O cínico

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Onde eu estava afinal?

Não sabia se gritava, chorava ou lutava. Nenhum parecia ser semente de boa madeira. Eu olhava desesperada e desamparada ao redor enquanto segurava meu pulso também dolorido. Pedra e rocha me cercavam, havia uma cama ali e um lugar onde roupas estavam jogadas. Mais nada além disso, eu e o deus que nada de bom tinha.
Ele seguiu direto para a própria cama que também era de rocha coberta por almofadas e colchas de cama, devia ser dura. Nem mesmo uma porta havia ali. Quando olhei para cima vi um gradeado distante. Aquele cômodo devia ser um daqueles buracos de tortura, mas agora estava selado até a pequena abertura. Nada entrava ou saia. Ou era o que deveria ser, Kishan entrou ali tranquilamente, em um piscar de olhos, e até me levou junto.
O encarei enquanto andou de costas para mim e foi até sua cama, certamente arrumada e construída por si. O encarei enquanto se jogou e deitou de lado nela, apoiando a cabeça numa das mãos e o encarei enquanto olhava para mim, seu sorriso de ateevimento e diversão não era contagiante, mesmo em toda aquela clareza proporcionada por coisa alguma ele ainda era sombrio e envolto por sombras.
- Não vai espernear? Gostaria de uma desculpa para lhe ensinar uma lição.
Espremi meus olhos para ele.
- Não vai me torturar? Se divertir enquanto gemo e grito de dor?
- Já que insiste...
Ele começou a se levantar, mas parou ao sentar, apenas se inclinou para a frente apoiando os cotovelos nos joelhos, as mãos juntas e sorriso mantido.
- Não vai se encolher de medo?
Não, eu sabia que tinha minha força. Se preciso eu a usaria, mesmo que falhasse contra ele novamente poderia tentar usar o fogo dessa vez, afinal, quanto mais luz, menor a sombra. Além disso também poderia tentar descobrir como roubar ele. O que eu já tinha tentado naquele exato instante, testando cordas, sentindo se não eram quentes ou frias demais.
- Vai me permitir fazer um monólogo? Pensei que a garota ousada que conseguiu se manter com Sefran tivesse coisas interessantes a falar... ou talvez apenas use outras artimanhas.
Ele ergueu uma sombrancelha. Continuei calada. Não queria provocar mais ofensas que iriam me fazer reagir e revelar que o feitiço tinha sido quebrado, ainda não. Não iria por a chance de resgatar todos ali, inclusive minha mãe, minha Dara, por causa de um ataque de raiva.
- Então é exclusiva dele? Sefran adestra bem seus brinquedos. Talvez minhas técnicas sejam obsoletas. Deveria testar algo novo?
Ele estava mesmo tentando que eu falasse? Bom, naquela guerra eu poderia vencer. Frustrar alguém com silêncio não deveria ser tão difícil, certo?
- O que acha? Tratar com doçura? Ou ser sedutor?
Ele mecheu no cabelo grande, irregular e assanhado. Kishan não era, exatamente, de se jogar fora, mas aquelas sombras realmente o deixavam sombrio e pálido demais.
- Não parece ser alguém de poucas palavras. Está mordendo a língua? Ou Sefran engoliu?
Ele se levantou andando devagar pelo espaço grande e vazio, sem tirar os olhos de mim. Meu  corpo já doía da posição, infelizmente não iria me mexer quando parecia que eu estava sendo cercada, mantive minha concentração em ignorar a dor.
- Estou curioso quanto a uma coisa... O que você significa para ele? Se eu cortasse uma parte sua e entregasse a ele o que faria? Se eu a matasse ou a usasse, o que ele faria? O que aquele monte de...
Eu estava me mordendo para não responder, não questioná-lo de volta. Mas eu tenho uma boca grande.
- Por que se importa tanto com ele?
Kishan parou de andar e girou sobre os calcanhares, sorrindo largamente ao me ouvir falar, ele deu dois largos passos na minha direção e se agachou.
- Afinal, sua língua ainda está aí. Se incomoda tanto quando eu falo mal dele? Devem ter alguma relação que ninguém mais sabe. Você é irmã dele? Não... São diferentes demais em tudo. Talvez amantes? Sefran é um desgraçado sem coração, mas eu também sou e... - ele negou - nunca amei ninguém, mas todos temos nossas fraquezas, até mesmo eu.
- Responda.
Ele era muito tagarela, pensando alto sem se importar. O sorriso se desfez e ele ficou ainda mais sombrio.
- Porque, garota, ele roubou de mim a única coisa que me importava, por isso vou roubar dele aquilo que mais importa a ele, depois vou matá-lo.
Engoli em seco. Ele voltou a sorrir macabramente e se levantou, para então se jogar na cama e começar a continuar seus pensamentos altos e sinistros, descrições de planos de vingança da qual eu não sabia a motivação.

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Ufa! Demorou pq vim escrever só depois de assistir o novo ep de GOT. ^^

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