Capítulo 12

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Embora ainda não sejam dez horas, Peter e eu somos os últimos a chegar. Os outros Tributos estão reunidos em um círculo retesado. Cada um deles possui um quadrado de pano com o número de seu distrito preso às camisas. Enquanto alguém prende o número 4 em minhas costas, dou uma olhada geral. Assim que nos juntamos ao círculo, a treinadora principal, uma mulher alta e de porte atlético chamada Atala, dá um passo à frente e começa a explicar como será a rotina de treinamento. Os peritos de cada habilidade permanecerão em suas estações. Nós ficaremos livres para transitar de uma área para outra de acordo com a escolha que fizermos, seguindo as instruções de nosso mentor.

Algumas estações ensinam técnicas de sobrevivência, outras técnicas de combate. Nós somos proibidos de nos engajar em qualquer exercício de combate com outro Tributo. Há assistentes à disposição se quisermos praticar com algum parceiro.

É a primeira vez que estamos todos reunidos, no mesmo nível e com roupas comuns. Meu ânimo desaba. Quase todos os garotos e, pelo menos, metade das garotas são maiores do que eu, embora muitos deles nem tenham sido adequadamente alimentados. Dá para ver pelos ossos, pela pele e pelo olhar vazio de alguns deles. Posso ser menor por natureza, mas pelo menos os recursos que minha mãe me disponibilizou me garantiram uma vantagem nesse quesito.

— Qual estação você prefere?— Peter me cutuca chamando minha atenção.

Fico pensativa, olhando para cada uma. Finnick nos recomendou não mostrarmos o que sabemos, o que no meu caso é quase nada, estou olhando diretamente para a parede de escalada, onde os jogadores do 1 e do 2 alcançam o topo em segundos. Eles comemoram batendo suas mãos.

— Irei tentar fazer uma fogueira.

Estou indo na direção da parte mais vazia quando percebo que Peter me segue, paro abruptamente e o olho. Ele parece envergonhado, estou prestes a expulsa-lo, mas me contenho, não quero ficar sozinha também.

— Posso te ensinar o que sei.— ele oferece assim que nos sentamos na parte de pedra. Aceito sua ajuda e o observo começar a fazer, ele passa cerca de 20 minutos esfregando às duas pedras na direção das folhas secas que ele montou, até sair a primeira faísca, e então em segundos a chama aparece. — Requer um pouco de tempo dessa maneira.

— Parece fácil.— sorrio para ele que retribui.— Me deixe tentar.

Estamos em uma conversa sobre fontes de calor, Peter diz que talvez haja fósforos ou isqueiros que irão facilitar, quando dois garotos se aproximam da gente. Levo segundos para ver que são dos Distritos 1 e 2. O garoto do 1 é tão alto quanto Finnick, ele possui uma diferença marcantes nos olhos, um é de um azul cor do céu, o outro preto, fico um pouco distraída até que ele fala.

— O Distrito 4 não teve voluntários esse ano, não é? — questiona e eu me contorço para não jogar uma pedra nele.

— Não teve.— Peter responde baixo, ele parece atento.

O outro garoto, do Distrito 2, é ruivo até a ponta das orelhas. Seria bonitinho se não tivesse todos os dentes tortos de uma maneira esquisita.

— Mostre-nos o que sabem fazer, podemos cogitar em formar uma aliança com vocês.— diz o do 2.

— Que tipo de coisas vocês exigem saber? — Peter pergunta e eu o olho com raiva. Finnick deixou claro para não confiarmos neles e lutarmos por nós mesmos.

— Usar uma arma, óbvio, e ser forte o suficiente.— diz o loiro do 1.

— Sei fazer isso.— Peter abre um sorrisinho.

Então os olhos dos três caem em mim, estou com uma carranca que deve se assemelhar a da minha mãe.

— E você gatinha? Deve saber bem como atrair alguém, não é?— o ruivo pergunta e abre um sorriso.

— Não tenho interesse em me juntar com
nenhum de vocês, obrigada.

Me levanto de onde estava com Peter, e deixo claro que também não me juntaria com ele. Passo entre os dois carreiristas e me assusto quando um deles agarra forte o meu braço. Percebo que é o ruivo desgraçado.

