Capítulo VI ● Youngjae

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— Eu vou ficar sabendo o que está acontecendo alguma hora? — Pergunto a minha mãe no caminho até o carro, a chuva caia impiedosa de encontro ao guarda-chuva que ela segurava sobre nossas cabeças, e eu sentia meu tênis ficando mais e mais ensopado a cada poça de água em que eu pisava propositalmente.

Não tinha percebido que chovia até o momento em que sai da escola, lá dentro tudo é tão silencioso que é quase como se as janelas engolissem qualquer som que viesse do mundo de fora, e como eu não posso ver, nunca sei quando está fazendo chuva ou sol, por isso a cada vez que saio é uma surpresa nova. E embora para algumas pessoas isso pareça ser algo incrível, para mim, a sensação não é nada mais que aterrorizante, faz com que eu me sinta perdido, e eu odeio me sentir assim, esse sentimento me deixa desnorteado e me faz ficar fraco e impotente, mais fraco e impotente do que o mundo acha que eu sou.

Minha mãe para assim que chegamos em frente ao carro dela, abre a porta do passageiro para que eu entre e eu demoro um pouco para o fazer, tanto porque estava esperando uma resposta, quanto porque é complicado demais entrar no carro por causa da chuva. Ela parecia estar em dúvida se me esperava entrar ou se dava a volta no carro e entrava no banco do motorista de uma vez, mas ela acabou optando por me esperar, para que eu não me molhasse mais ainda e para não molhar a parte de dentro do carro também, porque isso seria uma coisa ruim e tiraria dela boas horas do seu tempo, que ela poderia gastar sendo uma profissional mais excelente do que já é e uma mãe melhor ainda.

Ela fecha a porta depois de se assegurar que eu estou devidamente sentado no banco e eu a escuto dar a volta no carro, pela parte da frente, para então abrir a porta do motorista e se sentar ao meu lado, meio ofegante. Por alguns segundos o carro fica em completo silêncio, e essa é uma situação meio engraçada, para não dizer bizarra, porque SonHee é a pessoa mais barulhenta que eu conheço, e ela gosta de conversar e falar sobre tudo, quase nunca ficando em silêncio, então se algo aconteceu para deixa-la assim, calada, claramente esse algo é bem sério, e eu não sei se realmente quero saber.

— Foi alguma coisa com o papai? — Sinto os olhos dela em mim, e acho que ela está meio pensativa, talvez pensando se me conta a bomba agora ou se espera para contar quando o carro estiver em movimento e eu não  tiver a opção de abrir a porta e sair correndo na chuva, completamente desesperado, porque eu faço isso as vezes, quando algo dá errado, simplesmente começo a correr e correr, e só paro quando meus pulmões e meus pés não aguentam mais de cansaço, e então eu caio no chão completamente exausto.

Eu fiz isso quando minha mãe morreu e fiz isso mais tarde depois daquele ano, quando um grupo de garotos fez piada comigo porque tropecei em uma bola de basquete do ginásio e cai no meio de todo mundo enquanto o professor falava sobre alguma coisa que não tinha importância para mim. Eles riram muito ao me ver cair, e ficavam repetindo que eu deveria olhar por onde ando, porque ia acabar machucando alguém qualquer hora dessas, o que eu acho agora ser uma coisa bem cruel para ser dita por crianças de 7 e 8 anos, mas no dia em que aconteceu, eu apenas quis chorar e sair gritando.

Aquela foi a primeira vez que senti na pele o quão ruim as pessoas podem ser, e para um garoto de 7 anos, cego e sem amigos, na hora me pareceu a pior coisa do mundo inteiro, eu senti uma dor tão terrível que quase não conseguia respirar. Sair correndo aliviou um pouco essa dor, e mais tarde, quando quase fui atropelado por um carro porque não ouvi o sinal fechando, a dor não parecia mais uma coisa tão importante assim. Naquele dia eu descobri também, que por mais que a dor pareça eterna na hora em que acontece, com o tempo, você acaba se acostumando com ela, e então já não dói mais tanto assim. 

— Sim, mas não com o seu pai. — O tom que minha mãe usa para responder é meio vazio e distante, e a frase que ela diz não é nada esclarecedora e me deixa mais confuso do que eu já estava antes. Afinal, se não é o meu pai, de que pai ela está se referindo? talvez o dela? ou então o pai do meu pai? Não tenho tempo de perguntar, logo escuto o carro ser ligado e sinto ele ser posto em movimento, primeiro saindo do estacionamento e depois da escola, acho que ela optou pela opção de me contar com o carro andando.

Blind • 2Jae (HIATUS) Onde histórias criam vida. Descubra agora