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𝘒𝘈𝘙𝘐𝘕𝘈

O enterro do Gustavo aconteceu às dez da manhã, acabei não conseguindo dormir tanto quanto deveria, estava com insônia e pra completar Dom não parava de roncar ao meu lado. A culpa também não era toda dele, mesmo que eu estivesse sozinha não iria conseguir dormir.

Não consegui dormir com o pensamento de que o velório do meu irmão acontecia na sala, eu deveria estar lá ao lado dele. Ou talvez não fosse tão bom que eu ficasse presa a ele lá na sala, a hora da despedida seria triste, e foi.

Tive a sensação de que uma parte de mim estava sendo arrancada.

Não consegui ficar por muito tempo no cemitério, assim que começaram a jogar terra sobre o caixão eu me retirei de lá e pedi que Dom me trouxesse para casa. Precisava fugir e fingir que nada daquilo aconteceu, tentar lidar com a dor até que enfim eu superasse.

Aos poucos, com o passar dos minutos meu choro foi cessando e eu fui compreendendo que tudo tinha um sentido na vida. Ele tinha morrido muito novo, mas era algo que eu não tinha o controle, ou melhor, não tínhamos controle.

O valor, ele deve ser dado enquanto a pessoa ainda estiver com vida e não derramar lágrimas só após a morte, nada iria trazê-lo de voltar, e era a isso que eu deveria me ligar. Eu só esperava que aquela dor fosse embora com o passar dos dias.

Tomei um banho gelado quando cheguei da rua, estava com calor, me sentindo estranha, com dor de cabeça e muita irritação, chorar por horas me trouxe uma enxaqueca danada.

Saí do banheiro com a toalha no corpo e uma toalha na cabeça, precisei tomar um banho demorado pra me sentir mais aliviada, eliminar aquele calor. Não me assustei nenhum pouco ao sair do banheiro e perceber que Dom continuava ali na minha casa.

Dom tinha me trago e eu sabia que ficaria, afinal ele estava em uma busca constante de não me deixar só. Foi em casa apenas tomar banho antes de me levar para o enterro.

― Não porra, eu não quero saber, sobe pra lá agora ― ele gritou com alguém no celular, tava deitado na minha cama com a maior liberdade, dando um sermão em, provavelmente, alguns dos seus vapores. ― Incompetência do caralho ― foi tudo que disse antes de desligar.

Eu conseguia notar o nível da sua irritação através da sua testa franzida e aquele olhar frio que carregava quando não estava de bom humor. Dom de mal humor até o diabo temia.

― Pra que tanta agressividade? ― o avderti, afinal ainda era cedo e ele já tava perdendo a paciência, oque não era de se espantar vindo do Dom.

― Toma no cu, nada anda nessa favela sem mim ― ele abandonou o celular todo irritadinho, como se fosse capaz de quebrar a tela do telefone se continuasse dando ouvidos a quem quer que estivesse do outro lado.

― Talvez seja por isso que você é o dono do morro ― dei de ombros, inconformada por tamanho egoísmo da parte dele.

― Ó, vou ter que subir pra resolver uns bagulho lá no bordel e tu se ajeita, arruma tudo aí que vou te levar pro meu barraco hoje, pega tudo teu aqui e leva la pra casa ― ele deu as ordens sem nem antes me perguntar, simplesmente levantou da cama e decidiu que poderia me da ordens.

― Espera.. eu não vou me mudar pra sua casa ― tratei de dizer antes que ele fosse embora com aquele pensamento insano de que eu deveria ir morar com ele.

Já tínhamos conversado sobre aquilo e eu não achava uma boa idéia, também não era uma péssima idéia, uma vez que não tinha dinheiro nem para pagar meu aluguel. Mas não queria tomar decisões precipitadas e ir morar com o Dom.

No morroOnde histórias criam vida. Descubra agora