Marcelo levantou em cedo e em silencio naquela manhã e foi até o banheiro, pois não queria acordar o marido. O lugar que tinha machucado no dia anterior estava dando umas fisgadas doloridas e apesar de saber que tinha de fazer alguma coisa, não queria ouvir o sermão de Diego, que com certeza falaria algo como "eu te disse pra ir na UPA ontem, não é?" .
Havia pouquíssimas coisas que ele detestava no marido, mas uma delas era aquele comportamento de jogar na sua cara quando algo do qual havia sido avisado, por Diego, que daria errado, no fim acontecia. E enquanto estava em pé na frente do espelho, desembrulhou a faixa em volta da mão e observou o corte fundo que foi feito na área logo abaixo do seu polegar.
E claro, também havia o fator de que ele era um acupunturista e precisava de ambas as mãos em boas condições para exercer a profissão, afinal, como iria aplicar as agulhas com aquele talho na mão? – pensando isso, se recriminou mentalmente por ter sido tão descuidado ontem e estava pensando em como contar para Diego que precisaria ir ao pronto-atendimento, quando ouviu uma batida tímida na porta do banheiro.
Ao abrir, encontrou Paulo em pé do outro lado, encarando-o com aqueles grandes olhos castanhos e assustados e só então Marcelo se deu conta de que tinha ficado quase uma hora sentado em cima do tampo da privada olhando para o corte que continuava repuxando dolorido.
— Bom dia, rapazinho, precisa ir no banheiro? — viu Paulo concordar com um gesto de cabeça e então deu passagem para o menino e ouviu a porta se fechar a suas costas.
— Tá tudo bem, Ma? — ouviu a voz de Diego as suas costas e suspirou cansado, prevendo todo o discurso do "eu te disse" que com certeza viria quando mostrasse o ferimento que agora estava doendo.
— Lembra o corte que eu fiz sem querer ontem enquanto colocava as serpentinas? Então... Começou a doer hoje e acho que vou precisar de pontos mesmo. — não olhou para trás, não queria ver a expressão de satisfação involuntária que aparecia no rosto do outro, Diego não era uma má pessoa, mas não conseguia disfarçar suas expressões.
— Deixa eu ver. — sentiu a mão morna dele segurando seu braço e permitiu que pegasse seu pulso, mas não o encarou.
— Quer que eu te leve no UPA? Podemos sair agora, eu te deixo lá, vou levar o Paulo e quando você sair me manda um whats e eu saio da imobiliária e vou te buscar. — sem repreensão, sem bronca, sem "eu avisei, não é?" e isso surpreendeu Marcelo que não conseguiu se conter e perguntou se o outro não tinha nenhum comentário sobre aquilo.
— Você sabe que eu tenho, mas agora não é hora de ficar jogando coisas na sua cara. A gente precisa cuidar desse corte e rápido. — Viu Diego voltar para o quarto, se trocar, sair e bater na porta do banheiro, dizendo para Paulo ir se aprontar, que eles sairiam mais cedo hoje.
Em seguida ele foi para a cozinha, onde começou a montar a lancheira do menino. Marcelo podia notar que o outro estava incomodado, pois isso ficou transparente na sua expressão facial, mas não conseguia entender o motivo. Foi um acidente bobo e ele só contou porque não conseguiu resolver sozinho.
— Paulo, anda logo! Você toma café no carro hoje! — Diego chamou o irmãozinho ao mesmo tempo em que fechava a lancheira e lançava um olhar irritado para o marido, dizendo para que fosse trocar de roupa.
— Ou você vai de pijama pra UPA? — pressentindo que uma discussão estava chegando, Marcelo não retrucou e voltou para o quarto trocar de roupa. Colocou uma faixa limpa em volta do ferimento e voltou para a cozinha, onde ouviu o menino perguntar porque tinham de sair tão cedo.
— Eu vou levar o Marcelo no hospital. — Diego disse com certa rispidez, o que causou desconforto e medo em Paulo que ao ouvir a palavra "hospital" pensou em coisas ruins que aconteciam lá.
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Lar é onde o coração está
RandomA vida de Diego mudou completamente quando ele recebeu uma ligação num Domingo de manhã, informando que sua mãe, com quem ele não falava há anos, faleceu e deixou a guarda de seu meio irmão caçula para ele. Com as únicas opções de aceitar o menino o...