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Giovanna

— Agora é só esperar o resultado. — falei pra D. Maria depois de fazer a coleta de sangue.

— Você deveria receber um aumento por ser tão paciente. — ela disse — A próxima vez te trago um bolo.

— Não precisa. — falei — Mas se quiser trazer, não vou recusar.

— Pode deixar. — ela disse rindo.

D. Maria foi embora e fui até outro paciente. Comecei a trabalhar ontem aqui no postinho que não é bem um postinho como eu pensei. É um pequeno hospital. E pra minha surpresa, eu e Adriana não somos as únicas novatas,
acho que deram uma repaginada no quadro de funcionários, principalmente enfermeiros.

— As crianças fazem de tudo pra não tomar injeção. — Adriana mostrou a mão vermelha.

— Ainda deixou as marquinhas dos dentes. — sorri.

— Giovanna? — alguem chamou, olhei pra trás vendo o diretor — Pode me acompanhar?

— Claro. — falei me afastando de Adriana.

Acompanhei o diretor até sua sala. Eu estava morrendo de curiosidade, confesso. Ele abriu a porta, me deu espaço e fechou assim que entrou.

— Estava vendo sua ficha do hospital em que trabalhou antes de ser transferida. — ele disse sentando na cadeira atrás de sua mesa cheia de papéis — Uma das recomendações que lhe deram é que você é muito paciente.

— Sim. — falei, pelo menos no trabalho eu sou.

— A maioria dos enfermeiros que tenho aqui são novatos, isso você já deve saber. — assenti — Esse hospital faz visitas domiciliares, tínhamos enfermeiros certos para essas funções. Mas agora tenho que repor esse quadro e com suas recomendações você vai ser uma das enfermeiras.

— Tudo bem.

— Começará hoje mesmo. — disse me deixando um pouco surpresa, não deveria ser assim tão rápido. Ele pegou uma ficha e me entrou — Aí está o endereço. Te desejo uma boa sorte!

— Obrigada. — sorri fraco, não gostei desse "te desejo uma boa sorte". Aparece até que ele está me jogando na toca da onça.

Olhei novamente o prontuário do paciente,
ainda tem esse endereço, não faço a mínima ideia de onde fica essa casa.

▪  ▪  ▪

Peguei minhas coisas e saí do hospital, entrei no carro e fui seguindo as orientações até chegar no endereço do paciente que fica um pouco mais distante de tudo, na parte mais alta do morro. O hospital vai pagar por ter gasto minha gasolina.
Gasolina hoje em dia é ouro.

Parei o carro do outro lado da rua; observei a casa, tinha os muros altos, não dava pra ver do lado de dentro, só que parecia ser enorme.

Saio do carro depois de pegar minhas coisas, antes que eu atravessasse a rua Teco vem em minha direção – ainda não sei diferenciar entre ele e Tico – mas Tico sempre que me vê me dá um abraço, já Teco é mais sério então sei que é ele.

— Sou a enfermeira que o hospital disponibilizou. — falei assim que ele chegou perto.

— Oxe, não sabia que tu era enfermeira. — ele disse — Não tem cara.

— E tenho cara de quê, então? — perguntei, ele parecia com receio de falar — Já sei, você também pensou que eu era fresca. É isso?

— Eu ia dizer que tu era modelo pô. — falou sincero — Mas tu tem uma carinha de fresca mermo.

— Obrigada pelo elogio... — dei de ombros — Eu acho.

Ele riu.

— Leonel tava esperando por tu. — disse — Pode entrar.

Teco foi na frente e o companhei, tinha mais alguns homens na frente da casa que por sinal me comeram com os olhos, e receberam um olhar de nojo.

— Leonel tá vindo. — ele disse me deixando na sala da casa — Se precisar de algo é só me chamar.

— Obrigada. — sorri pra ele que sorriu de volta.

Teco saiu me deixando sozinha no meio daquela enorme sala. A casa era linda, agora entendo o porquê dos muros serem altos, pra esconder isso tudo.

Leonel não tinha aparecido, e eu não ia ficar andando pela casa - por mais que eu quisesse -  Peguei meu celular pra passar o tempo. Entrei no insta, estava distraída stalkeando meu crush, quando escutei alguém falar.

— Que porra tu tá fazendo aqui? — perguntou irritado.

Virei-me deixando o celular de lado e dei de cara com o ignorante do dono do morro. Ele vestia apenas uma bermuda, sem camisa o que fez o cós da cueca ficar amostra.

Pra ele está tão a vontade isso só quer dizer que ele também mora aqui.
Ótimo Giovanna, você começou "bem".

Enquanto ele me encarava cheio de marra com os braços cruzados, esperando minha resposta, eu permanecia tranquila por fora. Mas, por dentro o que realmente queria era responder com a mesma ignorância que ele tem, só que eu não podia, tinha que ser profissional.

— Trabalhando. — falei simples — Sou a enfermeira que o hospital mandou.

Peguei o prontuário e estendi, ele se aproximou e pegou. Passou os olhos por todo papel parando embaixo onde tinha meu nome.

— Quer ver minha carteira de identidade? — perguntei seria, mas ele sentiu a ironia porque me devolveu o prontuário de volta.

— Não. — virou as costas — Ele tá lá em cima.

Respirei fundo e fui atrás.
Subimos as escadas e entramos em um corredor com várias portas. Ele parou na terceira que estava entreaberta e me deu espaço, tinha um homem sentado na cama com a perna esticada em um puff. Ele não era um senhor de idade, era novo.

— Coroa. — o ignorante falou parando do meu lado, Leonel tirou os o olhos da tv e nos olhou — Essa daí é a enfermeira.

— É nova no hospital, certo? Nunca te vi por lá. — Leonel perguntou e eu assenti — Seja bem vinda, fique a vontade. — disse educado — Meu neto te tratou bem?

Bem mal.

— Ele fez o possível. — falei, e Leonel sorriu negando. Olhei pro ignorante que se mantia na porta do quarto com os braços cruzados.

Ele falou com o avô e me olhou uma última vez antes de sair, deixando eu e Leonel sozinhos. Agradeci mentalmente por isso.

▪  ▪  ▪

Leonel era bem diferente do neto, enquanto eu tirava o curativo da perna do mesmo pra fazer outro ele se mostrou educado e bem humorado.

Nesse meio tempo, D. Maria a mesma de hoje cedo do hospital apareceu quando eu já estava finalizando. Me despedi dos dois, Leonel queria me levar até a porta, mas não deixei o mesmo fazer esforço e fui sozinha.

Assim que desci as escadas vi Rocco entrando, acho que ele nem tinha ido embora.

— Acabou? — ele perguntou sem me olhar.

— Por hoje sim. — falei fazendo a mesma coisa.

— Esses curativo tem que trocar todos os dias? — continuava com sua atenção no celular.

— Isso, mas o do seu avô não tá saindo líquido viscoso, uma vez ao dia é o necessário. — falei passando reto — Boa noite.

Não respondeu.

Por que eu falei mesmo?
Não posso gastar minha educação com quem não tem!

Deus me free.

Nosso Recomeço (Nova Versão)Onde histórias criam vida. Descubra agora