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Oi, estamos chegando nos últimos capítulos. Nesse, para quem ficou confuso, vai ter  explicação do estado da Maraisa. Recomendo lenços para secar as lágrimas, é um capítulo "pesado", carregado de emoções. Boa leitura.

"Me traga de volta, Marilia, por favor, sempre que possível, me traga de volta para você..."

*

– Já faz muito tempo, mas eu prometi e reprometi, e aqui estou, cumprindo minhas promessas. – Ela sorri.

– Por favor, continue as cumprindo. – Aceno com a cabeça, concordando. – Você está tão mudada. – Afaga o lado direito da minha face, o que me faz sorrir.

– Estou? – Beijo sua mão em meu rosto.

– Sim. – Sussurra.

– Acho que não existe cabelos loiros, pele lisa e corpo bem cuidado, que resistam sem nenhum dano ao tempo, certo? – Passa a mão pelos meus cabelos, enquanto me sorri.

– Você continua linda, mas agora é linda na versão senhorinha. – Seu comentário me arranca uma risada.

– Mas você continua preferindo a versão mais jovem. – Conto. – Sempre que precisamos mudar de enfermeira, você dá preferência a loiras, e gosta de chama-las de Marilia. – Ela sorri envergonhada e desvia o olhar.

– Me desculpe. – Murmura o pedido, me fazendo sorrir e passar o braço em volta de seus ombros.

– No seu lugar, eu também daria preferência a minha versão mais jovem. – Até porque, ela pouco conhece a mais velha. Deita a cabeça em meus ombros e suspira.

– Por que temos uma enfermeira? – Sua pergunta sai surrada, ela tem medo de ouvir a resposta.

– Você sabe, já não somos mais tão jovens assim, então é sempre bom ter ajuda. – Desconverso.

– Não minta para mim, Marilia. – Pede. – Não faça de conta que está tudo bem, porque eu sei que não está. Só não consigo entender o que aconteceu. – Sua mão repousa em minha perna a aperta. – Me conte. – Suspiro e concordo.

– Não temos uma enfermeira, temos três. – Começo. – Elas trabalham em três turnos diferentes. – Continuo. – Elas me ajudam a cuidar de você. Você tem uma doença chamada Alzheimer, é uma doença neurodegenerativa que causa algumas complicações, uma delas é a perda de memória. – Explico o básico. - Às vezes as coisas ficam um pouquinho difíceis, então precisamos de ajuda. – Ela faz silêncio, como sempre acontece quando lhe conto isso. Afago seus ombros enquanto espero seu tempo, espero ela processar a informação, e aceita-la. Às vezes aceita bem, as vezes chora, as vezes tem crise de raiva, e outras vezes, faz de conta que não ouviu e começa outro assunto.

– Por isso eu não consegui ler muitas das palavras que estão escritas no seu diário? – Sussurra, enquanto mira um ponto qualquer em sua frente.

– Sim. – É tudo que respondo.

– E mais o quê? – Sua voz soa angustiada, o que me faz suspirar.

– Maraisa... – Tento pôr um fim ao assunto, mas ela vira o rosto em minha direção, seus olhos marejados procuram pelos meus.

– E mais o quê? – Insiste.

– O piano. – Aponto para o instrumento. – Você quase não sabe mais como toca-lo. – Conto. – Às vezes você para em frente ao espelho, e não reconhece sua imagem refletida lá e aí você briga e bate boca com você mesma. – Envergonhada, ela volta a desviar os olhos. – Você não sabe mais escrever, não sabe mais sobre as horas, o dia da semana, o ano. – Uma lágrima solitária desce pelo seu rosto. Decido não tortura-la mais, faço silêncio e de novo espero seu tempo. Ela leva a mão ao rosto e se desfaz da lágrima.

ESCAPE | MALILAOnde histórias criam vida. Descubra agora