Capítulo 67

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A ficha da nossa briga só caiu no segundo dia para mim. Alek havia sumido do mapa e Kristie me mandou algumas mensagens de incentivo. Mas não me sentia no clima para nenhum dos humores.

Acordei com uma dor de cabeça insuportável e um gosto amargo na boca. Não digo que me mantive forte, porque seria uma mentira. Chorei como nunca, ora me sentindo culpada, ora com saudades. Odiava ter que passar por tudo aquilo, era fato. Mas certas coisas fugiam do meu controle.

Ainda que eu fosse madura – na maioria das vezes – havia algo entre a gente que dificultava aquilo. Mesmo que estivéssemos acabados, eu precisava conversar com Alek e deixar as coisas em panos limpos. Sou assim, não há nada que possa mudar.

Depois de parar de fungar as últimas lágrimas, liguei para Anna. Ninguém melhor do que ela para saber lidar com o irmão e suas loucuras. Arrumei ligeiramente a casa e esperei até que ela chegasse.

Anna revelou que já sabia de toda a situação, mas que não havia dado sua opinião à Alek porque achava que tinha que me ouvir. Ela era completamente diferente da Kristie nisso, me peguei comparando.

— Ele não disse pra mim que vocês terminaram, Flora. Acho que se fosse sério, ele teria dito – Anna falou baixo. Ela estava um pouco contida ao ver meus olhos avermelhados.

— Anna, acho que o Alek ainda não percebeu que não sou mais uma menina – Falei esfregando as mãos — E eu realmente espero desculpas dele dessa vez. Eu sei que errei, mas ele não pode falar comigo daquele jeito, estejamos sérios ou não. Ele não tem que deixar sua raiva dominar o respeito.

— Concordo com você – Ela disse pegando em minha mão — E ele vai ouvir poucas e boas de mim e da minha mãe por isso. Vamos tentar colocar um pouco de juízo naquela cabeça. Sei que não devemos ser responsáveis por isso, que ele tem que mudar por si – Anna disse e eu concordei com a cabeça — Mas um puxão de orelha não faz mal a ninguém.

Sorri sem graça ao ouvi-la e meus olhos umedeceram. Como duas pessoas, com a mesma genética, podiam ser tão diferentes?

— Também acho. – Respirei fundo e encarei a parede por alguns segundos. — Isso está sendo difícil para mim, Anna. Confesso que todos os meus planos de férias foram por água abaixo assim que cheguei aqui. Veja, eu tenho dias contados para ir embora. Estou com meu livro pronto, que era o início do plano, e agora o seu irmão "não irá me deixar publicar"? – Pergunto fazendo aspas com a mão. Bufo de frustração.

— Sei o quanto está cansada. Posso imaginar, sem dúvidas – Ela diz — Mas também sou obrigada a dizer todas aquelas coisas clichês, do quanto vocês se completam e que não deveriam desistir disso.

— Não sei... Não sei se posso mais aguentar. – Falo seca. Sinto uma pontada no coração e meus dedos tremem nervosamente. — Afinal, como manteríamos um relacionamento à distância? – Olho para ela novamente — Não vejo como isso pode funcionar. Talvez seja melhor um ponto final mesmo – As palavras saem desesperadas da minha boca.

Anna me olha espantada pela primeira vez. Talvez o momento crucial tenha acontecido: o momento em que percebemos que não pertenço àquela cidade. Não pertenço àquelas pessoas, àquela vida. Sou como uma brisa: que chega suave, e ligeira, logo dá tchau.

Ficamos alguns minutos em silêncio, com as palavras duras no ar. Era estranho como me senti mais aliviada após a confissão, e vazia ao mesmo tempo. Alek havia se tornado uma parte intrínseca de mim, e, ainda assim, se desgrudou com rapidez do que havíamos nos tornado.

Era doloroso, sim. Era como arrancar um pedaço da minha pele sem qualquer tipo de anestesia. Mas era a realidade. E eu tinha que encará-la.

🌊

Passei o dia todo pensando em como faria para ter uma conversa decente com Alê. E quanto mais eu pensava, mais a tarefa parecia difícil.

Mandar uma sms? Não, fria demais. Um e-mail? Sequer tinha o e-mail dele. Aparecer de surpresa em sua porta? Só Deus saberia o que poderia acontecer. Uma serenata como ele fez para mim? Eu nem sabia tocar violão. Esperar ele correr atrás? Só se eu nascesse de novo.

Depois de tanto bater a cabeça pensando, optei por mandar o próprio livro. Sabia o quão arriscado seria ele ter minha obra completa em mãos, mas eu arriscaria. Apesar de tudo, meu coração o queria de volta. 

Por isso, imprimi todo o livro e coloquei em um pacote. As palavras falariam por si só. Anna havia me dito que Alek trabalhava doze horas e folgava trinta e seis, logo, estaria em casa hoje e ainda amanhã. Seria tempo mais que suficiente para que pudesse ler e tivéssemos uma conversa, ainda que nada agradável.

Depois de impresso, sentia que ainda faltava algo. Ainda precisava falar alguma coisa, algo que expressasse minha possessividade pela obra. Não demorou até que eu digitasse uma breve nota e a embalasse junto com o livro:

"Alek, estou te enviando o livro como primeiro e único pedido de socorro. Não preciso que volte para mim, se essa é sua decisão. Mas preciso que você leia e entenda o que foi produzido aqui. Preciso que compreenda a dimensão dessa obra na minha vida e o que ela significa na minha carreira. É um pedido de socorro para que não faça nada contra mim. Absolutamente nada.

Quero dizer, você teria como 'provar' algo agora – o que quer que tenha pensado em provar em seu argumento para que eu não o publique. Mas saiba que você não ganharia essa disputa. Se alguma vez me achou inconveniente, conhecerá o verdadeiro eu caso decida me impedir de qualquer coisa.

Desculpe o tom impetuoso, mas é assim que manterei minha postura caso mantenha as palavras que me disse ontem. Caso mude de ideia, terei o maior prazer em enviar o livro para que possa ser publicado de uma vez, e não te incomodarei novamente."

Li o bilhete pela segunda vez com lágrimas nos olhos. Embora dura nas palavras, não era tanto assim que me sentia de verdade. Queria que fôssemos capazes de resolver aquilo de uma vez por todas, ainda que envoltos por espinhos.

 Queria que fôssemos capazes de resolver aquilo de uma vez por todas, ainda que envoltos por espinhos

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Na Sua Onda [COMPLETO] (Irmãos Soaint 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora