Capítulo 16

3.1K 339 14
                                    



Quando a porta do elevador se abre, os outros tributos estão sendo enfileirados para subir ao palco. Todos os vinte e quatro nos sentamos em um grande arco durante toda a duração das entrevistas. Serei primeiro que Peter, e isso me anima um pouco, talvez se eu for bem e receber alguns aplausos ele se sinta intimidado.

— Seja você mesmo...— ele morde o lábio e nega um pouco com a cabeça.— Talvez um pouco mais doce.— Finnick sussurrou quando passou por mim.

O simples fato de pisar no palco já acelera minha respiração. Sinto minha pulsação ressonando em minhas têmporas. É um alívio chegar à cadeira porque, entre meus calcanhares e minhas pernas trêmulas, sinto que vou tropeçar, os saltos altíssimos que Fenty me fez usar com a intenção de me deixar mais atraente não ajudam em nada.

Embora esteja anoitecendo, o Círculo da Cidade está mais iluminado do que em dia de verão. Uma unidade com assentos elevados foi colocada para acomodar os convidados ilustres, com os estilistas ocupando a primeira fileira. As câmeras vão focalizá-los quando a multidão estiver reagindo à criatividade deles. Uma grande varanda em um edifício à direita foi reservada para os Idealizadores dos Jogos. Equipes de televisão ocuparam a maior parte das outras varandas. Mas o Círculo da Cidade e as avenidas que desembocam nele estão completamente abarrotados de gente. Só há espaço para as pessoas ficarem de pé.

Nas casas e nos espaços públicos por todo o país, todos os aparelhos de televisão estão ligados. Todos os cidadãos de Panem estão assistindo ao evento. Hoje não haverá blecaute em lugar nenhum.

Caesar Flickerman, o homem que apresenta as entrevistas há mais de quarenta anos, sobe ao palco. É um pouco assustador porque a aparência dele sempre foi rigorosamente a mesma durante todos esses anos. A mesma cara debaixo de uma camada de maquiagem branca. O mesmo cabelo que ele tinge com uma cor diferente a cada edição dos Jogos Vorazes. O mesmo traje cerimonial azul-marinho com milhares de pequenas lâmpadas que brilham como estrelas.

Neste ano, o cabelo de Caesar está esverdeado e suas pálpebras e lábios estão com a mesma coloração. Ele parece uma aberração, menos assustador do que no ano passado, no entanto, quando estava com uma cor encarnada e parecia estar sangrando. Caesar conta algumas piadas para aquecer o público, mas logo dá início aos trabalhos.

Me sinto suar no vestido apertado, mas todos ali pareceram ficar ao menos um pouco pálidos.

A garota do Distrito 1, com um visual sensual emoldurado por uma bata dourada transparente, pisa no centro do palco para ser entrevistada por Caesar. Com aquele cabelo longo e louro, aqueles olhos da cor de céu, o corpo alto e exuberante... ela é toda sexy.

Cada entrevista dura apenas três minutos. Então uma campainha soa e o próximo tributo aparece. É preciso dizer isso sobre Caesar: ele realmente faz o possível para que os tributos brilhem. Ele é amigável, tenta acalmar os mais nervosos, ri de piadas fracas e consegue transformar respostas ruins em memoráveis declarações pela maneira como reage.

O garoto monstruoso do Distrito 2, o ruivo que particularmente me odeia, é uma implacável máquina de matar. A garota com as características parecidas com a dele do mesmo Distrito é mais discreta e evasiva. Me surpreendo eles terem a aceitado em seu pequeno grupo, mas talvez seja uma enganação assim como Peter.

E então chamam Malia Dareaux e, como se fosse um sonho, descubro a mim mesma subindo ao palco central. Aperto a mão estendida de Caesar, e ele tem a fineza de não enxugar a dele imediatamente em seu terno.

– E então, Malia, a Capital deve ser uma mudança e tanto em relação ao Distrito 4. O que mais te impressionou desde que chegou aqui? – pergunta Caesar.

O quê? O que mais me impressionou? Minhas mãos soam e eu olho para a plateia. Minha retina reclama com tantas luzes em meus olhos, tento sorrir, mas tenho certeza que pareci uma aberração.

Ser eu mesma, apenas isso.

O vinho.— respondo, minha voz soando incerta.

Caesar ri, e percebo que grande parte do público se juntou à ele.

