espero não cair tanto em tentação novamente.

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Destinados - Um Começo Para O Fim - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora