Capítulo X ○ Jaebeom

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Depois de eu ficar mais ou menos recuperado, ou apenas ter parado de chorar e tremer, minha tia saiu de perto de mim e foi resolver alguma coisa com o hospital. E eu, por mais que me obrigasse a ficar de pé, sentia que minhas pernas não aguentariam o peso do meu corpo, e minha cabeça, tão absurdamente silenciosa, apenas fez ser possível que eu ficasse sentado no corredor do hospital, fitando a parede branca do outro lado do corredor, sentindo tudo e nada ao mesmo tempo.

Cenas da minha infância e adolescência vinham a minha mente, como bombas sendo jogadas de todos os lados. Memórias dos dias de natal, quando meu pai me levava para um lago congelado perto de casa e me fazia escorregar no gelo, puxando meu treno com uma corda, rindo, me fazendo quase voar. Lembranças da sua pior época, quando ele chegava bêbado em casa e tentava não fazer barulho para não me acordar, mas ele sempre acabava me acordando, e todas as vezes eu descia para ajudar. Eram memórias, muitas delas, que insistiam em fazer meu peito doer, porque eu sabia, melhor do que ninguém, que era apenas isso que eu teria dele agora, memórias, apenas memórias.

Não sei em que momento minha tia voltou, mas ela veio correndo até mim com um semblante de culpa no rosto. Ela sempre foi tão fácil de ler, era sincera demais pra esconder algo de alguém, com ela era sempre oito ou oitenta, nunca tinha um meio termo. Ela falava com alguém no celular, meio afobada, se sentou do meu lado e fez sinal para que eu deitasse a cabeça em seu ombro, o que eu fiz, eu me sentia tão cansado.

Pelo pouco que ouvi da história, minha prima sofreu um acidente, mas minha tia falava que não poderia ir a lugar nenhum, acho que para meu tio, a pessoa do outro lado da linha. E eu sei que escolher entrei ir ou ficar era difícil demais para ela, mas minha prima estava no hospital, um hospital bem longe, do outro lado do mundo, e ela queria a mãe, ela precisava da mãe, e eu entendia ela tão bem.

Acho que foi a culpa que fez minha tia aceitar ir até minha prima, ela estava na Coréia desde o dia em que meu pai ficou doente, não via a filha a quase um mês. Penso que foi por isso que ela decidiu ir, e mesmo que ela achasse que eu ficaria bravo com ela no momento, eu não fiquei, não poderia ficar, eu sabia, é claro que sabia, que se ela pudesse ficar, ela ficaria.

Mas ela não pôde, percebi isso quando vi ela discar um novo número no celular. E eu não sei como, desde quando e nem porque, mas era o número da minha mãe. Tipo, ela realmente estava ligando para minha mãe, minha mãe de verdade, a mulher que deixou meu pai e me deixou. E eu queria ter conseguido falar algo na hora, mas agora, depois de tudo, me pergunto o que eu teria falado, nada me vem em mente, e acho que no fim das contas eu não conseguiria falar nada mesmo.

E mais surpreendente do que minha tia ter o número da minha mãe e ter ligado para ela, foi o fato de minha mãe a atender. E ela não só atendeu, como também se responsabilizou por cuidar das coisas sobre o velório e enterro do meu pai. Minha mãe, a mulher que deixou ele, séria a responsável por cuidar de tudo de seu último evento na terra.

E de alguma forma eu meio que esperava que fosse mentira, pensava que ela daria para trás e não faria o que disse que faria, mas ela fez. Algumas horas depois ela estava em minha frente, com os olhos vermelhos e as bochechas rosadas, agarrada no braço de um homem que eu não conhecia. E quando ela me abraçou, mesmo que eu quisesse muito negar, não pude evitar de me sentir bem, aconchegado, e eu quase conseguia voltar a ser o Jaebeom de 5 anos, o Jaebeom que amava a mãe mais do que tudo.

Ela disse que sentia muito pelo meu pai, e mesmo que eu queira negar, parecia mesmo que ela sentia muito. Depois ela me apresentou o cara que estava com ela, dizendo que era seu novo marido, mas eu não prestei muita atenção a isso. Estava me sentindo meio anestesiado, as informações vinham e iam, passando por mim quase como se fossem invisíveis.

Ela resolveu o resto das coisas que precisava no hospital, ao mesmo tempo em que minha tia vinha até mim e pedia milhões de desculpas por ter que ir embora, mas o máximo que eu conseguia fazer em resposta era murmurar alguns "tudo bem", que nem dariam pra ser ouvidos se a pessoa estivesse muito longe. De alguma forma, não falar parecia fazer doer menos.

O homem, que se chamava Baekyeon, ficou do meu lado enquanto falava no telefone com uma funerária, e isso me deixou confuso no começo, porque era o atual marido da minha mãe, cuidando do enterro do ex dela, e isso não era uma coisa que se via muito por ai. Mas era o que estava acontecendo na minha frente, então logo eu entendi, meio sem querer, que ele era o tipo de pessoa que se tem pra admirar, o tipo de pessoa que é incrível, mesmo sem tentar ser. E de uma forma meio bizarra eu meio que fui com a cara dele por isso, mas acho que foi porque falar com ele era mais fácil do que falar com a minha mãe.

Algumas horas depois minha mãe veio até mim dizendo que o corpo já seria encaminhado para a funerária e que era para nós dois irmos para lá, enquento o marido dela ia buscar o filho dele na escola. Mas eu não queria ir com ela, e ela sabia disso, porque sorriu, claramente triste, e disse para Baekyeon que era melhor ela ir buscar quem quer que seja e ele me acompanhar para a funerária, e nem eu, nem ele, negamos isso. Foi assim que eu fui parar no carro do atual da ex esposa do meu pai, que acabou de morrer.

Blind • 2Jae (HIATUS) Onde histórias criam vida. Descubra agora