INTERLÚDIO: EU TE AMO MICAELA - I PARTE

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LUCAS

— Aconteceu de novo — disse o garoto com a cabeça baixa. Massageando um dos polegares com o outro, de mãos unidas sobre as pernas, sentada na cadeira de plástico branca. — Eu achei que poderia controlar. Sempre acho que estou no controle, mas não sei até onde suporto continuar nessa farsa. Eu quero, sempre mais e mais, e continuo me afogando na frustração, uma vez depois da outra. E não sei se vou sobreviver dessa vez. Agora é tudo ou nada pra mim, ou eu venço, ou eu morro tentando.

— Lembre-se, morrer nunca é uma opção, Lucas. Vença. Obrigado por compartilhar conosco — disse a mulher alta e de juba leonina em cachos bem curtos e espiralados. Alta e magra, de pele negra e olhos afiados e castanhos. — É assim que nos sentimos quando estamos perdidos no mundo das drogas. E quando caímos, sentimos que nunca vamos nos reerguer, então desistimos de tentar. Mas não podemos. Tem pessoas que amamos nos esperando onde a luz e a bondade habitam.

— E se não houver... — Lucas retrucou. Sempre vinha para esses grupos de apoio a usuários de drogas quando perdido em sua própria cabeça. Entender a desgraça alheia, parecia aconselhá-lo em seu próprio caminho. As pessoas em volta encavaram-no. — Ou melhor, e se quem precisa que esteja esperando por você, não estiver. E se essa pessoa, for tudo por quem você luta, mas sabe desde sempre que vai perder. De novo e de novo, não importa o quanto tente.

— Se essa pessoa não estiver do seu lado quando estiver se erguendo, significa que não precisa dela quando já estiver de pé. E se esse é o caso, mesmo amando essa pessoa, ela não merece seus sentimentos.

A voz que cruzou os ouvidos ali, Lucas conhecia bem a pessoa dona delas. Era um jovem asiático que volta e meia surgia nas sessões. Era do tipo de sujeito calmo e raramente se pronunciava, mas quando o fazia, sempre tinha coisas interessantes — e até sábias — a dizer.

O fim da sessão do grupo veio, e Lucas saiu enquanto todos se despediam. Aquela era uma noite onde preferia ficar só. Esteve evitando todos que podia nos últimos dias. Sabia que poderia ouvir Eva e que ela diria tudo que ele poderia querer escutar; que tudo passaria e ele e Angelina ainda ficariam juntos. Mas não desejava ouvir nem isso.

Então saiu do colégio. Afinal, ele pode usar táticas para fugir, mas a verdade é que não precisa. O reitor — seu padrasto — está completamente a mercê de seus desejos. Afinal, Lucas quem o fez tão famoso como ele é, lhe contando segredos antigos e informações privilegiadas, em troca de dá-lo a liberdade que precisava naquele colégio, sem chamar a atenção de outros humanos. O quão irônico poderia ser, um homem religioso feito aqueles acreditar nas habilidades que Lucas alega ter, sem saber que está ouvindo o Diabo sobre seu ombro, lhe sussurrando doces palavras?

Não que o reitor goste de Lucas por ter lhe dado tudo isso. Nem perto. O homem praticamente proibiu o garoto de atravessar as portas de sua casa, se não por uma boa razão. E Lucas sabe por quê, ele presenciou um pouco do sobrenatural, e sendo um homem fraco como é, seu coração se encheu de temor.

Caídos (duologia Trono de Fogo)Onde histórias criam vida. Descubra agora