Torturado

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Eu encontrei quatro pedras de bom tamanho e comecei a amolar a que já tinha a forma mais pontuda. Repeti o movimento diversas e diversas vezes, até meus braços estarem doloridos e o frio demais, até o sono me atingir.
Eu não sabia se era dia ou noite quando acordei, não sabia quantas horas haviam passado.
- Idiotas! Vou matar cada um de vocês.
Escutei a voz de Lan e os passos, era noite. Me levantei com pressa e agarrei as barras, grunhi para os carcereiros que passavam. Um deles olhou para mim, um breve olhar.
- Seu bando de babacas, não fazem ideia do erro que cometeram ao me colocar aqui.
Repeti ofensas até escutar uma porta pesada abrir e fechar e então sons terríveis de algo cortando o ar, breves arquejos, mas nenhum grito. Tortura.
Ele estava sendo torturado, mas ainda não gritava.
Anos ele dissera.
Anos passando por aquilo e provavelmente pior, ele deve ter cansado de gritar, talvez seus nervos tenham sido danificados demais para ele sentir tudo.
Engoli em seco. Passou muito tempo, hora e mais hora até eles voltarem, eu vi o sangue em suas luvas, mesmo naquela luz fraca de lamparinas muito distantes uma das outras. Eles falavam sobre ter que trocar o chicote e que a lâmina de alguma faca tinha ficado cega e emferrujada demais. Proferi os xingamentos com vontade dessa vez. E minhas ameaças eram sentimentais. Como podiam fazer aquilo com alguém?
Minha pedra estava quase pronta no final do dia, decidi começar outra logo que terminasse aquela e o faria com mais afinco. Percebi que Fray tinha razão e que se não fosse por aquele plano eu não teria nada para fazer além de dormir. Sussurrar ali era perigoso e graças aos céus que aquele homem e a bruxa nunca voltaram.
Eu tinha mais dois dias. Dois dias e provavelmente liberdade. No segundo dia, depois de xingamentos, os homens já terem ido e algumas horas ele falou novamente.
- Quando sairmos daqui lá em cima tem mais servos, vou poder ajudá-las, e quando sairmos desse lugar ainda nos perseguirão, temos de ser rápidos então vou precisar que confiem em mim.
- Sabe como é a estrutura desse lugar?
Lan tornava a desconfiar.
- Sei.
- O que você é?
Ela foi ousada, silêncio se seguiu. Ele devia estar se questionando se realmente podia depositar toda a sua esperança e o que ele era em duas desconhecidas.
Ou, escutei uma voz diferente em minha mente, está inventando alguma coisa, esta tentando nos manipular.
Aquela voz era de Lan, eu tinha certeza.
Lan?
Questionei em minha mente, mas não tive resposta. E se a maldição estivesse nos unindo ainda mais?
- Eu sou algo que afirmam não existir mais. Mesmo que eu lhes diga não vão acreditar. Pelo menos a de voz mais sólida.
Ele falava de Lan.
- Por que não tenta?
Ela o desafiou.
- Lan, deixe-o. Não temos outra opção se não confiar nele. Apenas deixe-o. Se ele é ou não o que diz vamos saber depois.
Está louca.
Ignorei o comentário em minha mente e voltei a amolar a pedra.

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