Queda livre.

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Antes que a ambulância chegasse eu derrubei algumas coisas pela casa, e revirei algumas gavetas, dando a entender que foi um assalto. Escondi a arma em meus cós, por baixo do moletom, e lavei meu rosto, tirando os resquícios de sangue que havia espirrado em mim.

Baguncei o cabelo e esfreguei os olhos até ficarem avermelhados, me dando uma aparência desleixada, como se eu tivesse chorado por horas. E então esperei por alguns minutos até a ambulância chegar, vigiando meu tio desmaiado no chão, conferindo sua respiração a cada segundo. Ele não pode morrer.

Não tenho certeza se acertei o lugar que queria, nem se vai funcionar, mas foi o que me deu em mente. Se der certo... Ele vai estar vivo, ciente de que não pode mudar nada e nem fazer nada, deitado em uma maca, morrendo aos poucos pela ira, e não vai conseguir nem mesmo se matar.

Acompanhei a ambulância até o hospital, paguei o tratamento particular e conversei com alguns médicos. Eles me explicaram o que poderia ocorrer, já que o tiro havia acertado a medula espinhal, as consequências nas quais eu estava torcendo pra que tivesse. Prestei toda a ajuda como um bom sobrinho faria, não quero deixar pontas soltas. Está feito.

Estava voltando pra casa, olhei no painel do carro e já são quase onze horas da manhã, eu nem vi o tempo passar. Pego meu celular e ligo pro Daniel.

Daniel: Fala irmão. – ele atendeu.

Conor: Eu fiz uma merda do caralho.

Daniel: Ultimamente não me impressiona não. – diz em um tom zombeteiro.

Conor: Onde você está?

Daniel: Em casa, por que?

Conor: Chego em trinta minutos, precisamos conversar, pessoalmente. – desligo a ligação.

[...]

Estacionei em frente sua casa, e respirei fundo, olhando pra mansão onde cresci, onde era o meu lar, antes dos meus pais morrerem.

Porra, essa dor não ameniza nunca.

Logo avistei Daniel saindo pela porta e vindo em minha direção, ele entra no carro e me olha, já com a língua afiada.

Daniel: Cada dia que passa você está pior, puta que pariu... – balança a cabeça em negativa.

Conor: Eu já te disse, o que tu quer tá mole porra. – desviei o olhar, dei partida e acelerei.

Daniel: Haha. – solta uma risada falsa.

Conor: Se liga, porque eu só vou falar uma vez, sem mimimi.

Daniel: Hum. – assente.

Conor: Eu deixei o Emílio tretaplégico. – fui diretamente ao ponto.

Daniel: Como assim caralho? – ele se virou pra mim com os olhos arregalados, a boca entreaberta.

Conor: Peguei a porra do plano de fazer as coisas certinhas pela justiça e enfiei no cu. Atirei nele e agora o velho tá apodrecendo aos poucos no hospital.

Daniel: Puta merda... – sussurrou, massageando a testa.

Ele ficou em silêncio por alguns minutos, de cabeça baixa, os olhos cerrados com força, o semblante indecifrável. Porra, esse silêncio vai me matar. O que ele está pensando? Por que não fala nada?

Conor: Ele matou a minha mãe Daniel, a minha mãe! – eu disse quebrando o silêncio, senti meus olhos arderem, mas pisquei varias vezes afastando as lágrimas.

Daniel: Não estou te julgando cara. – murmurou, erguendo a cabeça, mas ainda sem olhar pra mim.

Conor: Então fala alguma coisa!

Doce Veneno - amor, ódio e obsessão.Onde histórias criam vida. Descubra agora