Uma criança transgênero

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- Ruan, melhor a gente ir, se eu perdi mesmo a pulseira por aqui, a gente nunca vai encontrar. Alguém pode ter achado, ou simplesmente a maré subiu e levou.

- Queria muito ter te ajudado com isso. - Disse ele.

- Mas você me ajudou e muito, me trouxe aqui, procurou por mais de um hora comigo.

- Podemos ficar um pouco mais? - Perguntou ele.

- Sim, claro.

Ele sentou na areia e ficou olhando para o horizonte, e eu sentei ao seu lado.

- Você está bem? - Perguntei.

- Sim, queria te agradecer por me ouvir ontem.

- Tudo bem, quando quiser conversar...

- Eu nunca falei da minha vida assim, tão abertamente, nem para minha ex namorada.

- Vocês namoraram por quanto tempo? - Senti que agora eu tinha mais espaço para perguntar algumas coisas mais "íntimas".

- Pouco tempo, 4 meses. E você namora?

- Não, eu nunca namorei ninguém.

- Entendi, mas me fala mais de você, você teve uma infância feliz? (Perguntou ele)

- Sim, minha infância foi muito legal.

- Que bom, a minha não. - Disse Ruan.

- Quer contar?

- Então, não é fácil ser uma criança transgênero, e nós existimos, eu fui uma, desde que me entendo por gente, com meus 3, 4 anos, já odiava usar vestidos, saias, tiaras de cabelo, laços, pulseiras, brincos, sou filho único, e o sonho dos meus pais sempre foi ter uma menina, então meu quarto era todo rosa, tinha uma grande casa da Barbie e era cheio de bonecas e ursos por todo lado, e eu odiava bonecas, sempre que meus primos iam para minha casa eu pegava os seus brinquedos de super heróis, carros, bola, e sabia que era aqueles brinquedos que me identificava. Com uns 5 anos eu lembro que já queria cortar o cabelo, meu cabelo era muito grande e me incomodava, mas minha mãe amava, suas amigas elogiavam, eu era uma "linda garotinha da mamãe", mas por dentro um garotinho sofria, chorava, e doía de verdade. - Ruan conta enquanto deixa escapar algumas lágrimas, passa as mãos no rosto para secar e nesse momento eu toco em seu ombro.

- Ruan você não precisa falar sobre isso agora.

- Não, tá tudo bem, já passou, só pra você ter noção do quanto é um assunto delicado, ficam muitos traumas. Mas eu quero falar.

- Tudo bem, pode falar, eu te escuto.

- Eu pedi pra você falar mais sobre você e eu não paro de falar de mim, desculpa.

- Continua falando, depois te conto minha história, eu quero te ouvir. - Eu sentia que Ruan precisava falar, e queria muito acolher ele de alguma forma.

Amando uma SereiaOnde histórias criam vida. Descubra agora