— Você provou da safra de Dalence, acredito? — Caesar quer saber e eu assinto, sorrindo um pouco. — Aquele cara é um bom amigo meu, ele realmente entende disso. — Ele olha de soslaio para o público e abre um sorrisinho.— Por mais que eu não beba, sabem? É preciso cuidar da aparência, não é? — De alguma forma aquilo foi muito engraçado para eles, porque estão rindo e aplaudindo.

— Agora, Lia... posso te chamar assim, não é?

— Pode me chamar como quiser.— sorrio e isso parece anima-lo.

Vou desmaiar aqui mesmo.

— Quando você surgiu na cerimônia, eu quase não aguentei... sua estilista realmente soube destacar toda sua... boa genética, se me entende.— mais gargalhadas. Escutei gritos de como sou bonita, sinto meu rosto queimar.— O que você achou daquela roupa?

Vejo Fenty na plateia, me olhando empolgadíssima, não minto em minha resposta.

— Depois que eu aprendi como se respirar em trajes tão apertados...— a plateia ri. Eles realmente se entretem com qualquer besteira que falo.— Achei que Fenty foi brilhante, foi o traje mais lindo que já vi, e estou grata por ter tido a oportunidade de usa-lo.

Algumas pessoas batem palmas para isso também, mas eu sorrio apenas para Fenty, que parece emocionada.

Os segundos passam com lentidão e mais perguntas são feitas, a respeito do meu traje de hoje, da minha adaptação aos treinos, da minha nota com os idealizadores. Consigo responder todas de certa forma calma, percebo que muitas pessoas gostam de mim, e tudo que eu faço parece encanta-los. Caesar não para de dizer o quanto sou bela, que minha carreira não será diferente da de Finnick caso eu ganhe os jogos.
Não entendo o que isso quer dizer, mas consigo visualizar o rosto de Finnick na plateia, e ele parece tão explosivo, e irritado, que penso que talvez eu não esteja indo tão bem assim, talvez esteja colocando tudo a perder e acabando com minhas chances.

— Vamos para às últimas perguntas, querida.— Caesar suspira e segura minha mão, fazendo eu desviar meus olhos de Finnick. — Há alguém especial para você voltar? Alguém que você lutará para isso?

O rosto da minha mãe e do meu irmão surgem em uma imagem clara em minha cabeça, seus sorrisos e risadas, os dias que passamos juntos em pequenas fogueiras ou no mar. Meu coração aperta.

— Sou muito sortuda no quesito família... tenho duas pessoas maravilhosas que esperam por mim, e por elas, ganharei os Jogos Vorazes.— minha voz soa firme. A plateia vibra a minhas palavras.

— Quem são essas pessoas, Lia? — Caesar se inclina, apertando meus dedos, parecendo assustadoramente ansioso.

— Meu irmãozinho Zyan, e minha mãe Cora.

Quando falo o nome da minha mãe, os olhos dele se iluminam, como se finalmente eu tivesse chegado aonde ele queria. Caesar abre um sorriso ofuscante, cheio de dentes brancos demais.

— Cora Dareaux? — ele sorri, e não parece tão gentil quanto era antes.— Seria essa Cora?

A imagem que surge no telão é da minha mãe de anos antes, grávida de mim, na entrevista que deu quando meu pai se tornou um dos 6 finalistas. Seu rosto igual ao meu, faz às pessoas gritarem em choque e lembranças. Então meu pai é mostrado, Liam Baker, e a ficha de todos caem.

— Essa mesmo.— respondo baixo, minha garganta está se fechando.

O alarme soa, o tempo acabou.

— Foi ótimo tê-la aqui e lembrar do passado, espero que se saia melhor do que seu pai. Boa sorte nos Jogos Vorazes.— Caesar aperta minha mão e então eu saio para fora do palco, com longos aplausos e gritos empolgados, de volta para a fileira de competidores que está me encarando. A plateia não para de murmurar.

Ainda estou um pouco tonta durante a primeira parte da entrevista de Peter. Mas ele tem a audiência nas mãos desde o início. Dá para ouvir os risos. Então, conta uma piada engraçada sobre os perigos dos chuveiros da Capital. A entrevista dele parece durar segundos, diferente da minha que pareceu horas. Depois preciso permanecer como uma dama por muito mais tempo, aguentando cada minuto de cada competidor.

70° edição dos Jogos Vorazes Onde histórias criam vida. Descubra agora