『Eu quero o divórcio!』

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  Nicole Davis,
  28 de março, sábado.

Depois de tantos dias enrolado, era a primeira vez desde o início do ano que a manhã se iniciava chuvosa. E com a leve brisa fria que invadia as frestas da janela meia aberta, senti Ayla se abrigar ainda mais em mim. Ela não havia despertado, continuava adormecida e presa em meu corpo como se dependesse dele para ter um sono tranquilo. Me sentia um urso de pelúcia em algumas circunstâncias, mas era maravilhoso estar dormindo ao seu lado durante todas as noites. Os problemas iniciais não nos acompanhavam mais, então não era necessário manter nossa relação em segredo, podíamos enfim curtir o momento sob o teto das nossas mães sem temer uma má interpretação durante algum comentário, ou aqueles toques que vagavam além dos seus limites.  Estávamos vivendo ali, da mesma forma em que vivemos quando ocupamos o nosso apartamento. Aceitação e compreender era mesma a chave para tudo.

O relógio jogado sobre as peças de roupas amarrotadas ao chão do lado da cama, marcava quase meio dia quando enfim consegui acionar alguma coragem para deixar a folga que me encontrava nela. Estava mesmo na hora, não tinha porque ficar ainda mais tempo dentro daquelas quatro paredes. Porém, quando me movimentei para ficar de pé e ir atrás do que seria a minha higienização "matinal", minha querida e amada namorada me puxou ainda mais para o seu lado.

Ignorando o seu fingimento sobre ainda estar dormindo, neguei sua ação com um divertido sorriso nos lábios e me livrei do seu toque para fazer exatamente aquilo que se passava em mente. Pude ouvir algum tipo de reclamação deixar a sua boca, mas não me esforcei o suficiente para conseguir entender o que ela havia tentado me dizer. Checando as mensagem que me foram enviadas, apenas caminhei até o vanheiro para me livrar da cara amassada que era apresentada para quem quisesse ver. Precisava me recompor para vencer mais uma data no calendário anual.

— Eu quero o divórcio! – no momento em que fechei a porta, a ouvi gritar me tirando um novo e sincero sorriso. Era mesmo a sua cara apelar para tais ameaças, se tornava algo até mesmo engraçado. A via como minha filosofia de vida.

— Eu me recuso! – entrando de ponta cabeça na brincadeira, respondi com o mesmo tom usado por ela. Então liguei a água para poder sair tão rápido quanto entrei, mas entendendo que talvez não fosse possível quando a mesma se fez presente em minhas costas.

— Sai pra lá, vou tomar banho primeiro – me cedendo um leve empurrão para o lado, praticamente nua se pôs debaixo do chuveiro me encarando com um sorriso de orelha a orelha. Tudo o que cobria o seu corpo era o fino tecido da calcinha de renda na cor preta, que em contraste com sua pele quase branca, me hipnotizou.

Seu jeito criança era tudo pra mim, não conseguia enxergar uma versão sua que não fosse tão alegre consigo mesma, sempre contagiando todos ao seu redor. Como ela gostava de dizer, esse seu lado era como uma religião pra mim.

Apenas a observando, encostada contra a parede da pia com os braços cruzados, cheguei a cogitar a brilhante ideia de adentrar mais aquele jogo e a expulsar do chuveiro para roubar o seu lugar. Mas aquele sorriso com os olhos quase se fechando e aquelas rasas covinhas em suas bochechas não me permitiam agir, não importava o quanto eu quisesse o fazer. Vê-la naquele bom humor era tudo pra mim, nada me parecia ser mais importante do que a sua felicidade.

— Você não vem? – me dando as costas para deixar que seus fios fossem completamente inundados pela água corrente, questionou de maneira simples, não expondo qualquer tipo de malícia. Talvez quisesse apenas uma ajuda para limpar os seus longos fios, que embaixo d'água se transformavam em um negro intenso.

— Pensei que me quisesse longe, pois aquele empurrão não foi nada sutil – impondo algum drama ao nosso momento, a vi apenas negar sem me direcionar o seu olhar. Ela estava mais preocupada em ensaboar seu cabelo enquanto o massageava com enorme paciência e cuidado. Então foi a minha vez de negar um ato seu – Quando terminar, lembre-se de me avisar. Estarei esperando do lado de fora – dando certeza de que realmente seria essa a minha ação, ajeitei minha postura ao descruzar os braços e me virei para sair sem ter mais nada para lhe dizer. Era a minha jogada para aquele momento, porém, me dei conta de que ela queria muito mais do que apenas um auxílio quando senti sua mão molhada segurar a minha com enorme firme, mas ao mesmo tempo com muito cuidado. Aquela característica era apenas sua, dentre a nossa família, ninguém mais a possuía.

𝗠𝗶𝗻𝗵𝗮 𝗜𝗿𝗺𝗮̃ 𝗠𝗮𝗶𝘀 𝗩𝗲𝗹𝗵𝗮 - 𝒻𝒾𝓁𝒽𝒶 𝒹𝒶 𝓂𝒾𝓃𝒽𝒶 𝓂𝒶̃𝑒Onde histórias criam vida. Descubra agora