— Não vamos oferecer isso outra vez.— ele praticamente grunhe.

— Ótimo, se preservem de outro fora.— retruco puxando meu braço do seu aperto.

O garoto loiro e Peter riem, mas eu os ignoro e vou para o outro lado da estação, me aproximar da parte que explica às frutas e outras coisas venenosas.

Então, os três dias seguintes transcorrem com eu indo silenciosamente de estação em estação. Adquiro realmente algumas habilidades valiosas: acender fogueiras, arremessar algumas facas, fazer abrigos. Passo no teste das plantas comestíveis sem piscar um olho sequer. Contudo, me mantenho distantes da parte que possuí os facões e katanas, reservando isso para minhas sessões com Finnick.

Os Idealizadores dos Jogos apareceram cedo no primeiro dia. Vinte e tantos homens e mulheres vestidos com túnicas lilases. Eles se sentam nas arquibancadas elevadas que circundam o ginásio, às vezes andando para nos ver, tomando notas, outras vezes comendo no interminável banquete que foi instalado para eles, ignorando-nos a todos.

Café da manhã e jantar são servidos em nosso andar, mas, na hora do almoço, os vinte e quatro tributos comem na sala de jantar que fica fora do ginásio. A comida é arrumada em carrinhos que ficam espalhados pela sala e todos se servem. Os Tributos Carreiristas tendem a se reunir de modo desordeiro em torno da mesa, como se estivessem demonstrando superioridade, passando a mensagem de que não têm medo uns dos outros e que consideram os restantes de nós abaixo da crítica. Me surpreendo a ver que Peter agora é um deles e se senta junto, come e até gargalha. Nossa relação agora estar pior, e eu sei que ele percebe minha proximidade com Finnick, mas não posso e nem vou evitar, se ele vai ter vantagens com um grupo, eu terei com patrocinadores.

— Quero todos os detalhes.— Finnick me pede no fim do dia.

É muito tarde e estamos sozinhos na sala, um filme qualquer e mal produzido sendo exibido na televisão. Meus pés estão estendidos no sofá e meu mentor está fazendo uma massagem tão deliciosa que tenho dificuldades para encontrar palavras. Mas conto com todos os detalhes que lembro do treinamento, me referindo a numerologia dos jogadores para contar suas habilidades e defeitos. Tenho apenas algumas dificuldade com os dois Tributos do Distrito 8, eles são verdadeiras incógnitas.

— Peter está com eles agora?— ele pergunta baixinho e eu assinto. O vejo suspirar tenso, suas mãos param de trabalhar em meus pés. Quase reclamo.— Eles vão caça-la Malia, você agora é um alvo, porque além de debochar de um deles, é do mesmo Distrito que o outro. Carreiristas são criaturas orgulhosas.

— Sempre fui um alvo Finnick, não vai mudar muita coisa eles me caçarem no começo ou no final quando restarmos apenas nós.

No terceiro dia de treinamento, começam a nos chamar na hora do almoço para nossas sessões particulares com os Idealizadores dos Jogos. Distrito após Distrito, primeiro o tributo masculino, depois o tributo feminino. Esperamos na sala de jantar, sem ter certeza sobre para onde iríamos. Ninguém volta depois que sai. À medida que a sala fica vazia, a pressão para parecer amigável se acentua.

Não tenho ideia do que farei com a Katana para demonstrar minha pouca habilidade, mas quando me chamam minutos depois, não tenho mais tempo. Tenho vantagem porque sou um dos primeiros Distritos, então qualquer coisa que eu faça parecerá mais interessante do que a do próximo. Sei que querem mais do que qualquer outra coisa voltar para suas casas, mas eu posso dar algo. Caminho até a estação das armas de corte, e testo o peso de duas, escolho a mais leve e então me dirijo para o rinque e coloco alguns manequins à disposição.

Me movo com agilidade na direção de todos eles, levo segundos para cortar cada uma de suas gargantas e os corpos desmontarem no chão. Olho na direção dos idealizadores e escuto algumas palmas, uns parecem satisfeitos e outros um pouco entediados. Sou liberada para sair e me sinto um pouco feliz por não ser um fracasso total.

70° edição dos Jogos Vorazes Onde histórias criam vida. Descubra agora