Demissão.

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Sentei-me na parte de trás da ambulância enquanto o paramédico falava incessantemente, passando algo em minha testa. No entanto, não ouvi uma única palavra do que ele dizia. Meus olhos estavam fixos no homem à minha frente; não desviamos o olhar nem por um instante. Era como se estivéssemos em uma batalha silenciosa para ver quem cederia primeiro.

— Não quer nos acompanhar até o hospital? — perguntou o paramédico, sacudindo-me levemente pelos ombros.

Sarah: Não, estou bem. Obrigada.

Sorri de forma forçada para o paramédico, levantei-me e voltei para o carro.

Sarah: Não é tão ruim — brinquei.

— Ele cuidou direitinho de você — disse ele, zombando de mim.

Sarah: Eu queria um adesivo da Barbie para me sentir mais forte, mas ele não tinha — caçoei de mim mesma.

Ele soltou uma risada pelo nariz e colocou as mãos nos bolsos.

Sarah: Valeu por esperar. Vocês estavam apressados e eu não queria tomar muito do seu tempo.

— Quer uma carona?

Sarah: Não, não precisa, eu me viro — balançei a cabeça em negativa.

Ele me analisou da cabeça aos pés antes de assentir e se virar. Sorria um pouco constrangida, mas só conseguia pensar em quão burra eu havia sido. Ele entrou no carro e logo o motor rugiu, desaparecendo entre os veículos.

Por que recusei a carona?

Chamei um táxi e entrei, implorando para que o motorista voasse até o tribunal. No entanto, o trânsito só piorava, fazendo com que demorássemos quase quarenta minutos para chegar. Paguei e desci correndo, entrando no tribunal e desviando das pessoas pelo corredor, até que trombei de frente com ela ao virar à esquerda.

Roberta: Sinceramente, Sarah, eu não sei o que fazer com você! — rangiu entre dentes.

Suspirei e engoli seco, erguendo a postura sabendo do esporro que estava prestes a levar.

Roberta: Minha sorte é que o juiz nos deu mais uma chance para apresentar esses documentos! — franziu o cenho. — Que merda é essa na sua cara?

Sarah: Parece mentira, eu sei, mas sofri um acidente enquanto vinha — tentei me explicar.

Roberta: Já é a segunda vez que você me coloca em uma fria! Eu não tenho mais idade pra isso! Está demitida.

Sarah: Não! Por favor, eu prome... — fui interrompida.

Roberta: Eu não quero saber! Uma mulher na sua posição, na sua profissão, que não tem responsabilidades não serve pra mim.

Cerrei os punhos com força, agarrando a alça da minha bolsa. Minha vontade era estrangular seu pescoço e obrigá-la a me deixar nesse emprego, mas então apenas bufei e dei as costas.

[...]

Chego em casa, deixo minha bolsa no balcão e me jogo no sofá.

Mariana: Ué, já voltou?

Sarah: Eu quero morrer! — tapo meu rosto com uma almofada.

Mariana: O que foi?

Sarah: Eu bati seu carro, fui demitida e ainda não são nem oito horas da manhã.

Mariana: Você o quê?

Sarah: Na verdade, um babaca bateu atrás de mim, mas eles vão pagar todo o conserto, fica tranquila. — tiro a almofada do rosto.

Mariana: Você bateu a cabeça. — diz ao notar o curativo.

Sarah: Não é nada, só um susto.

Mariana: Roberta te demitiu, é? — senta ao meu lado.

Sarah: Ela me odeia!

Mariana: Ela odeia todo mundo, Sasa.

Sarah: Se eu contar para meus pais que perdi esse emprego, eles vão me deixar doida!

Mariana: Rapidinho você consegue outro, amiga.

Sarah: Eu não quero ser contadora de qualquer empresa; eu quero ser importante. Se não, meu pai vai me fazer trabalhar para ele e todo mundo vai achar que estou ali só por ser filha e não porque sou capaz.

Mariana: Ai não! Não começa de novo. Vai dar certo, relaxa mulher!

Sarah: E você está fazendo o que aqui até agora?

Mariana: Home office hoje, então não estou com paciência; quero ficar sozinha para me concentrar.

Sarah: Pelo menos você tem emprego. — faço um draminha na brincadeira.

Mariana: Cala a boca! — ri se levantando.

Levantei também e fui para o meu quarto. Deitei, liguei a TV em uma série qualquer, abri meu computador e comecei a procurar outras empresas para enviar meu currículo. E assim passei o resto do meu dia.

Uma semana depois.

Acordei por volta das nove da manhã, com a ligação do mecânico informando que o carro estava pronto. Levantei-me e me arrumei rapidamente para ir até a empresa buscar o valor do pagamento do conserto.

Que alívio.

Fico agoniada com a Mari me olhando todos os dias e não perguntando nada; com certeza ela está precisando dele.

Depois de tomar banho e me vestir, procurei pelo cartão do Daniel na minha bolsa. Assim que o encontrei, pedi um Uber para o endereço. Ao chegar à porta, deparei-me com um enorme prédio espelhado. Após pagar o motorista, desci do carro e entrei no edifício em direção à recepção.

Sarah: Oi. — disse eu, olhando para o crachá da moça sentada no balcão da recepção — Paula. — completei com um sorriso amarelo.

Paula: Bom dia. Tudo bem? Com o que posso ajudar? — respondeu ela.

Sarah: Meu nome é Sarah e eu gostaria de falar com o... — olhei para o nome no cartão — Daniel.

Paula: Sobre qual assunto Sarah? — perguntou simpaticamente.

Sarah: Houve um acidente na semana passada; o amigo dele bateu no meu carro e...

— Paula, ela está comigo. — interrompeu uma voz grossa e rouca, enquanto alguém passava por mim em direção ao elevador à frente.

Era ele. Seu cheiro exalava um perfume amadeirado que deixava rastros pelo ambiente. Meus olhos se fixaram naquela muralha de músculos cobertos por um terno preto, e eu fiquei hipnotizada. Foi como se o tempo parasse naquele instante; não conseguia parar de olhar.

Doce Veneno - amor, ódio e obsessão.Onde histórias criam vida. Descubra agora