58- Ela Vai Lutar Sozinha

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Maratona que se fala, né?

(...)

O ambiente havia caído alguns graus desde que Gizelly tinha chegado. Depois de decidirem conversar, ambas foram para a sala e se sentaram no sofá, frente a frente. Marcela até tinha esquecido e deixado de lado o omelete que estava prestes a fazer antes de a aluna chegar. O silêncio durou por vários segundos, enquanto se olhavam e desviavam os olhos a cada instante.

Marcela pensou e pensou sobre como começar a falar a respeito de Carolina, a história era enorme, mas se não começasse do início, não seria sincero o suficiente, não da forma que ela merecia que fosse. Sabia que ela estava esperando que começasse, por isso respirou fundo e somente deixou que as palavras saíssem uma atrás da outra:

- Eu vou começar do início de tudo, tudo bem para você? - Gizelly assentiu, então continuou: - Quando eu era pequena, lá em Santa Teresa eu sempre era cercada de crianças, mas tinha duas pessoas das quais era mais próxima. Uma delas era Mari e a outra Carol. Enquanto Mari era a que me defendia, Carol era a que sempre implicava.

Respirou fundo um par de vezes, não conseguindo não se lembrar de como era no passado. Enquanto Mariana ajudava a guardar os brinquedos, Carol sempre era a que desobedecia as regras e bagunçava tudo de novo. Isso se seguiu até a adolescência. Apesar de todas as desavenças, eram melhores amigas, as três.

Gizelly escutava tudo em silêncio, apenas observando-a, a expressão indecifrável.

- Quando a gente começou a namorar, nós tínhamos 17 anos - a morena arqueou as sobrancelhas, surpresa. - É, tem tempo. Nós namoramos por seis anos e, como minha mãe havia dito, estávamos planejando nos casar.

Por mais que quisesse ouvir a história toda do início ao fim, a estudante não conseguia não se sentir mal por isso, pelas coisas que ela estava contando, pelo o quanto foi intenso o que uma tinha com a outra. Elas namoraram na adolescência, Carolina era a primeira namorada, alguém que você nunca esquece, independente do tempo que passasse. Mas não falou nada, apenas ficou quieta escutando o resto da história.

- Até então eu consigo falar bem sobre esse assunto, mas a partir de agora talvez eu dê algumas pausas - Marcela respirou fundo e continuou falando: - Quando a gente tinha 23 anos, ela resolveu fazer um intercâmbio na Austrália. Já tinhamos 6 anos de namoro e o casamento só faltava marcar a data. Eu entendi que ela precisava focar na vida e na carreira dela, ela era brilhante - pausou por um segundo para verificar se o elogio tinha afetado de alguma forma, mas ela seguia indecifrável. - E ela foi, a princípio foi para passar 8 meses e nesse tempo decidimos dar um tempo, porque não é fácil levar uma relação estando tantos quilômetros de distância, ela estava do outro lado do planeta e eu aqui, né?

A cena completa passou por sua mente como se tivesse sido ontem, Carolina com roupas mais quentes no aeroporto esperando pelo avião. Estava com ela, sempre estava com ela, e vê-la partir foi a pior coisa que já sentiu na vida depois do que aconteceu com sua mãe. Era como se um pedaço do seu corpo tivesse ido junto com ela para outro lado do mundo.

- Eu segui a minha vida aqui, comecei a dar aulas para o ensino médio de biologia e seguimos nos falando, nos amando mesmo à distância - Marcela suspirou. - Então os oito meses se passaram, eu ainda esperava por ela e ela por mim. A única coisa que eu não esperava era uma renovação dos estudos lá fora, mas ela me pediu para ir para lá, se ofereceu para pagar. Eu neguei, mas garanti que ia juntar o dinheiro e ia por conta própria. Um ano se passou e foi aí que tudo aconteceu.

Por mais que a morena quisesse se manter imparcial enquanto ouvia Marcela falando, não conseguiu manter os olhos nela por muito tempo. Não conseguia olhar para ela enquanto falava de outra garota, enquanto estava vivendo no passado, pois ela vivia o passado enquanto contava. Seu coração estava tão pequeno, tão comprimido, que sentia doer conforme ela falava. Ela deu uma pausa e se levantou para ir até a cozinha, apenas esperou sentada e logo ela estava de volta com dois copos de água, lhe oferecendo um deles.

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